O Kamasutra de Sócrates e Baldaia

1. É uma realidade insofismável (inevitável?) dos nosso tempos, marcado pela preponderância das redes sociais e do imediatismo informativo. Se há um buzz qualquer na rede social, se há uma indignação qualquer no facebook, se há uma fotografia qualquer aparentemente chocante no Instagram – as massas aderem à indignação. As massas convertem logo esse rumor…

1. É uma realidade insofismável (inevitável?) dos nosso tempos, marcado pela preponderância das redes sociais e do imediatismo informativo. Se há um buzz qualquer na rede social, se há uma indignação qualquer no facebook, se há uma fotografia qualquer aparentemente chocante no Instagram – as massas aderem à indignação. As massas convertem logo esse rumor na causa das suas vidas.

O que significa – o que é lamentável e grave – que há um vazio de, não só de princípios e valores, mas de causas, de ideias, de metas de vida. E quando assim é, as redes sociais e as suas indignações preenchem o vazio das vidas de milhares de milhões de pessoas por esse mundo fora. Portugal não é excepção.

2.A causa mais recente de indignação facebookiana foi o livro da autoria de José António Saraiva, o qual versa sobre os segredos e revelações íntimas dos protagonistas da democracia portuguesa, desde a sua fundação até aos nossos dias, ao ex-director do SOL. Sobre o conteúdo do livro e a sua relevância como elemento historiográfico para a análise de diversos factos e das personalidade dos protagonistas da política que ajudam a explicar a maioria das suas decisões e a tornar claros alguns dos seus comportamentos mais “escuros” ou dúbios, já aqui nos pronunciámos – para aí remetemos, pois.

Atentemos na “indignação” e na polémica facebookiana. Primeira questão: como é que tantos e tantos portugueses se podem indignar acerca de um livro…que ainda nem sequer leram! Ora, mandam as regras do bom senso, da razão e do pluralismo que, antes de se emitir uma opinião sobre um livro, um filme ou qualquer obra cultural…se leia o livro ou se veja o filme! Como se pode censurar um livro…sem o ter lido? Condena-se um livro apenas por uma manchete de um jornal diário, mais concretamente do “DN”? Se a resposta for afirmativa, então o cenário é ainda mais preocupante: significa que uma simples manchete de um jornal é apta a manipular uma multidão de portugueses! Acriticamente, sem contraditório, apresentando uma versão parcial da realidade. E sem o devido rigor jornalístico.

3.E o que dizia a manchete do “DN”? Dizia, em letras garrafais, “ Livro que revela segredos sexuais dos políticos apresentado por Passos Coelho”. Após consultarmos a notícia do “DN”, perguntámos de imediato: “ mas, afinal, que raio de livro é este que junta política e sexo? Onde é que poderei comprar o Kamasutra da política portuguesa?”. Após alguns segundos, conclui que (não com pena, mas com alívio), afinal, não foi publicado nenhum “Kamasutra” da política portuguesa: o “DN” referia-se apenas ao livro “ Eu e os políticos” de José António Saraiva.

Ora, o livro tem 263 páginas – das quais apenas 3 se referem a assuntos, mais ou menos, relacionados com sexo! De 3 páginas, o “DN” assumir que o livro é todo sobre revelações sexuais – convenhamos! – é muitíssimo forçado…Donde, alguém no “DN” queria mesmo passar, a todo o custo, a ideia que o livro é um conjunto de revelações criminosas e pecaminosas…Para quê? Para descredibilizar o seu autor! Apenas e só!

Qual é, então, o episódio relatado por José António Saraiva que mais polémica desencadeou? Trata-se de uma conversa tida entre o autor e Miguel Portas, em que teria dito que o irmão, Paulo Portas, nunca chegaria a líder do CDS/PP, pela simples razão de que seria homossexual e teria receio que essa  sua opção se tornasse pública. Atenção: José António Saraiva não afirma que Paulo Portas é homossexual – relata apenas uma conversa tida com o irmão do político de centro-direita. Dizer, toda a gente diz o que lhe aprouver; ser efectivamente, é outra coisa bem diferente.

4. O que não deixa de espantar é que os mesmos que hoje se indignam com o rumor de que Paulo Portas é homossexual – são precisamente os mesmos que alimentaram esse boato para denegrir politicamente Portas e retirar dividendos políticos há bem pouco tempo. Nós próprios guardamos um email informal da estrutura de campanha de António Costa, nas últimas legislativas, em que se insinuava a homossexualidade do líder do CDS/PP (com recurso a termos claramente ofensivos e que nós julgávamos estar há muito erradicado – como deveria estar em todo o lado! – num partido que se assume como progressista e o líder das causas fracturantes…). E agora, vêm dar lições de moralidade e de ética? Mesmo no PSD, figuras como Fernando Costa (o mítico Presidente das Caldas da Rainha) vieram atacar duramente José António Saraiva por revelar esta história de Miguel Portas.

Mas não é este o mesmo Fernando Costa que, em plena campanha para as legislativas, num jantar com a presença de Passos Coelho e Paulo Portas, insinou que Paulo Portas tinha recebido verbas dos submarinos e lançou piadas (de gosto duvidoso) brincando com o boato da orientação sexual de Paulo Portas? É preciso ter muito topete!

5.Quanto à orientação sexual de Paulo Portas, só há um comentário a fazer: é irrelevante. Politicamente, é absolutamente irrelevante. Mas José António Saraiva revela, logo no prefácio, que o livro conta uma série de estórias da política portuguesa que não pôde ou não quis escrever – quer revelar conversas tidas com protagonistas da vida política portuguesa, não criar factos políticos. Nós próprios já conhecemos uma senhora (por acaso ex-jornalista) que nos contou que manteve um relacionamento com Paulo Portas e que só se distanciaram devido à vida mais que atribulada do então líder do CDS/PP, a qual afectava o relacionamento. Portanto, a orientação sexual de Paulo Portas é com Paulo Portas. Ponto.

Mais: não conseguimos compreender como é que as associações defensores dos direitos dos homossexuais ficaram chocadas com a revelação da conversa de José António Saraiva com Miguel Portas! Então, mas a homossexualidade, afinal, é um insulto? Não é apenas uma questão de orientação sexual, como defendem? Por isso, nós costumamos afirmar que, afinal, somos os verdadeiros defensores dos direitos dos homossexuais: é que nós não queremos saber da orientação sexual para nada. É-nos absolutamente irrelevante: o que interessa é o carácter da pessoa, a sua formação, a sua educação e a sua competência. Haverá forma mais efectiva de assegurar a igualdade?

6.Enfim, Paulo Portas deve estar a rir-se desalmadamente com esta polémica – e o seu carácter ridículo. Sabe perfeitamente que, politicamente, é “igual ao litro”. Para os portugueses, o verdadeiramente importante é o sentido de Estado, a cultura, a erudição e a inteligência de Paulo Portas. O resto é conversa. E conversa de treta (mais que aborrecida!). Aliás, as redes sociais deveriam estar a aplaudir e a registar o progresso civilizacional da Nação portuguesa: se fosse verdade (que julgamos que não é) que Paulo Portas era homossexual, hoje só poderíamos estar a registar o progresso civilizacional da Nação Portuguesa – ao contrário do vaticínio de Miguel Portas, Paulo Portas chegou a líder do CDS/PP e nunca ninguém quis saber com quem partilha a sua intimidade. Tal só mostraria a grandeza de espírito da Nação portuguesa!

7.Por último, importa atentar nas verdadeiras razões que justificam os ataques violentíssimos do “DN” a José António Saraiva. Ora, um dos episódios mais relevantes narrados pela figura mais importante do jornalismo português das últimas quase quatro décadas é o processo de tentativa de domínio da comunicação social por José Sócrates, utilizando para o efeito a PT (liderada por Zeinal Bava e Henrique Granadeiro, com o patrocínio de Ricardo Salgado). A intenção de José Sócrates é bem conhecida: comprar a TVI para afastar José Eduardo Moniz e Manuela Moura Guedes e colocar uma pessoa da sua confiança à frente da informação da estação de Queluz de Baixo. E quem era essa pessoa que Sócrates queria como Director de Informação da TVI? Pois bem, Paulo Baldaia, o actual director do “DN”…

A ira e o desejo de vingança contra José António Saraiva sentidos por Paulo Baldaia (e o grupo GlobalMedia, onde também se incluem os socráticos Afonso Camões e Domingos Andrade) são, pois, humanamente compreensíveis: se não fosse a denúncia do SOL e de José António Saraiva, José Sócrates teria conseguido montar o seu “polvo” na comunicação social, entregando a Paulo Baldaia o lugar de Director de Informação. Se não fosse o SOL, o director do “DN” teria concretizado o seu sonho de infância: ser director de uma estação de televisão…

Contudo, utilizar um jornal para fazer vingar questões pessoais ou recalcamentos pessoais de tempos idos – não é uma atitude nada bonita…É muito feio e pode colocar, a prazo, a credibilidade do jornal em risco…

8.Por último, uma pergunta aos que defenderam o director do “DN”: querem mesmo fazer o jogo de José Sócrates e dos socráticos? Sobretudo os “PSD’S” que andaram durante anos a brandir contra a claustrofobia democrática, querem agora voltar a apoiar os protagonistas dessa claustrofobia?