Já se sabia que o ministro das Finanças alemão não tinha simpatia pela “geringonça”, mas Wolfgang Schäuble nunca tinha sido tão claro nas suas preferências em relação à política interna portuguesa. «Portugal estava a ser muito bem sucedido até entrar o novo Governo», disse, esta semana, citado pela agência financeira Bloomberg.
O «novo Governo» não demorou a responder-lhe. António Costa – um dia depois de Schäuble ter revelado que avisou Centeno de que «se seguirem esse caminho vão assumir um grande risco» – disse que o «preconceito é muito pouco inspirador para se falar com tino». O primeiro-ministro garante que dá «sobretudo atenção aos alemães» que conhecem e investem em Portugal «e, por isso, sabem do que falam».
As declarações mais duras ficaram a cargo do líder parlamentar do PS. Carlos César classificou o ministro alemão como um «um incendiário que se propõe vender a imagem de bombeiro. Tem feito infelizmente isso não só no caso da economia portuguesa como em outros casos de outros países europeus».
Foram vários os socialistas a tornar pública a sua indignação com o ministro alemão. Principalmente por se imiscuir na política interna portuguesa num apoio evidente a Passos Coelho. «PSD e CDS gostam desta ingerência, mas Portugal é uma República soberana. Jamais daremos a outra face aos ataques de certa Alemanha», afirmou o deputado socialista Tiago Barbosa Ribeiro.
Parlamento discute «declarações ofensivas»
Não foi a primeira vez que Schäuble entrou em choque com Portugal – antes do Verão lançou o fantasma do segundo resgate – , mas desta vez a polémica vai chegar o parlamento. O Bloco de Esquerda apresentou um voto de protesto, que deverá ser votado esta semana, com o objectivo de que a Assembleia da República expresse «o seu repúdio pelas declarações ofensivas para Portugal proferidas pelo Ministro das Finanças alemão, Wolfgang Schäuble». O BE classifica as afirmações do ministro alemão como «graves por potencialmente afetarem negativamente as relações europeias e internacionais».
«Schäuble não disse nenhuma mentira»
Apesar de Schäuble apoiar o governo de Passos, o PSD distancia-se da polémica declaração. Duarte Marques, coordenador do partido na comissão parlamentar de Assuntos Europeus, defende, em declarações ao SOL, que «não faz sentido nenhum» um ministro alemão envolver-se na discussão política nacional. O deputado do PSD condena também a reação do primeiro-ministro português: «Ridícula também é a resposta de nosso primeiro-ministro. A verdade, e o mais grave, é que Schäuble não disse nenhuma mentira e as pessoas sabem disso».
Seja como for, Paulo Rangel, eurodeputado do PSD, já prometeu levar o assunto ao Parlamento Europeu para condenar as «lamentáveis» declarações do político alemão. À Rádio Renasçença, Rangel defendeu que Schäuble «excedeu as suas próprias competências. Não é aceitável que um ministro de um governo nacional faça considerações deste tipo sobre o que passa noutro país».
Esta é, pelo menos, a terceira vez que o alemão ataca o Governo socialista. O primeiro aviso foi feito apenas dois meses depois de António Costa chegar ao poder. Wolfgang Schäuble alertou que «Portugal deve prestar muita atenção ao que se passa e não continuar a perturbar os mercados, dando a impressão que querem recuar no caminho percorrido até aqui. Isso sim seria muito perigoso para Portugal». Dez meses depois, o poderoso ministro das Finanças não mudou de opinião em relação à ‘geringonça’.