São 4:54 horas, hora de Lisboa, de dia 9 de novembro de 2016. À medida que a madrugada avança, a vitória de Donald Trump nas eleições presidenciais norte-americanas parece cada vez mais provável. Quase todas as sondagens davam a vitória a Hillary Clinton, mas é impossível quantificar aquilo a que posso chamar o “fator-vergonha”: as pessoas que tencionavam votar em Trump, mas que na sondagem não tiveram coragem de o admitir. Por esse motivo, em 1980, as sondagens davam a vitória ao Presidente Carter, mas quem ganhou foi Ronald Reagan.
Assim, parece que o novo líder do mundo livre vai ser o homem a quem Colin Powell chamou “uma desgraça nacional”. Vai empenhar-se desde a primeira hora em erradicar o trabalho do Presidente Obama, começando por destruir a reforma do sistema de saúde conhecido por Obamacare. Se for bem-sucedido neste seu intento, os desempregados vão voltar a deixar de ter direito a cuidados de saúde gratuitos, ou a um preço simbólico, tendo de suportar a totalidade dos custos com a sua saúde ao preço real (que, como bem sabe quem tiver animais domésticos em Portugal, são caros). Portanto, não há dúvidas quanto à humanidade de Trump: um tipo porreiro, sem dúvida.
Quanto aos mercados, eis as minhas previsões, que quando ler esta crónica já poderá confirmar se estão corretas ou não: as bolsas vão descer, as taxas de juro vão subir, e o dólar norte-americano vai descer (exceto em relação ao peso mexicano, a moeda da tal, citando Trump, “nação de violadores”, que devem ser expulsos dos Estados Unidos porque “têm gente muito má”).
Apesar de a taxa de desemprego nos Estados Unidos ser de 5%, baixa pelos padrões europeus, Trump ganhou, também, com os votos dos perdedores da globalização: aqueles que perderam os seus empregos porque a fábrica onde trabalhavam foi encerrada e reaberta na China, ou em qualquer outro lugar onde a mão-de-obra seja mais barata. Trump prepara-se agora para voltar ao bom e velho protecionismo norte-americano, criando taxas alfandegárias elevadas para desencorajar as importações. Não será de admirar que os países afetados por essas taxas retaliem da mesma forma, e que todos fiquem a perder.
Quando penso em Trump não posso deixar de me recordar do Reino Unido, outro país que votou recentemente para se afastar do resto do mundo, com a saída da União Europeia, vulgo brexit. No Reino Unido, os bancos londrinos estão a planear as suas mudanças para outras paragens, em muitos casos para Frankfurt, onde está sedeado o Banco Central Europeu (embora isso não vá acontecer nos Estados Unidos; Nova Iorque continuará a ser a capital financeira mundial).
Também devido ao brexit, a Nissan ameaçou fazer sair do Reino Unido a fábrica onde constrói aqueles magníficos automóveis que são os Qashqai, e só aceitou ficar depois de cedências do governo conservador liderado por Theresa May. E, por fim (que é apenas o início das coisas que estão para vir), os chocolates Toblerone, para fúria dos seus consumidores, baixaram o peso das barras para não terem de aumentar o preço: é que como a libra esterlina caiu muito nos mercados, o cacau ficou mais caro no Reino Unido, o que encareceu os chocolates.
Nos Estados Unidos, e com o protecionismo que Trump se prepara para implementar, é natural que os Toblerone também desçam de peso, sem qualquer vantagem para contrabalançar. De forma geral, o comércio livre beneficia todos, e os Estados Unidos, apesar de serem a maior economia mundial, vão sofrer com a perda de mercados externos.
Os americanos votaram e decidiram. Esperamos agora por assistir a uma série de erros e de trapalhadas do Presidente Trump. Mas nunca se esqueçam de quem são os nossos aliados, mesmo que de tempos a tempos cometam idiotices.
“Keep on rockin’ in the free world…”.