Há cada vez mais crianças com tosse convulsa a chegar aos hospitais. Até agosto foram notificados à Direção-Geral da Saúde 420 casos da doença, 90% dos quais em crianças com menos de 15 anos e a grande maioria em bebés com menos de um ano de idade – 287 casos. Os dados divulgados no portal de transparência do Serviço Nacional de Saúde revelam que, até agosto, o número de casos já era quase o dobro de todo o ano passado. Em 2015 foram notificados 239 casos de tosse convulsa, 170 dos quais em crianças até um ano de idade.
Graça Freitas, subdiretora-geral da Saúde, garante que a evolução da infeção causada pela bactéria Bordetella pertussis – e que se caracteriza por episódios de tosse cavernosa, repetida e com um ruído de estertor – está a ser acompanhada de perto pela Direção-Geral da Saúde (DGS). O aumento dos casos começou a verificar-se em 2012 e a responsável admite que o facto de ter sido criado, entretanto, um novo sistema de declaração de doenças infecciosas – o SINAVE (Sistema Nacional de Vigilância Epidemiológica) – poderá estar a contribuir para mais notificações do que no passado. Ainda assim, este sistema já existia em 2015 e a responsável diz que o aumento dos casos este ano não deve ser desvalorizado, tendo já levado a DGS a reforçar a monitorização. Até ao momento, revela Graça Freitas, a maioria tem tido uma evolução clínica favorável, mas já houve um bebé que não sobreviveu às complicações da doença, que incluem quadros de pneumonia, colapso pulmonar e fragilidade geral. No ano passado, a tosse convulsa causou a morte a dois recém-nascidos.
Crianças até dois meses mais vulneráveis Segundo os dados divulgados no portal do SNS, a região Norte regista o maior número de casos, seguida das regiões Centro e Lisboa e Vale do Tejo. Já a análise da DGS revela que a maioria dos casos acontecem nos primeiros dois meses de vida. Uma vez que a vacinação contra a tosse convulsa só pode ser feita a partir desta idade com a vacina DTP – dada em três doses e que protege, além da tosse convulsa, da difteria e do tétano –, o acompanhamento da doença levou a DGS a emitir em julho uma norma que recomenda a todas as grávidas fazerem uma nova vacina, que permite passar alguma imunidade aos recém-nascidos.
A responsável explica que, uma vez que não é seguro dar a vacina mais cedo às crianças – por exemplo, logo à nascença, como se faz com a vacina da hepatite B –, a solução encontrada a nível internacional para responder ao aumento dos casos de tosse convulsa, que se verifica também noutros países, tem sido recomendar a vacinação das grávidas na última fase da gestação, de forma a transmitirem anticorpos aos filhos através da placenta. “Seguimos a intervenção implementada no Reino Unido, o país que tem maior tradição na vacinação. Alguma proteção até aos dois meses será melhor do que nada”, diz a responsável.
Já a partir do próximo ano, a vacina que a DGS recomenda que seja tomada até às 36 semanas de gravidez estará incluída no Programa Nacional de Vacinação, passando a ser distribuída gratuitamente nos centros de saúde. Graça Freitas adianta que a adesão por parte das grávidas e dos obstetras tem sido boa, mas a inclusão no Programa Nacional de Vacinação é essencial. Neste momento há, porém, dificuldades no mercado e o produto tem estado esgotado, aguardando-se reposição de stock, lamenta a responsável. Apesar de existirem duas vacinas destinadas à inoculação de adultos, apenas uma está disponível em Portugal. O site do Infarmed confirma que a vacina Boostrix, que custa 19,55 euros, está neste momento “temporariamente indisponível”.
Cuidado com as festas aos bebés Além da vacina, que a DGS espera que, no futuro, venha a mitigar o problema, Graça Freitas diz que o aumento dos casos deve levar as famílias a ter ainda mais cuidado com a exposição das crianças, em particular dos recém-nascidos, a pessoas com sintomas de constipação e com tosse. “É preciso ter a consciência de que somos nós, adultos, que passamos a bactéria às crianças. Como estamos quase todos vacinados, uma tosse que, por vezes, se diz até ser tosse de fumador pode, na realidade, ser um quadro ligeiro de tosse convulsa. Se as crianças apanharem a bactéria, pode ter maior repercussão nelas.”
Trocar beijinhos por festas no alto na cabeça e ter uma boa higiene das mãos, como recomendam as regras de prevenção de todas as doenças contagiosas, é uma das mensagens da subdiretora-geral da Saúde. A especialista diz que, com os avanços da medicina, é possível dar uma maior resposta a estes casos do que no passado, mas alerta que, nas situações mais graves, a doença é séria e pode motivar grandes períodos de internamento, com sofrimento para as crianças e famílias.