O Tribunal Cível não deu razão à providência cautelar apresentada por Fernanda Câncio contra José António Saraiva, por revelações feitas no livro “Eu e os Políticos”. A jornalista do “Diário de Notícias” pedia nessa ação que fosse decretada a “imediata apreensão” de todos os exemplares do livro, por considerar que na página 165 “o referido texto [constituir] uma invasão da sua vida privada”.
A parte do livro contestada por Fernanda Câncio era essencialmente a seguinte: “Nessa altura, namorava com Abílio Leitão (…), que vivia em casa de um colega, onde aquela ficava muitas vezes a dormir.” Para além disso, o Abílio Leitão “ (…) dedicava-se a tirar fotografias das relações com a namorada.”
No entanto, o entendimento do tribunal foi claro. A juíza concluiu que nada desta descrição feita pelo antigo diretor do “Sol” – e atual conselheiro editorial do mesmo semanário – viola a vida privada da jornalista. _
“A análise objetiva do trecho do livro em causa não autoriza este Tribunal a restringir a liberdade de expressão do seu autor e, consequentemente, a decretar a proibição da venda do referido livro”, refere a decisão.
É ainda possível ler que “quanto à documentação desses momentos íntimos através de fotografia o autor do livro não imputa à Requerente a prática de qualquer ato, designadamente que a mesma soubesse que essas fotografias eram deixadas pelos móveis da casa e muito menos que eram visionadas por terceiros, designadamente o dono da casa e a mulher-a-dias.”
Para fundamentar a improcedência do pedido, o tribunal assegura mesmo que “pese embora se compreenda a indignação da Requerente, no caso em apreço uma conceção menos ampla da liberdade de expressão faz surgir o risco de que os Tribunais possam funcionar como órgãos de censura, inibindo assim a liberdade de expressão, o que não é legalmente admissível aos Tribunais”.
Reação do autor Em declarações ao i, José António Saraiva disse ter ficado satisfeito “não só com a decisão judicial mas também com o seu conteúdo”. Isto porque “o acórdão afirma textualmente que no livro não houve invasão da vida privada”.
O autor do livro “Eu e os Políticos” acrescentou ainda: “Um livro de memórias está sujeito a regras próprias. Ora, foi esta a posição que sempre defendi, não só em relação a este episódio mas relativamente a todo o livro: não invadi a vida privada de ninguém e um livro de memórias é um contributo para a História, que não deve omitir factos que o autor julgue de interesse mesmo quando eles podem suscetibilizar alguém”.