Antes de mais porque ainda se vive a ressaca da eleição de Donald Trump, uma situação de dor física e vergonha alheia para Zimler, que apesar de ali já não viver, nunca deixa de prestar atenção ao país onde nasceu e cresceu.
Depois porque, falar com Zimler, acaba sempre por ser falar sobre a vida. Sobre as pessoas. Sobre o amor. Sobre Alexandre Quintanilha, físico e deputado do PS, o homem com quem Richard Zimler descobriu, há quase 40 anos, que viajar acompanhado é tão melhor do que viajar sozinho.
Quando soube da vitória de Trump referiu que sentiu “dor física”. Os resultados eleitorais fizeram com que se sentisse um pouco mais português e menos norte-americano?
Não. Gosto muito do estatuto híbrido que tenho, só me dá vantagens ter a dupla cidadania, um cérebro que é metade português e metade americano, falar duas línguas. Em criança nunca pensei que teria esta possibilidade de viver como mutante. Mas o que senti com estes resultados foi uma grande vergonha por ver o meu país de origem controlado por um ser primário, grosseiro, ignorante, racista, xenófobo, misógino.
Veio dar aulas para a Escola Superior de Jornalismo. O que recorda dos primeiros tempos no Porto?
Era uma cidade fechada, parada no tempo. Só havia uma loja que vendia jornais estrangeiros. Quando precisava de algo para o meu computador Apple tinha de contactar Amesterdão. Os primeiros três ou quatro anos foram muito difíceis. Muito stress, poucos amigos, não falava a língua. Tinha passado o verão a preparar-me para lecionar três disciplinas, o diretor tinha-me disto que podia dar aulas em inglês. Mas logo na primeira aula vi que ninguém percebia nada do que dizia. Tinha duas alternativas: ou continuava a dar aulas em inglês e ninguém ia perceber nada ou mudava para uma mistura de português e inglês. Fiz um esforço enorme para aprender 40 substantivos, cinco verbos e dez adjetivos. Mas sentia um stress constante porque sabia que as minhas aulas não eram muito boas.
Apesar desse stress, o facto de já não estar rodeado por conversas sobre sida, trouxe-lhe liberdade?
Sim, vir para Portugal salvou-me a vida. Aqui ninguém falava em sida. Podia respirar livremente. Pude despedir-me do meu irmão e ao mesmo tempo ter uma nova aventura. E tinha a relação com o Alexandre, que me ajudou muito.
Nestes anos todos nunca ponderou voltar a viver nos EUA?
Não. Gosto de viver em Portugal. Mas gostava de passar dois ou três meses por ano lá, no deserto, que me descontrai muito. Claro que, com o Alexandre no parlamento, não tenho possibilidade.
Leia a entrevista completa na edição impressa do SOL, já nas bancas