É preciso descaramento

Avoila queixa-se de barriga cheia. Talvez alguns anos no desemprego lhe mudassem as perspetivas. 

Com o PCP na geringonça, a paz social tinha regressado a Portugal. As greves sucessivas do período do governo PSD/CDS, que transformaram a vida num inferno a quem tem de andar de transportes públicos na grande Lisboa, já para não falar de escolas e tribunais encerrados, e de hospitais reduzidos aos serviços mínimos, pareciam algo de passado.

Mas a CGTP ou o PCP (tenho sempre muitas dúvidas em qual manda em qual) acharam que um ano de paz social era demais. Assim, “camaradas, estamos de novo em luta”: os funcionários públicos marcaram uma manifestação para amanhã, sexta-feira 18 de novembro, em Lisboa. Como consequência, vários serviços públicos ficarão encerrados-

O Diário de Notícias entrevistou Ana Avoila, coordenadora da Frente Comum de Sindicatos da Função Pública. O motivo da manifestação? Basicamente, querem mais dinheiro e menos trabalho: aumentos salariais, descongelamento de carreiras, e 35 horas de trabalho semanal para todos.

Não pretendo com esta crónica criar divisões público/privado. Mas é um facto que, de forma geral, os funcionários públicos têm boas condições de trabalho, e também que, excetuando as chefias, são melhor pagos do que no setor privado.

A entrevista de Avoila continuou com os clichés costumeiros, como não nos vergarmos às ordens de Bruxelas, e taxar as grandes fortunas. O habitual.

Só achei descaramento a mais quando Avoila mencionou que “temos 8.000 milhões de dívida para pagar contra quatro mil milhões de euros para investimento”. Está correto, minha senhora. E, se as vossas reivindicações fossem atendidas, de onde viria o dinheiro? Do pagamento dos juros da dívida não poderia ser, logo teria de vir do investimento. Do tal investimento que está em falta, tão necessário para modernizar o país e para criar postos de trabalho.

Avoila queixa-se de barriga cheia. Talvez alguns anos no desemprego lhe mudassem as perspetivas.