“A possibilidade de fazer algo de revolucionário, de novo, de diferente é tudo o que eu quero”, dizia há dois anos João Cepeda, que há quase dez anos trouxe a Time Out para Lisboa, depois para o Porto, numa entrevista a Pedro Marques Lopes, para o “Diário de Notícias”. A mesma entrevista que havia de ser interrompida por um telefonema em que acrescentava: “Ainda não estamos onde eu quero, isto ainda não está de nível mundial.” Era a altura em que a revista se materializava em edifício, lugar de experiências, restaurantes, 35 quiosques ao todo, das especialidades regionais às refeições de chefes como Henrique Sá Pessoa. Curadoria de comida por uma revista que se especializou nela, e não só, ideia posta em marcha quando em 2010 a Câmara de Lisboa concessionou ao franchising português da revista a remodelação do Mercado da Ribeira, e que o tempo veio a provar ser de génio.
Coisa que já se tinha percebido quando a Time Out International anunciou a compra do franchising das revistas portuguesas, em 2015, e que se confirmou este verão com o anúncio de que o modelo lisboeta seria replicado em Londres e Nova Iorque, primeiro, depois por todo o mundo. Louros para João Cepeda, entretanto nomeado CEO de uma nova unidade de negócio do Time Out Group: a dos mercados.
Será Shoreditch o bairro londrino a acolher a partir do segundo semestre do próximo ano, no número 106 da Commercial Street, o primeiro mercado feito à imagem do Time Out Mercado da Ribeira, com 17 restaurantes, uma cooking academy, quatro bares, uma loja e uma galeria de arte, anunciou a Time Out London, que promete “servir o melhor que há na cidade debaixo de um só teto”. Um novo espaço que, escreve o londrino “Evening Standard”, seguirá “o sucesso de um projeto similar que já existe em Lisboa desde 2014, e que atrai dois milhões de visitantes anuais”, lembrando que um projeto semelhante está prestes a abrir na estação de São Bento, no Porto, e que na calha está também Nova Iorque.
Ao “Expresso”, aquando do anúncio da expansão dos mercados Time Out para Londres e Nova Iorque, João Cepeda falava no “grande orgulho” que sentia ao ver um projeto “de uma equipa pequena em Lisboa” despertar o interesse de um “fundo de grande dimensão como o Oakley [Capital Investments]”, proprietário da Time Out Group. “O grupo acompanhou o processo do Mercado da Ribeira desde o início, viu o sucesso do conceito e no final do ano passado surgiu a primeira abordagem no sentido de tentar levar esta ideia mais longe”, explicava o fundador das revistas de Lisboa e do Porto. Em novembro de 2015, altura em que o franchising português da revista era comprado pela Time Out International, que controlava apenas as revistas de Londres e Nova Iorque, Cepeda anunciava a novidade e lembrava no editorial que, de acordo com o então mais recente estudo internacional da marca, a Time Out Lisboa era “uma das três edições mundiais da Time Out com maior respeito e popularidade local”.
Mas não era essa a única razão do interesse do grupo no franchising português. Nem a mais óbvia, acrescentava. Essa tinha um nome, que era Time Out Market, e ficava no Mercado da Ribeira, no Cais do Sodré: “Um projeto que tornou a nossa empresa na primeira do mundo dos media a inventar um espaço onde os conteúdos podem ganhar vida e cujo sucesso, que felizmente escalou fronteiras, dará lugar a pelo menos sete réplicas nos próximos anos e em grandes cidades do mundo.”
Passos largos
Em 2014, Cepeda dizia ao telefone que ainda não estava onde queria. Talvez esteja agora a caminhar para isso, e a passos largos. É ver as últimas notícias e os artigos na “Lonely Planet” e no “Guardian” apresentarem ao mundo o Time Out Mercado da Ribeira no topo das listas de melhores cafés e restaurantes de Lisboa – “siga os locais” para este lugar “a não perder”, escreve um; “a primeira aventura foodie permanente da Time Out”, sublinha o outro.
A Time Out chegou a Lisboa em setembro de 2007, pela mão de João Cepeda, acabado de chegar de Londres, onde tinha trabalhado como correspondente para vários órgãos de comunicação, e que parece ter encontrado uma fórmula para enfrentar a crise que atravessa a imprensa escrita desde a chegada do digital. “Os jornais, revistas e todo o sector dos media vivem uma revolução que ninguém sabe muito bem onde vai parar. Mas há algo que está a bloquear todo o pensamento sobre o futuro e o presente: a ideia de que o digital é tudo. O futuro é o digital e não se sai disto”, dizia na mesma entrevista ao “Diário de Notícias”, em que acrescentava sobre o projeto do Mercado da Ribeira ser “um exemplo” de caminhos por onde é possível inovar. “Algo ancorado num projeto editorial e que é um prolongamento desse mesmo projeto. Os restaurantes escolhidos estão aqui não porque pagaram mais pelo espaço, mas porque foram avaliados pela revista como os melhores”, acrescentava, defendendo que não é o digital o único caminho possível para a imprensa escrita. “Há mais caminhos e o facto é que os investimentos no digital são brutais e com um retorno mais do que suspeito ou, pelo menos, a muito longo prazo. É evidente que têm de ser feitos, mas esses investimentos não nos podem fechar a novas ideias ou a novos conceitos, pelo contrário.”