CGD: é quase de rir às gargalhadas

A comissão de trabalhadores da Caixa Geral de Depósitos (CGD) colocou hoje no seu site uma comunicação onde afirma que a CGD “pode estar a ser usada para objetivos de poder.” É quase de rir à gargalhada. Pois alguma vez o deixou de ser, nos últimos 40 anos?

Nos primeiros anos da democracia havia um acordo não-escrito entre PS e PSD: se um estava no governo, o outro estava na presidência da CGD. A Caixa, para além de ser um banco totalmente público, tem uma característica que não se pode medir em todos os países: é o maior banco português. Enquanto em alguns países se discute qual é o maior banco com base em uma série de indicadores (capitais próprios, depósitos, empréstimos concedidos, número de trabalhadores, etc.), em Portugal não há dúvidas: o maior banco é a Caixa, como consequência de durante muitos anos os funcionários públicos serem obrigatoriamente pagos lá. E engordou ainda mais com a fusão com o Banco Nacional Ultramarino.

Com uma gestão mais profissional e um pouco menos política, a CGD aproveitou bem os tempos do crédito fácil, com lucros próximos de 1.000 milhões de euros por ano. Como disse o jornalista Pedro Santos Guerreiro, “lucros que deviam fazer corar de vergonha uma empresa pública.” Não há nada de particularmente sinistro no que a Caixa fez: limitou-se a tomar partido, como os outros bancos fizeram, das condições de mercado. E, em 2011, quando, para usar a expressão de Fernando Ulrich, “batemos contra a parede” e tivemos de pedir ajuda à troika, uma das preocupações foi não deixar qualquer banco importante falir, o que logicamente incluía a Caixa.

É agora chegada a hora de pagar a conta. Fala-se numa injeção de capital superior a 5.000 milhões de euros, dos quais 2.700 milhões pagos pelos contribuintes e, pela primeira vez, com privados no capital da CGD, embora com dívida e não com ações. De qualquer maneira, este poderá ser o primeiro passo para a privatização total ou parcial de Caixa, no dia em que tivermos um primeiro-ministro com um perfil parecido a Pedro Passos Coelho.

Não me interessei muito na novela da entrega das declarações de rendimentos dos administradores da equipa de António Domingues: se iam para funções públicas, parece-me óbvio que tinham de entregar as declarações. De qualquer maneira, o ambiente ficou muito envenenado, chegando ao ponto de, como relembra o comunicado do sindicato de trabalhadores, o PSD ter votado contra o plano de recapitalização e o CDS abstendo-se. Como escreveu hoje o sindicato, objetivos de poder. E isso no mesmo dia em que a agência de rating canadiana DBRS, grande amiga de Portugal porque mantém o nosso rating acima de lixo, permitindo o financiamento barato por parte da República Portuguesa, ter revisto as perspetivas de ratings da Caixa para “negativo”, o que quer dizer que, provavelmente, a próxima revisão de rating será em baixa, encarecendo dessa forma o endividamento da CGD.

O que se pede afinal da próxima administração? Em primeiro lugar, que implante o plano de reestruturação da forma mais indolor possível, para as centenas de trabalhadores que vão ser despedidos. Em segundo lugar, que não seja permeável e pressões políticas. Por fim, que confira estabilidade e normalidade à Caixa, permitindo-a voltar a ter lucros e a pagar dividendos ao acionista Estado, que são sempre uma receita simpática.