Segredos de Belém: uma “limanada” de ataques à família Cavaco Silva

Uma limonada é uma bebida amarga, ácida, que carece de muito açúcar para ser consumível. No entanto, no Verão, numa tarde de calor intenso, as limonadas são uma companhia sempre apreciável e que “caiem bem”. No fundo, as limonadas estão para os veraneantes como Fernando Lima esteve, ao longo de muitos anos, para Cavaco Silva. 

De facto, Aníbal Cavaco Silva tem a personalidade que desenvolveu e aprofundou durante anos – de rigor, austeridade, formalismo e distanciamento. Rejeitando sempre a “política-espectáculo” e a “política de afectos” – Fernando Lima tornou esta personalidade numa personalidade mais vendável do ponto de vista político-comunicacional. Por conseguinte, o trabalho de Fernando Lima sempre consistiu em passar mensagens para os jornais, criar factos políticos que sustentaram mediaticamente o cavaquismo.

No fundo, aos portugueses foram servidas várias “limanadas” durante anos. Fernando Lima tornou mais refrescante e “doce” o feitio, por natureza, seco e amargo de Aníbal Cavaco Silva. Pois bem, Fernando Lima voltou em força: acabou de lançar um livro em que nos tenta convencer (pela enésima vez) da veracidade das suas denúncias de que José Sócrates teria montado um esquema para vigiar e controlar Belém.

O que começa por revelar que Fernando Lima já perdeu o seu instinto político deveras aguçado: o que leva um qualificado assessor político, um spin doctor de referência, cometer o erro comunicacional primário de retomar um assunto que os portugueses já esqueceram, que os portugueses sempre desprezaram, que os portugueses nunca prestaram a mínima atenção (a não ser para assinalar o seu ridículo!) neste momento de transição presidencial? Neste momento em que os portugueses se confrontam com tantas dificuldades, problemas e desafios reais – e não meramente virtuais ou fantasiosos, como é o caso das escutas? A resposta só poderá ser uma: o desejo de vingança de Fernando Lima pela decisão de Cavaco Silva o afastar do cargo de assessor principal para a comunicação, substituindo-o por uma, nas suas palavras, “jovem, inexperiente, que fizera a carreira na JSD”.

Quanto ao caso das escutas, Fernando Lima não nos oferece uma das suas “limanadas” antigas – antes, oferece-nos uma verdadeira “lima nada”. Ou seja, uma fantasia de Fernando Lima que não nos diz nada. Fernando Lima não prova nada. Fernando Lima não acrescenta nada neste seu livro. A grande prova que Fernando Lima continua a apresentar é uma série de comportamentos estranhos de um assessor de José Sócrates (Rui Paulo Figueiredo) na Madeira. Mas que comportamentos estranhos? Não nos diz. E o facto de um assessor ter “comportamentos estranhos” significa que montou uma armadilha de espionagem em Belém? Depois, Fernando Lima vem com a história de um vagabundo, no Campo Pequeno, que o avisou que havia alguém escondido atrás das árvores a tirar fotos…E depois uns “sms” bem “dirty” que a sua esposa recebeu de alguém…Tudo isto é digno de um filme de cinema – mas não de uma realidade política. À atenção de António Pedro-Vasconcelos ou de João Botelho: têm, no livro “ Na Sombra da Presidência”, um excelente argumento para um próximo filme.

Além disso, um pressuposto seria fundamental para que a tese de Fernando Lima vingasse: o não recurso por parte do escritor-assessor (ou, melhor, assessor-escritor) às mesmas técnicas, ou técnicas similares, durante a sua passagem pela política. Ora, Fernando Lima não é propriamente um “anjinho” ou uma virgem nas técnicas de manobras políticas nos bastidores. Quando nós estávamos noutro jornal semanário português, travámos conhecimento com várias manobras com origem em Belém (e concretamente em Fernando Lima) para influenciar alguns comentadores ou condicionar a sua actividade. Tudo normal – é esta a essência da “assessoria política e de comunicação”. E o próprio Fernando Lima revela no livro que solicitou um relatório sobre um blogue –e  a identidade dos seus autores foi descoberta. Nunca ninguém falou de espionagem ou de informações secretas…

O mais grave do livro, porém, é a ingratidão (quase ressabiamento) que Fernando Lima revela em relação ao Presidente Cavaco Silva. Fernando Lima é quem é, graças a Cavaco Silva. Cavaco Silva poderia ter chegado muito longe na política portuguesa sem Fernando Lima – já Fernando Lima dificilmente chegaria onde chegou sem o Presidente Cavaco Silva.

E se Fernando Lima ficou tão chocado com a atitude do Presidente, por que razão permaneceu em Belém? O episódio que chocou Fernando Lima ocorreu em 2009, Cavaco foi reeleito em 2010 e tomou posse em 2011! Ou seja: mesmo triste, chocado e indignado, Fernando Lima aceitou o convite para permanecer em Belém por mais cinco anos! Porquê? Só porque sim? Agora que já não depende financeiramente do Presidente Cavaco Silva, Fernando Lima já poderá humilhar o Presidente (insinuando uma incapacidade política –só? , um medo e uma fragilidade incomuns do cidadão Aníbal Cavaco Silva)? Tudo isto leva o português comum a imputar uma enorme hipocrisia a Fernando Lima. Certamente injustamente – mas o ex-assessor colocou-se muito a jeito…

Pior: Fernando Lima insinua que a fraqueza de Aníbal Cavaco Silva se deve à promiscuidade entre a política e os negócios do genro do Presidente, Luís Montez.

 De facto, Fernando Lima defende que o genro do Presidente (pai dos netos de Aníbal Cavaco Silva) foi o responsável pela pressão e condicionamento que José Sócrates exerceu sobre o Presidente. Porquê? Porque Luís Montez era sócio dos socráticos mais fanáticos e teve o apoio da Câmara Municipal de Lisboa, liderada por António Costa, para a realização de muitas das iniciativas da sua empresa “ Música no Coração”. Mais: Fernando Lima até insinua que Montez e José Sócrates mandavam no EXPRESSO, o que seria evidenciado pelo facto de Miguel Cadete (Director-Adjunto do jornal) indicar Montez como um dos homens mais poderosos de Portugal. O que Fernando Lima considera muito estranho –e só explicado por razões políticas…

Não obstante as críticas que fizemos ao Presidente Cavaco Silva, não podemos negar o seu patriotismo e a sua seriedade. Este livro de Fernando Lima – e as insinuações que aí avança – é uma injustiça e uma traição inqualificável ao homem, ao cidadão e ao político Aníbal Cavaco Silva e à sua família. Lima quis reescrever a História – a História tratará de cobrar a injustiça a Fernando Lima.

Aníbal Cavaco Silva ficará para sempre na História de Portugal – Fernando Lima, no máximo, será uma nota de rodapé negativa na história de Cavaco Silva. A família de Cavaco Silva não merecia este ataque e ajuste de contas. Mais uma “limanada” incompreensível…