Rússia e Turquia anunciaram esta quinta-feira um projeto de cessar-fogo que dizem que tem o apoio de mais de 60 mil combatentes rebeldes, o governo sírio e as dezenas de milícias que combatem em seu nome. A notícia foi avançada de manhã pelo presidente russo, Vladimir Putin, que admitiu que o acordo é “muito frágil”. Ancara confirmou-o minutos depois.
“Este acordo que atingimos é muito frágil, como todos compreendemos”, afirmou Putin num encontro com os seus ministros da Defesa e Negócios Estrangeiros, em Moscovo. “Exigirá uma atenção especial e paciência, atitude profissional e o contacto constante com os nossos parceiros”, disse, um dia depois das primeiras notícias de que um acordo estaria para breve.
Não são conhecidos muitos detalhes sobre o mais recente cessar-fogo, que entrará em vigor na primeira hora de sexta-feira, mas há razões para crer que pode ter mais alcance e ser mais duradouro do que os projetos de trégua negociados no passado entre Moscovo e Washington, que não duraram mais do que alguns dias e não impediram o reacender da guerra.
De acordo com as alíneas reveladas, a Turquia servirá de garante de que os rebeldes cumprirão o acordo e a Rússia responderá pelas ações do regime sírio. Não se sabe ao certo que grupos armados da oposição aceitaram a trégua, mas o Ministério da Defesa da Rússia diz que mais de 60 mil combatentes rebeldes prometeram cumpri-la em todo o território.
O cessar-fogo desta semana pode tornar-se no maior acordo de trégua alguma vez alcançado em quase seis anos de guerra civil. A Turquia tem muito mais influência sobre grupos rebeldes do que os Estados Unidos, que financiaram apenas uma fração das células armadas sírias nos últimos anos, quando Ancara lhes enviou dinheiro e armamento em grandes volumes – incluindo aos grupos mais fundamentalistas.
Este acordo pretende também abrir caminho a um ciclo de negociações de paz, que deve ter lugar em breve no Cazaquistão e que reunirá a Turquia, Rússia, Irão, regime sírio, e vários grupos de oposição. Um modelo semelhante foi já ensaiado na última semana, quando os governos turco, russo e iraniano se encontraram para discutir o conflito em Moscovo.
Ambiguidades
Mas o entendimento desta quinta-feira é vago. O cessar-fogo exclui o grupo Estado Islâmico, o satélite sírio da Al-Qaeda – antes conhecido como Frente al-Nusra, agora Fatah al-Sham –, assim como grupos “ligados” a movimentos jihadistas. A distinção não será fácil. A Fatah al-Sham, por exemplo, está muito presente nos principais territórios rurais rebeldes de Idlib, onde opera em alianças ambíguas com outros grupos de oposição menos radicais.
Este foi sempre o grande argumento russo para travar entendimentos com a oposição armada síria. Desde que Moscovo entrou na guerra, em novembro do último ano, vem repetindo a ideia de que não existem “rebeldes moderados” e que, a existirem, estão demasiado imiscuídos no seio de grupos fundamentalistas para que a diferença seja relevante.
Alepo, porém, está agora nas mãos do regime, o que retira muita pressão sobre os seus aliados russos e iranianos para abrirem novas frentes de combate. Damasco controla hoje os principais centros urbanos do país, o que garante em simultâneo a sobrevivência de Bashar al-Assad e a irrelevância política das dezenas de grupos de oposição, agora reduzidos a uma presença rural em Idlib.
A pressão está por isso do lado dos grupos rebeldes, que querem preservar alguma importância para o caso de o regime sírio e os seus aliados estejam abertos à ideia de repartir o país por zonas de influência, como foi noticiado esta semana.