As boas sondagens

Perante a tendência que se observa nas sondagens, que apontam para uma subida da esquerda e uma estagnação ou uma descida da direita, a maioria dos comentadores conclui que o Governo tem agido normalmente bem.

Que o país está na trajetória certa.

Ora, a leitura deveria ser exatamente a oposta.

Num país em que a economia não cresce e o dinheiro não estica, o Governo deveria estar a tomar medidas restritivas, que conduziriam necessariamente a descidas nas intenções de voto.

Se isso não acontece, é porque o Governo não está a fazer o que devia.

Está a dar o que não pode.

E isso não poderá deixar de vir a ter más consequências no futuro.

Dirá a esquerda que a razão do sucesso do Governo é outra: é o facto de distribuir melhor os sacrifícios.

Antes, seriam os pobres a pagar a crise, agora serão os ricos.

É esta a lógica de Mariana Mortágua.

Sucede que esta forma básica de ver as coisas só nos pode conduzir ao abismo.

Toda a gente sabe que em Portugal não há dinheiro, pelo que o investimento estrangeiro é vital para o nosso desenvolvimento.

Ora, quem investirá num país onde o Governo, pressionado pela extrema-esquerda, se assume como uma espécie de Robin dos Bosques?

Quem investirá num país que reverteu privatizações já feitas, como as dos transportes urbanos e da TAP, mostrando não ter respeito por empresários que aqui quiseram apostar?

Quem investirá num país que acaba de agravar ainda mais as taxas sobre as casas de gama alta, mostrando intenção de explorar até ao tutano quem queira aplicar capital no imobiliário?

Quem investirá num país onde o Governo tentou pôr o fisco a devassar as contas bancárias?

Quem investirá num país que andou para trás nas reformas estruturais, que aumentou o salário mínimo (numa altura em que o desemprego é altíssimo) e que a toda a hora altera as tabelas fiscais?

Em lugar de caminharmos no sentido de atrair os investidores estrangeiros (e os portugueses que amealharam uns tostões e poderiam investir), assustamo-los todos os dias com novos ataques.

Voltando à questão das sondagens, há quatro fatores que, para lá da política seguida pelo Governo, têm contribuído para os bons números da esquerda (e de António Costa).

O primeiro é o marketing que o Executivo faz de si próprio, a lembrar os tempos de Sócrates. O primeiro-ministro aparece todos os dias na TV dizendo que está tudo bem.

O segundo é o apoio objetivo de Marcelo Rebelo de Sousa ao Governo, fazendo de autêntico ‘bombeiro de serviço’.

O terceiro é a cumplicidade da CGTP. Contrastando com tempos recentes, em que havia manifestações todos os dias e um ambiente pré-insurrecional, hoje a CGTP segue as indicações do Partido Comunista de apoio político ao Governo.

O quarto é a complacência da comunicação social, que foi de uma agressividade extrema durante os quatro anos da troika e hoje é quase colaborante.

A realidade pode resumir-se assim: antes o Governo tinha más sondagens mas o país estava na trajetória certa; hoje, as sondagens são boas mas o país está na trajetória errada.

Os portugueses estão mais satisfeitos, mas o país está mais pobre: o PIB caiu, o investimento caiu, a dívida pública aumentou, as exportações caíram (só subiram em agosto por causa do turismo), o défice da balança voltou a ser negativo.

O Governo não está a fazer o que deveria fazer.

Não está a acautelar o amanhã.

A situação portuguesa faz lembrar a história da cigarra e da formiga.

Maria Luís Albuquerque andou a amealhar para António Costa gastar.

No meio do descalabro, o Governo agarra-se ao défice público como a tábua de salvação.

«Vamos ter o défice abaixo de 3%, abaixo de 2,8%, até abaixo de 2.5%», repete Costa diariamente.

E a extrema-esquerda aplaude.

Não se lembrando que todos eles – do PCP ao BE, passando pelo PS – garantiram que, se fossem Governo, iriam ‘obrigar’ a Europa a rever o Tratado Orçamental e a flexibilizar o défice.

Se não fosse o défice, a que poderia hoje o Governo agarrar-se?

Qual seria a sua tábua de salvação?

É que todos os objetivos, como vimos, falharam; só ainda não falhou aquilo que a esquerda diabolizava.