O assunto não está fechado, mas aquilo que parecia impossível há uns meses parece cada vez mais o desfecho provável. A nacionalização do Novo Banco é uma possibilidade concreta que está a ser estudada pelo Governo e que reúne cada vez mais consenso da esquerda à direita. Mas o diabo pode estar nos detalhes.
Se optar por nacionalizar o Novo Banco, o Governo terá de fazer a operação passar no crivo do BCE e da Direção-Geral da Concorrência (DGCom) em Bruxelas. Sabendo que o banco vai precisar de uma recapitalização, será preciso assegurar que o dinheiro injetado e a forma escolhida para o injetar não viola as regras. Ou seja, é preciso que Bruxelas aceite que não se trata de ajudas de Estado.
Problemas de concorrência
A DGCom pode também levantar questões relacionadas com a cota de mercado que o Estado passará a dominar caso fique com a CGD e com o Novo Banco, respetivamente o primeiro e o terceiro maiores bancos a operar no mercado nacional. Somadas as operações de CGD e Novo Banco nacionalizado, o Estado ficaria a dominar uma cota de mercado na ordem dos 45%. Um valor muito alto que dificilmente a DGCom aceitaria.
Nova resolução à vista?
É difícil perceber em que moldes poderia ser feita uma nacionalização porque não há um padrão ou exemplos que sirvam de referência. A DGCom poderia exigir uma nova resolução do Novo Banco, com implicações para credores, donos de obrigações e depositantes com mais de 100 mil euros. Mas o precedente aberto pelo italiano Monti dei Paschi dá bons argumentos a António Costa para conseguir uma solução que não imponha perdas a grandes depositantes, obrigacionistas e credores, pelo que também isso está em aberto.
Recapitalizar, mas como?
Neste momento, não se sabe quanto dinheiro seria preciso injetar no Novo Banco, mas o facto de a proposta da Lone Star implicar um pedido de garantias do Estado no valor de cerca de dois mil milhões a juntar aos 750 milhões de perdas que se diz disposta a assumir faz temer que as necessidades de recapitalização andem à volta da soma desses valores.
O problema seria o de saber, por exemplo, se esse dinheiro seria injetado pelo Fundo Resolução ou diretamente pelo Tesouro. Em qualquer dos casos, a DGCom poderia vir a exigir remédios que poderiam passar por uma reestruturação com encerramento de balcões e despedimentos.
Mário Centeno não descartou, aliás, completamente a ideia de vender o banco precisamente por saber que a nacionalização comporta riscos, mesmo que eles pareçam menores quando comparados com a ideia das perdas que o Estado terá de assumir se aceitar vender o Novo Banco à Lone Star ao ao consórcio Apollo/Centerbridge.
A arma de Costa e Centeno nas negociações
O que Centeno pode fazer é tentar capitalizar o aparente consenso social que se gerou em torno de uma nacionalização temporária.
Depois de ter dito que não haverá mais dinheiro dos contribuintes para ser usado como garantias de Estado e sendo claro que a solução de nacionalizar o Novo Banco reúne apoios da esquerda à direita, Centeno ganha uma arma negocial para pressionar a Lone Star e a Apollo/Centerbridge a melhorarem as suas ofertas.
E há ainda outra negociação que António Costa e Mário Centeno podem tentar: a de convencer Bruxelas a aceitar não impor um prazo para a alienação. Isso daria margem ao Governo para conseguir uma solução de venda melhor e evitar ter de alienar o Novo Banco a fundos que o devem desmantelar para o vender.
Para já, o prazo de venda acordado com Bruxelas esgota-se no dia 3 de agosto. Mas no Governo espera-se fechar este dossiê o mais rapidamente possível. Levar o processo até ao limite e deixá-lo resvalar até às vésperas das autárquicas é algo que Costa e Centeno querem evitar a todo o custo.
Ter razão antes do tempo?
Curiosamente, o tema da nacionalização surge quase um ano depois de Vítor Bento ter defendido a necessidade de equacionar as vantangens de manter o Novo Banco na esfera pública. «Quando olhamos para o sistema financeiro, não podemos olhar peça a peça, mas para o seu conjunto», disse na altura o homem que conduziu o banco durante a resolução. Preocupado com a espanholização da banca, Vítor Bento dizia que valia a pena pelo menos «equacionar se faz sentido, ou não, incluir o Novo Banco no sector público».