Uma boa privatização… que está agora a ser paga

A Vinci está a recuperar o seu investimento, não sobretudo pelo investimento, mas de uma forma muito mais simples: aumentando o preço que cobra em taxas aeroportuárias a cada passageiro

Decorria o ano de 2012 quando a ANA foi privatizada. Uma das maneiras mais usuais de avaliar uma empresa é calcular alguns indicadores da sociedade em questão, e multiplica-los. Lembro-me que na altura da privatização a então secretária de Estado do Tesouro, Maria Luís Albuquerque, ter referido com orgulho que a ANA foi vendida por 16 vezes o seu EBDITA (uma medida da eficiência operacional da empresa), e que por isso tinha sido vendida a um preço bem interessante. Na altura escrevi um texto a elogiar a habilidade negocial do governo, e a dizer também que se o comprador, a Vinci, tinha pago tanto dinheiro, era porque tencionava investir na ANA para a tornar mais lucrativa, e assim recuperar o seu investimento.

Fui muito ingénuo. A Vinci está a recuperar o seu investimento, não sobretudo pelo investimento, mas de uma forma muito mais simples: aumentando o preço que cobra em taxas aeroportuárias a cada passageiro.

O Expresso de ontem trás uma peça sobre a ANA, com várias informações interessantes. Por exemplo, David Neeleman, um dos membros do consórcio que comprou uma participação na Tap, diz que desde que a ANA foi privatizada, o que a Tap tem de lhe pagar subiu 78%. E não é por os voos da Tap terem aumentado 78%, foi sobretudo pela via de aumentos de preços: que foram nove, com um aumento de custos de 36%, segundo um dirigente de uma associação de companhias aéreas; que foram quatro aumentos de preço, segundo a ANA.

Poderíamos também pensar que, como o tráfego aeroportuário em Portugal está a subir, a ANA podia descer o preço que cobra por passageiro sem prejudicar em muito as suas receitas. Mas, segundo David Neelman: “Como o contrato de concessão está feito hoje, permite que quantos mais passageiros houver, mais se pode aumentar o custo por pessoa”. Absolutamente brilhante! Quem inventou este modelo de negócios devia ser condecorado.

De referir que esta não é uma questão menor para as companhias aéreas. Para a EasyJet, as taxas aeroportuárias são o segundo custo mais importante, logo atrás do combustível-

Não vou entrar em mais detalhes. Direi apenas que assim é muito fácil vender caro, se são os consumidores, mais tarde, que irão pagar o preço. O turismo é uma das maiores e mais importantes indústrias de Portugal, porque dinamiza a atividade económica, e porque ajuda a equilibrar as nossas relações comerciais com o exterior. Neste momento, a atividade turística portuguesa bate recordes. Se a ANA continuar no mesmo rumo, pode ajudar a matar a galinha dos ovos de ouro.