1.O Verão já terminou na semana passada: o Outono já aí está, o que mostra a rapidez com que o tempo passa. No entanto, para terminarmos definitivamente o Verão, impõe-se hoje evocarmos um facto político que marcou a época balnear: Marcelo Rebelo de Sousa.
Marcelo foi, para quem leu atentamente a nossa imprensa, o facto político do mês de Agosto. Dirá o leitor: “ o articulista esqueceu-se de completar o seu raciocínio: falou do facto político de Marcelo, mas esqueceu-se de referir qual é, em concreto, o facto político”. Não, nosso caríssimo leitor, não nos esquecemos: o facto político do Verão foi…Marcelo Rebelo de Sousa. Ele próprio; dispensa-se, pois, qualquer identificação adicional.
O Presidente Marcelo não tem que se esforçar muito para criar factos políticos e ocupar a agenda mediática: o nome “Marcelo Rebelo de Sousa” já se tornou uma marca, uma “brand” popular e com elevado índice de confiança e respeitabilidade junto dos “consumidores”. No Verão, que terminou há dias, praticamente não houve semana em que não se encontrássemos nas bancas uma revista social com Marcelo na capa.
Atente-se no exemplo da revista “FLASH!”: dedicou a sua capa a Marcelo Rebelo de Sousa durante três semanas consecutivas! Primeiro, foi Marcelo, no Brasil, mata saudades da família; depois, Marcelo prepara casamento; finalmente, Marcelo história de amor e divórcio complicado. E, esta semana, Marcelo Rebelo de Sousa foi novamente elevado a figura central da revista “cor de rosa” ou, numa qualificação mais sofisticada e rigorosa, do social (desta feita, sobre uma avô desconhecida em Moçambique, notícia aparentemente baseada numa das revelações de José António Saraiva no livro “Eu e os Políticos”).
2.Porquê esta insistência em Marcelo? Porque Marcelo vende jornais e revistas. Marcelo é popular devido à sua personalidade, à sua vida, à imagem que meticulosamente criou de si – resumindo, o Presidente da República Marcelo é uma figura que se ajusta na perfeição ao “público-alvo” das revistas sociais. Capas com segredos da vida privada de Marcelo é o segredo (ou truque) para esgotar revistas…
Estas considerações conduzem-nos a uma questão mais vasta, de natureza política: esta aparição sistemática, quase semanal, interessa a Marcelo Rebelo de Sousa? A resposta é clara como a água: interessa – e muitíssimo. A ubiquidade marcelista nas revistas da vida social é apenas um reflexo, uma consequência da estratégia político-comunicacional do Presidente.
3. Com efeito, Marcelo Rebelo de Sousa definiu uma estratégia assente em três vectores essenciais.
3.1.Primeiro, exponenciar o seu capital de popularidade como estrela televisiva, mantendo a sua agenda, as suas rotinas, os seus hábitos, actuando mais como Marcelo – do que como Presidente da República. Entre o Marcelo comentador televisivo e o Marcelo Presidente da República não conseguimos dilucidar diferenças significativas – não foi a Presidência que moldou Marcelo; foi Marcelo que moldou a Presidência. Marcelo fala às revistas sociais, Marcelo vai apresentar livros, Marcelo comenta todas as incidências nacionais, europeia e internacionais. Marcelo está em todo o lado e em toda a parte.
Note-se que só ouvimos falar de “Marcelo”, personalidade singular: nunca ouvimos falar de “Presidência da República”. Ou seja, Marcelo quer reforçar o seu peso enquanto órgão singular, aproveitando a sua popularidade televisiva. Toda a estratégia comunicacional é planeada para não se perder a força da “brand” Marcelo Rebelo de Sousa – prolongando, mantendo e até reforçando, a sua popularidade mediática. Quer-se criar o “Marcelo-Presidente” – sem se perder, no entanto, o “Marcelo-estrela de TV”.
3.2.Em segundo lugar, Marcelo prefere falar para revistas “cor de rosa” do que para jornais ou revistas ditas de referência. Marcelo prefere comunicar directamente com as publicações cuja temática principal não é a política – do que confrontar-se com uma entrevista política, efectuada por jornalistas políticos, necessariamente mais difícil e com um maior grau de risco. Até ao momento, o Presidente da República não concedeu qualquer entrevista a uma publicação jornalística cujo tema principal seja a política –só deu uma pequena entrevista à “Flash” e ao “Mirante de Bragança”.
No entanto, nós nem demos pela falta de Marcelo: é que Marcelo surge na TV todos os dias, a propósito e a despropósito, para além de comunicar directamente aos portugueses (sem filtro) no site da Presidência (os comunicados, as declarações e as notas do Presidente são depois amplificados pelo comunicação social). O que significa que Marcelo quer impor a sua personalidade, ao máximo, como arma política, como instrumento de “leverage” político- reduzindo, ao mínimo, as declarações sobre política.
Concluindo: Marcelo Rebelo de Sousa quer aparecer, ocupando o espaço mediático; o Presidente Marcelo quer resguardar-se, não se pronunciando sobre questões políticas. Neste sentido, compreende-se facilmente a tendência para Marcelo aparecer com insólita regularidade nas revistas sociais (só no Verão, Marcelo foi capa, além da FLASH, da TV 7 dias, da NOVA GENTE, da CARAS, da TV GUIA, da LUX, da VIP) – cria-se a sua aura de personalidade singular, de “pop star”, sem se aborrecer com a “porca da política”.
3.3.Em terceiro lugar, Marcelo Rebelo de Sousa construiu a sua equipa já a pensar na relação a estabelecer com a comunicação social enquanto Presidente da República. Normalmente, a política de comunicação era ajustada à equipa escolhida pelo Presidente – desta feita, com Marcelo, foi a equipa que foi constituída face à política de comunicação que o Presidente da República previamente definiu.
De facto, os assessores do Presidente integram dois jornalistas de peso (Maria João Ruela e Paulo Magalhães – curiosamente, ambos moderadores de Luís Marques Mendes e alternando as estações de televisão- SIC e TVI, respectivamente), um comentador televiso de política (Pedro Mexia), um conselheiro de Estado que é o comentador mais visto em Portugal (Luís Marques Mendes) e um outro comentador respeitado, com ligações ao mundo empresarial e uma das referências da direita portuguesa (António Lobo Xavier).
4.Donde, Marcelo Rebelo de Sousa confere mais relevância à política de comunicação – do que à comunicação da política. Da sua política. O Presidente quer assumir-se mais pela legitimidade mediática do que pela legitimidade política de exercício – vai querer evitar, tanto quanto possível, assumir posições políticas sobre qualquer tema. O poder de influência de Marcelo vai jogar-se nos bastidores (nas conversas tidas com os responsáveis políticos, quer do Governo, quer da oposição) e na comunicação social.
5.E aqui ganha particular destaque as revistas sociais – aumentam a popularidade sem beliscar a estratégia política…Parece que Marcelo Rebelo de Sousa, como Presidente, aderiu ao partido rosa. Das revistas “cor de rosa”, entenda-se…