Porque são suspeitos da prática de ilícitos criminais, como branqueamento de capitais ou ocultação de bens para efeitos tributários? Não. O Fisco pode ter acesso às suas contas bancárias porque…sim. Porque lhe apetece. Porque suspeita que o senhor, caríssimo leitor, é um potencial criminoso. Um potencial faltoso. Um potencial burlão sistemático e doentio do fisco. E critérios objectivos para que o fisco possa conhecer as contas bancárias dos contribuintes portugueses? Não há: basta o fisco querer.
O legislador português – composta por inúmeras cabeças bem iluminadas – não quer saber de direitos fundamentais, de posições jurídicas subjectivas dos contribuintes – tudo isso é “palavreado fora de moda”, como nos contou um jovem deputado em exercício de funções. O que interessa é reforçar o saldo da AT – incrementar as receitas fiscais do Estado a todo o custo. Há défice? O Estado aumenta irresponsavelmente as suas despesas e a sua dívida? Não se preocupem: enquanto persistirem portugueses, trabalhadores e honestos, haverá sempre dinheiro para ir pagando os vícios do Estado. Se aumenta o défice, o Estado aumenta impostos e reforça o Fisco, ou melhor, a AT (sim, cuidadinho, estamos perante uma “Autoridade”…uma “Autoridade Tributária”,atenção!). Se aumenta a dívida, o Estado aumenta impostos e reforça a AT. Se diminui o défice, o Estado aumenta os impostos na mesma e reforça ainda mais a AT.
A Autoridade Tributária é actualmente, não uma entidade administrativa integrada no pdoer executivo, mas um verdadeiro poder do Estado. O princípio da separação de poderes precisa de urgente remodelação dogmática e prática: para além dos poderes legislativo, executivo e jurisdicional, impõe-se acrescentar, nas sociedades contemporâneas, o poder tributário. Poder tributário que é mais forte do que qualquer outro poder – e pelo facto de os cidadãos (e, em particular, os juristas) ainda ignorarem a sua dimensão de poder estatal autónomo, as ameaças mais graves aos direitos fundamentais dos cidadãos vêm precisamente do fisco. Tudo pelo fisco, nada contra o fisco – o cidadão não é sujeito de direitos. É apenas objecto das necessidades, angústias e desejos da AT.
Se George Washington, Benjamin Franklin ou Thomas Jefferson devem dar voltas, voltas e revoltas no túmulo: se acordassem e vissem no “monstro” em que se transformou a máquina fiscal e o instrumento de opressão que é hoje o Direito Fiscal (as suas formulações, mas essencialmente – e infelizmente – a sua concretização) teriam certamente vontade de liderar uma nova revolução. Por muito menos, os “pais fundadores” protagonizaram a revolta contra a monarquia inglesa que conduziu à criação dos Estados Unidos da América – terra da liberdade, do poder do, para e pelo povo. No taxation without representation – proclamavam os revolucionários americanos contra as arbitrariedades da colonizadora Inglaterra face aos direitos dos habitantes das colónias da América do Norte. Hoje, impõe-se que proclamemos, sem medo e em defesa dos nossos direitos, que “no taxation with misrepresentation” – não há taxação com uma deficiente representação. Deficiente representação destes pobres (de espírito e de intelecto) políticos que permitem tamanha monstruosidade, que são cúmplices dos atentados às liberdades individuais dos portugueses que são sistematicamente cometidos pelo Fisco. Atentados a que, agora, o poder legislativo e executivo vêm dar cobertura legal. Uma vergonha a todos os títulos.
É mais uma prova da ilimitada boa-fé do Estado Português: este Governo aproveita o facto de os portugueses estarem a “banhos” para lançar uma notícia deste teor, havendo já um anteprojecto legal do Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais (aquele que praga a moralidade aos contribuintes, mas que vai à bola e à borla, com muita “energia positiva”!) que vai mesmo permitir ao Fisco o levantamento do sigilo bancário de todos os portugueses. Apenas porque sim. Estes pobres responsáveis políticos nem sequer percebem o retrocesso civilizacional que tal medida representa. Nem o Professor António de Oliveira Salazar teria coragem de ir tão longe! Oliveira Salazar, no seu túmulo em Santa Comba Dão, deve estar certamente envergonhado consigo mesmo: como não se lembrou desta medida, a um tempo, tão simples e tão radical? Afinal, são os socialistas, comunistas e bloquistas, no Portugal democrático, que aprovam o maior atropelo aos direitos dos cidadãos portugueses – levantar o sigilo bancário…porque sim! Porque o fisco suspeita que pode “sacar” mais uns euros aos contribuintes!
Há que dizer basta. Impõe-se que haja, de uma vez por todas, na política portuguesa, alguém (um partido, deputados, …) que defende os direitos individuais dos portugueses. Que defenda e valoriza a liberdade – que saiba que o Fisco não é um poder ilimitado. Antes, encontra-se limitado pela Constituição, a que deve respeito, como qualquer outro poder do Estado. A soberania não reside no Fisco: a soberania reside no povo português. Não é o povo que serve o Fisco – é o Fisco que serve o povo português. Sim, caros leitores, entre nós, hoje, o Estado é o problema.
O problema que viola, sem tino, os seus direitos fundamentais mais elementares. Há que romper com este “autoritarismo fiscal, imediata e incondicionalmente. Não há receita do Estado que justifique a humilhação, o vexame e a opressão a que os cidadãos são sujeitos pelo poder tributário. Portugal é um país secular, uma Nação valente, uma realidade cultural inigualável. Portugal não é – nem será! – uma enorme repartição de finanças, onde o fisco põe e dispõe. Nada contra os funcionários das finanças (até porque apenas cumprem ordens superiores) – tudo pelos nossos direitos fundamentais. Tudo pela nossa liberdade. Falta cumprir Abril…ou melhor, Novembro!