Adolfo Mesquita Nunes. ‘Ou oferecemos uma alternativa pela positiva ou só oferecemos crítica’

Foi secretário de Estado do Turismo mas não quis ficar como deputado. Foi para vice-presidente do partido. Quer que o CDS lidere o centro-direita. ‘Os votos não têm dono’.

Esta semana o primeiro-ministro acusou o Governo anterior de ‘diabolizar’ o investimento público. Como ex-membro desse Governo, viu isso como?

Curiosamente este Governo, num primeiro ano, colocou o investimento público ao nível mais baixo de sempre desde que há registos. É um bom exemplo da forma como o primeiro-ministro tem conseguido desviar as atenções de resultados medíocres. 

Medíocres? Crescimento destacado na zona euro, défice mais baixo de sempre desde o 25 de abril…

Repare que o Partido Socialista concorreu às eleições a dizer que o nosso crescimento de 1,6% era terrível, que era preciso crescer acima de 2,4% e mudar de políticas. E falhou em todos os objetivos. Estamos a crescer menos do que com o Governo anterior, menos do que aquilo que prometeram pelo Partido Socialista, menos do que estava previsto no Orçamento do Estado e menos do que a média europeia.

Foi o melhor crescimento da zona euro.

Não é verdade. Estamos a falar de crescimentos anuais e aí a Estónia, a Polónia, a Bulgária ou a Roménia crescem anualmente muito mais que nós.

Mas desse ponto de vista, o governo também só concretizou um ano agora…

Quem prometeu crescimento de 2,4% para este primeiro ano foi o PS, não fui eu. E agora comemoraram 1,2% e acusam quem os chama atenção para esse contrassenso de pessimista. Vieram para fazer melhor e não conseguem fazer melhor.

Mas não há uma reformulação das políticas? Percebe que o eleitor não entenda uma oposição que acusa o Governo de reverter as reformas mas depois diz que o Governo não mudou a política anterior? 

Não vejo isso assim. O que eu faço é um balanço de resultados. Por outro lado, a maioria parlamentar da esquerda formou-se com base no pressuposto do nosso Governo ter “desmantelado o Estado Social” de tal forma que se justificava uma aliança entre forças de esquerda que sempre se haviam combatido. Nós no último ano confirmamos a negação desse pressuposto: o INE confirmou uma descida acentuada da desigualdade entre 2014 e 2015, o PISA confirmou melhorias da educação em 2015, a OCDE confirma a qualidade das reformas laborais do nosso Governo e, agora, o homem que era acusado de destruir o Serviço Nacional de Saúde foi nomeado presidente do concelho de administração da Caixa Geral de Depósitos… O pressuposto em que assenta a coligação das esquerdas não se verificou. O Estado Social não foi desmantelado.

Mas nada disso parece afetar nem o Governo, nem a solução das esquerdas, nem o eleitorado português.

O eleitorado vê-se em eleições. Sondagens não servem de barómetro do eleitorado. O que tem sido apresentado como ativo deste Governo é a “paz social”. 

E a paz com Bruxelas, com um défice abaixo dos 3%…

Aí é importante salientar que estamos a comparar um Governo que teve de reduzir um défice de 10% para 3% e um Governo que reduziu um défice de 3% para 2,4%. É esse o mérito que queremos assumir? Só é possível estarmos hoje abaixo dos 3% porque o governo anterior fez essa redução. Não me incomoda louvar o esforço deste governo de ter o défice abaixo dos 3%, desde que não esqueça quem fez a redução anterior. Quando estive no Turismo dividi sempre os méritos dos resultados do setor público com o governo anterior.

Se acusa o governo por não cumprir as metas com que se propuseram a governar, julga que conseguiriam mais de maneira diferente?

Portugal estava  a crescer mais em 2015 do que está hoje e do que se prevê que vá suceder em 2017. Mas a conversa não deve ser só com base em indicadores económicos. É preciso que se perceba que os indicadores afetam o quotidiano das pessoas. Aquilo que está a acontecer no Serviço Nacional de Saúde, nos transportes públicos, nas prisões, nos tribunais… Nem sempre é útil estarmos apenas numa discussão de números… 

Então não concorda com a tese da “descrispação social”? 

A paz social tem sido entendida como ausência de rua. Só que a rua não representa a cidadania porque a rua é manipulável. 

Acha que a rua está manipulada?

Acho que a rua está silenciada pelos setores mais ruidosos da sociedade portuguesa, muitos deles na órbita no Partido Comunista Português. A pergunta que nos devemos fazer é: deve um Governo fazer da paz social um critério da bondade das suas políticas? Podemos confiar num Governo cujo objetivo é silenciar os setores ruidosos da sociedade para se manter? Que reformas é que podem ser feitas com um Governo cujo maior sucesso é a ausência de manifestações e greves?

Se a rua não é a cidadania, em que vê a cidadania afetada? 

Não estou a dizer que foi afetada, estou a dizer que a ausência de rua não é a ausência de problemas nem de descontentamento. 

De que problemas, em concreto, é que estamos a falar? 

Estamos a falar do Serviço Nacional de Saúde com notícias alarmantes diariamente sobre falta de medicamentos, de alimentos e condições para as consultas. Os transportes públicos que não funcionam, a ministra da Justiça que reconhece a miserável qualidade da comida servida nas prisões, os serviços públicos estão em degradação contínua graças a escolhas orçamentais deste governo. Preferiram avançar para as 35 horas em vez de fortalecer o serviço público. É uma opção deste Governo que o nosso Governo não teria feito. 

O serviço público não se degradou durante os quatro anos de Governo PSD/CDS? 

Este Governo chegou como guardião do serviço público e agora é responsável pela degradação do serviço público. E fá-lo não por estarmos em assistência financeira, que já não estamos, mas por opção: para poder pagar a fatura das esquerdas unidas, cortou no investimento público e nos serviços públicos. Mas como é de esquerda, pode.

O CDS governou um ano sem assistência financeira.

E conseguimos um crescimento superior ao que este Governo conseguiu. Não me peça para celebrar 1,2% depois disso. 

E perderam 700 mil votos na mesma.

Estamos a falar do país – de um país mais apto para os desafios do futuro, de voltar a convergir com a Europa – e é disso que é preciso falar. Desse ponto de vista de futuro, daquilo que podemos esperar para 2017, temos um Governo resignado, que comemora o  crescimento de 1,2%, que baixou as expectativas, que vive do silenciamento, que não tem qualquer ímpeto reformista e escolheu depender em exclusivo da extrema-esquerda para governar.

Nada impede o CDS-PP de contribuir (risos). 

E contribui. O CDS propôs que qualquer português pudesse conhecer a expectativa da sua pensão consoante a sua idade de reforma; as esquerdas unidas votaram contra. O CDS propôs que os currículos, os manuais e o sistema educativo ficasse estável e em seis anos não se mexesse, as esquerdas unidas votaram contra. O CDS propôs reformas para a natalidade, as esquerdas unidas votaram contra. Tudo propostas sem ideologia e tudo propostas chumbadas. A prioridade do Governo não é governar, é equilibrar a extrema-esquerda. 

Mas acredita que esta direita governaria com António Costa?

Se António Costa prefere governar com a extrema-esquerda e se diz mais próximo da extrema-esquerda, não me parece… Foi a solução que ele escolheu. Não podemos responsabilizar a oposição por escolhas do primeiro-ministro. Foi claro que as negociações do PS com os partidos que ganharam as eleições foram feitas com reserva mental. 

Para si, o catalisador foi ideológico? 

Claro. Veja a educação; por razões ideológicas reverteu-se tudo e hoje conhecemos os resultados que dizem que a educação havia melhorado. Eu não digo que é tudo obra do Governo anterior nem poderia ser assim, mas alguma coisa havia de ser. O que se esperava é que este Governo olhasse para as reformas que resultaram e não tocasse nelas para garantir que bons resultados como os de PISA continuavam. Mas preferiu satisfazer a extrema-esquerda em vez de preocupar-se com o futuro dos alunos.

Mas a oposição tem escrutinado essa ‘despreocupação’?

Portanto, temos o SNS no estado em que está, os transportes públicos no estado em que estão, o país a crescer menos do que o ano passado e quer que eu fale do estado da oposição?

Mas acha que está tudo bem nessas lideranças?

Acho que a análise política deve focar-se sobre tudo, mas quando temos o Serviço Nacional de Saúde à beira da rutura, não é normal que estejamos mais preocupados com o estado da oposição do que com o estado do país. Tal como não me parece normal que o Bloco de Esquerda coloque cartazes em nome do salário mínimo a 575 euros quando tinham prometido 600 euros. Ninguém os confronta? E a oposição é que não faz o seu trabalho? A oposição pode sempre trabalhar melhor, mas não se pode pedir à oposição que faça trabalho da imprensa.

Como assim?

Ser o fact-checker do Governo. Quando ouvimos criticas à oposição por não conseguir desmascarar as ilusões que o Governo cria, quase que esquecemos que as ilusões são transmitidas via imprensa. Quando há um resultado apresentado de forma ilusória, a imprensa tem de denunciar. A citação não pode ser mais importante que o facto. 

Mas também foi assim quando estava o CDS no Governo…

Estou a falar dos tempos modernos, da velocidade da imprensa, não da situação concreta PS versus oposição. Com a velocidade informativa de hoje, tem vantagem quem fala primeiro. 

Não é ingénuo justificar o insucesso da oposição com a imprensa?

Não me parece normal que quando o PS governa, se fale mais da oposição que do Governo. A última coisa que a oposição pode fazer é alinhar o discurso e a estratégia pelo que é definido pelo dr. António Costa como a oposição que gostava de ter. Veja bem, António Costa diz que a oposição é pessimista e toda a gente escreve que a oposição é pessimista.

Não acha que o presidente da República também o ajudou a definir a oposição? 

Não. O CDS tem-se mantido fiel ao que acordou em Congresso: as melhores ideias, os melhores protagonistas e a melhor postura; reformismo sensato e fazer política pela positiva. Esta estratégia será mais evidente quando a ausência de reformas deste Governo e os problemas nos serviços públicos forem mais flagrantes e a deriva ideológica que o PCP e o Bloco de Esquerda impõem ao Governo.

E se as pessoas estiverem cansadas de ouvirem falar em reformas?

As pessoas querem subir na vida, decidir da sua vida, deixar um futuro melhor aos seus filhos, planear as suas reformas e envelhecimento, encontrar oportunidades de emprego ou de lançamento de negócios. O que temos feito é apresentar propostas para tudo isso, e que as esquerdas chumbam. Mas vamos continuar.  

A líder de partido ganhou o congresso com o projeto de fazer o partido crescer e a verdade é que as sondagens mal mexeram. 

Pedir a um dirigente do CDS para comentar sondagens não deixa de ser caricato, tendo em conta que o CDS venceu sempre essas sondagens. Apresentamos propostas para o futuro, para o tempo de hoje, e não renegamos o nosso passado. 

Quando a líder passa a ter um comentário semanal no Correio da Manhã, vai a concertos do Tony Carreira e marca presença em revistas cor-de-rosa, é uma tentativa de tornar o CDS mais popular?

A Assunção Cristas assumiu a ambição máxima: crescer eleitoralmente. É uma ambição que eu acompanho. Se temos as melhores ideias e os melhores protagonistas temos de ambicionar ganhar. O CDS em que eu estou é o que quer liderar o espaço de centro e direita. 

Quer ir buscar os votos ao PSD?

Os votos não têm dono. Queremos ir buscar os votos de todos os que querem mais iniciativa, mais liberdade, mais oportunidades, mais abertura, mais economia. Isso é o que eu quero.

E é isso que se passa em Lisboa? 

As eleições autárquicas são o primeiro desafio eleitoral que temos e não são tradicionalmente eleições fáceis para o CDS. Mas isso não impediu que fossem encaradas por esta direção como um desafio para ganhar e deixar a marca do CDS. Podem ser olhadas com vários fatores, mas a circunstância de termos a nossa presidente candidata em Lisboa, é um exemplo para o resto do partido. É a melhor candidata e seria a melhor presidente de Câmara.

O apoio do PSD poderia dificultar a campanha do CDS?

Eu percebo a pergunta, mas o CDS não vai sair do discurso da sua presidente. Nós estamos a trabalhar há muito tempo e todos os partidos que quiserem integrar-se neste espírito e nesse programa são bem-vindos. Não vou entrar na vida interna de outros partidos, esta entrevista não serve para dar recados à direção do PSD e não é assim que o CDS faz política. Estamos mobilizados para a cidade e estou convicto que teremos um muito bom resultado em Lisboa.

Quando o porta-voz da líder diz que o PSD não vos tira o sono e a líder diz que têm de ver como as conversas correm, se eu fosse do PSD não percebia.

Peço desculpa, mas o CDS nunca mudou de discurso relativamente a Lisboa. Temos uma candidatura autónoma e forte, aberta ao apoio de partidos que se queiram juntar a nós. Um apoio do PSD não empalidece a estratégia autónoma do CDS. 

E ela “fica mesmo”?

Pergunte-lhe que ela terá todo o gosto em responder-lhe.

Mas caso ela fique, está mandatada para escolher o seu candidato a primeiro-ministro?

Conhecendo a Assunção há algum tempo sei que tem um enorme pragmatismo e que trata cada coisa a seu tempo. Neste momento, estamos concentrados para ganhar. E ainda falta um ano.

Rui Moreira foi apoiado pelo PS/Porto para a Câmara do Porto. Como é que quer derrotar um socialista em Lisboa, apoiando o mesmo candidato que o PS no Porto?

É ao contrário. A confirmar-se o apoio do Partido Socialista a Rui Moreira, quem apoiou um candidato que já era apoiado pelo CDS foi o Partido Socialista. Quem tem de diagnosticar a sua falta de alternativa é o PS, não somos nós. 

Fala da importância da mobilização para Lisboa. Vê a oposição mobilizada para o país? E o país mobilizado para essa oposição?

Ou oferecemos uma alternativa pela positiva às pessoas, que é o que o CDS tem feito, ou só oferecemos crítica e não mobilizamos. Veremos o primeiro teste, em Lisboa. Eu estou convencido que se ganharmos a Câmara é uma extraordinária oportunidade para mostrar o que o CDS pode fazer.

Para isso precisam do apoio do PSD…

Para isso precisamos do apoio dos eleitores.