Para já, e como tornou público o senhor Pierre Moscovici, comissário europeu para os Assuntos Económicos e Financeiros, nem serão necessárias medidas de austeridade adicionais ao Orçamento para 2017 (e, desta vez, parece que não haverá discussões estéreis sobre planos B, C ou D), nem corremos o risco de Bruxelas cortar o acesso aos fundos europeus. Pelo menos, até ver, porque há ainda a nota «desde que os riscos de desvios não se materializem».
Ou seja, na avaliação prévia da Comissão Europeia, Mário Centeno passou o teste com distinção, o que parece confirmar que o reconhecimento dos políticos portugueses entre os eurocratas parece ser inversamente proporcional à respetiva popularidade ou à avaliação interna das qualidades e habilidades políticas dos mesmos.
Teóricos ou técnicos capazes de implementar as diretrizes europeias independentemente das ideologias ou convicções que norteiam os respetivos programas nacionais ou partidários é o que colhe em Bruxelas.
Por isso, jamais um populista grego como Yanis Varoufakis teria lá lugar e técnicos ou teóricos como os portugueses Vítor Constâncio ou Vítor Gaspar por lá andam e hão de andar. Como bem andou Durão Barroso. E Maria Luís Albuquerque só não está lá porque provavelmente ainda espera sujeitar-se a algum outro teste de popularidade por cá.
Não obstante os sinais serem claramente positivos, há que ter os pés assentes na terra.
Porque só falta que o Governo de coligação de esquerda adote o discurso que criticou ao anterior Governo de coligação de direita: «O país está melhor, os portugueses é que ainda não o sentiram». Ou, pior, tenha o topete de dizer que os portugueses já começam a sentir que o país está melhor.
Não sentem e não é com promessas de efeito diferido no tempo que o vão sentir.
A austeridade não acabou, nem está para acabar tão cedo. Nem pode – olhem os desvios.
Podemos não ter tido o cataclismo que Passos Coelho profetizava para setembro. Mas estamos longe da bonança que pauta os discursos de António Costa e Catarina Martins (Jerónimo de Sousa, na boa tradição do PCP, é um caso à parte).
Há motivos para a ‘geringonça’ lançar foguetes?
Há: a solução governativa está para durar e, mesmo para os mais céticos, começa a desenhar-se a linha do horizonte da legislatura.
E há motivos para os portugueses lançarem foguetes?
Estão a brincar? Porquê?
A economia nacional está melhor? Onde?
Está, mas no turismo. Beneficiando, não de um plano estratégico e de um investimento estruturado, mas de um conjunto de fatores externos e internos que esperemos que não sejam meramente sazonais e temporários.
Por pura coincidência, a 1 de outubro passado escrevi nesta página um texto sob o título ‘O Barril do Turismo’, que pretendia chamar a atenção para a importância deste setor no presente e no futuro da economia nacional.
O turismo, como bem provam os indicadores do INE referentes ao trimestre que terminou a 31 de setembro, foi fundamental para o crescimento económico (ainda assim tímido) e para o equilíbrio das contas públicas.
Ora, se o turismo já é estratégico e sê-lo-à para o futuro do país, há que ter em atenção alguns sinais (e notícias) preocupantes.
Ontem, na edição de fim de semana, o i deu conta do imbróglio judicial em que está enredado o Instituto do Turismo com as agências de publicidade concorrentes à gestão dos seus planos de comunicação e marketing.
As agências preteridas impugnaram judicialmente o concurso, uma vez que a agência vencedora apresentou preço 70% inferior ao valor referencial apresentado pelo Instituto do Turismo. Sim, 70% – ou seja, praticamente sem margem de lucro. E enquanto a querela não for resolvida, a comunicação e marketing do turismo de Portugal faz-se pelos mínimos. Enfim, se o setor é estratégico…
Outra questão que não tem sido valorizada é o número de crimes com armas de fogo que têm sido notícia diária nos meios de comunicação social.
Portugal beneficia de um crescimento exponencial de procura por parte de turistas europeus, asiáticos e americanos por, antes de mais, ter a fama de país de brandos costumes, com índices de criminalidade violenta baixos.
Aqui, tanto como os números, importa o sentimento de segurança dos cidadãos (turistas ou não).
E ninguém parece estar preocupado com o aumento do número de armas a circular em Portugal, sejam legais (já são mais de 1,5 milhões) ou, particularmente, ilegais (pelo menos, outras tantas). É demasiado. E o risco do sentimento de insegurança aumentar é, por isso, maior. Com todos os custos inerentes e mais um, que também pode ser fatal: precisamente, o reflexo imediato no turismo.
Uma última nota, igualmente relacionada com Portugal e o futuro (mas que não tem nada a ver com o congresso promovido nos anos 90 por Mário Soares, e, sim, com o artigo que o seu sucessor em Belém deu à estampa no Público de segunda-feira): Jorge Sampaio escreveu prolixo e interessante texto sobre o futuro de Portugal, a Europa e o Mundo e a necessidade urgente de uma profunda reflexão. Porém, com uma omissão inexplicável: ao longo de 20 mil caracteres, nem quatro dedicou à CPLP – ora, ainda que o futuro de Portugal passe pelo reforço da via europeísta, jamais pode virar costas ao Atlântico e aos países que falam a língua portuguesa. Antes pelo contrário.