A 1.ª Secção de Instrução Criminal da Comarca de Lisboa decidiu levar Duarte Lima a julgamento pela apropriação indevida de mais de cinco milhões de euros pertencentes a Rosalina Ribeiro e arrasou os argumentos apresentados pelo ex-líder da bancada parlamentar do PSD. No despacho de pronúncia, a juíza de instrução chega mesmo a afirmar que o esquema das transferências de dinheiro da antiga companheira do milionário Lúcio Feteira para Duarte Lima terá sido uma espécie de “solução milagrosa” para que esta conseguisse fugir a possíveis arrestos que surgissem no âmbito de processos interpostos por Olímpia Feteira – cabeça de casal da herança.
A magistrada acompanha ainda a acusação do Ministério Público (MP) ao concluir que o acordado com a vítima seria que Lima devolvesse o dinheiro quando esse perigo já não existisse, o que acabou por não acontecer (a assinatura de uma declaração isentando-o da responsabilidade de qualquer transferência foi segundo as autoridades brasileiras o motivo do assassinato). Enquanto espera a marcação de julgamento no Brasil por homicídio, em Portugal Lima vai responder pela prática do crime de abuso de confiança qualificado, punível com uma pena de prisão que varia entre um a oito anos de prisão.
Os factos da acusação Em abril deste ano, Duarte Lima foi acusado pelo Departamento Central de Investigação e Ação Penal por abuso de confiança e apropriação indevida de mais de cinco milhões de euros de Rosalina Ribeiro, ex-companheira de Lúcio Feteira. O dinheiro que o Ministério Público do Brasil sempre defendeu ser o móbil do crime, que aconteceu em dezembro de 2009.
No total, serão 5 240 868,05 euros que a vítima transferiu para o seu advogado com vista a evitar que as suas contas fossem arrestadas, nunca os tendo recuperado. No Brasil, a investigação acredita que foi uma ameaça de Rosalina – de que entregaria Lima ao tribunal – que precipitou o homicídio.
Abertura de instrução Por discordar dos factos da acusação do Departamento Central de Investigação e AçãoPenal, o antigo deputado social-democrata pediu a abertura de instrução para tentar evitar o julgamento. Acabou, porém, pronunciado.
Segundo a juíza de instrução criminal, foram recolhidos pela acusação diversos indícios de que Duarte Lima se aproveitou da confiança da vítima para se apoderar do dinheiro.
Em 2001, no meio de tantas guerras judiciais, a antiga companheira de Lúcio Feteira tinha receio de ficar sem nada e o esquema apresentado pelo seu advogado – de transferir o dinheiro para as suas contas – surgira como “uma solução milagrosa”, refere o despacho de pronúncia.
No documento a que o i teve acesso, pode ler-se: “É plausível de acordo com as regras da experiência comum que quando o arguido, pessoa respeitada como advogado e ex-líder parlamentar do PSD, lhe apresentou uma solução imediata para este seu problema,Rosalina a aceitasse sem hesitar, acreditando que o arguido era pessoa honrada e confiável”.
O dinheiro transferido O dinheiro que acabou na esfera de Duarte Lima começou a chegar às contas de Rosalina em março de 2001. A vítima abriu uma conta em seu nome no UBS de Zurique, na Suíça, para onde transferiu quase de imediato 4,4 milhões de uma conta de que era titular solidariamente com Lúcio Feteira, então já falecido.
Esse dinheiro foi transferido em três tranches: 133 778 euros; 1 014 445 euros; e 3 296 561 euros.
No entanto, como existia o perigo de ver todos estes montantes arrestados no âmbito das ações colocadas por Olímpia Feteira, Duarte Lima – defendem os investigadores – em data não apurada, mas ainda no mês de março, sugeriu a Rosalina que transferisse os cinco milhões para a sua esfera “para salvaguardar o seu quinhão de herança”.
Segundo a acusação, a combinação era simples. Rosalina transferia o dinheiro para as contas do ex-deputado e este comprometia-se a devolver a quantia quando estivesse ultrapassado o receio de as suas contas serem arrestadas. Ou seja, quando ficasse definido o valor que lhe caberia, no fim das ações judiciais. Mas não foi isso que aconteceu.
Lima desmascarado Lima não esperou tempo nenhum. Pouco depois das transferências começou logo a usar o dinheiro “de acordo com os seus interesses e necessidades”.
Além de usar o dinheiro para despesas pessoais, terá ainda pago uma percentagem a Francisco Canas – conhecido como Zé das Medalhas – pela lavagem de dinheiro.
Duarte Lima defendeu desde o primeiro momento que os mais de cinco milhões teriam sido honorários adiantados pagos por Rosalina Ribeiro, mas a investigação apurou que o ex-deputado nunca declarara sequer ao fisco tal quantia, o que solidifica a tese de que o dinheiro não era para si.