1.A polémica em torno da aprovação ou não da TSU pelo PSD mostra bem a indigência franciscana intelectual das nossas elites. Com especial relevo para as ditas elites do PSD, sempre tão preocupadas com os interesses pessoais e com as suas agendas privadas que, às tantas, se esquecem do interesse de Portugal e dos portugueses (se é que alguma vez nele pensaram!).
2.Nós nem não vamos comentar a análise completamente desfasada, a roçar o ridículo (e nós demonstraremos em artigo autónomo o grau desse ridículo) de Luís Marques Mendes: Marques Mendes não é imparcial nesta matéria e integra uma certa elite a quem lhe convém, atendendo à sua agenda pessoal, manter a geringonça de boa saúde.
Para além disso, Marques Mendes diverte-se a ser o ventríloquo de Marcelo Rebelo de Sousa. Ora, só este facto diz muito sobre a credibilidade das declarações de Marques Mendes sobre esta matéria…
3.Posto isto, deixemos o irrelevante e vamos ao relevante. Deve ou não Passos Coelho viabilizar o acordo da concertação social que se traduz na redução da TSU? A resposta é evidente: não, não e não.
Mais: se o PSD deixar passar a descida da TSU, salvando António Costa, o PSD morre como partido central do sistema partidário português. Vamos aos factos.
4.Em primeiro lugar, o cliché, a frase bonitinha de que a “descida da TSU é boa para a economia Portugal e o PSD não deve fazer oposição a Portugal” poderia ser verdade, acaso vivêssemos num período de normalidade política e institucional.
Mas não vivemos: vivemos, isso sim, num período excepcional. Institucionalmente anormal. Porquê? Porque, pela primeira vez na história constitucional portuguesa, os partidos mais votados nas últimas eleições legislativas não governam. Antes, tais partidos foram afastados do exercício do poder por uma grande coligação de esquerda, abrangendo o PS de Costa e a extrema-esquerda.
Coligação que, recordamos para os mais esquecidos (ou fingidores de esquecimento) à la Luís Marques Mendes, se assumiu como unida nos mesmos propósitos, com enormes afinidades nas soluções políticas e que supostamente prestaram garantias quanto à sua estabilidade política.
5.Aqui chegamos à primeira conclusão: a geringonça (PS, PCP e BE) assumiu o ónus de garantir a estabilidade política – ou seja, assumiu o compromisso de tomar todas as diligências para fazer com que as suas convergências superassem as suas divergências. E as divergências seriam arbitradas por um grupo composto por membros dos três partidos, coordenado pelo Ministro Pedro Nuno Santos.
Sendo um ónus, o seu não cumprimento implica uma desvantagem para o seu titular, ou seja, para o Governo da geringonça – se não se entendem, se não conseguem garantir a estabilidade política, então, afinal, o que fizeram foi um puro assalto ao poder. A sua coligação é uma fraude imposta aos portugueses.
6.E deve o PSD ser cúmplice desta fraude? Claro que não: se o PSD viabilizasse esta fraude democrática e inconstitucional (porque, afinal, não há coligação nenhuma; houve puro tacticismo do extremo-PS e da extrema-esquerda), então, perderia toda a credibilidade como partido responsável e defensor da democracia liberal e suas regras – responsabilidade que lhe advém até do seu estatuto de força política mais votada presente no Parlamento.
Como é que a geringonça foi constitucionalmente justificada? Como a expressão da vertente parlamentarista do regime. Ora, o instituto da ratificação parlamentar (ou seja, a apreciação parlamentar dos decretos-leis do Governo pelo Parlamento) é outra manifestação da vertente parlamentarista do sistema político.
Se o Governo dependa para subsistir do seu apoio no Parlamento, então, por maioria de razão, em coerência, terão de ser as forças políticas que o suportam a viabilizar as suas medidas. Então, o parlamentarismo é bom para afastar o PSD e o CDS do Governo – todavia, já é mau quando suscita problemas para António Costa? Isto é coerência? Não brinquem com a inteligência dos portugueses.
7.Em segundo lugar, se o PSD viabilizasse o acordo de concertação social, António Costa daria o golpe decisivo na consolidação do seu poder pessoal e do PS como partido referencial, dominante da política portuguesa.
Porquê? Fácil: porque o PS converter-se-ia definitivamente no partido charneira, central do nosso sistema – ora vira à esquerda, ora vira à direita. Ora, se se entende com a extrema-esquerda para aprovar medidas que aumentam a despesa pública, que agradem aos sindicatos e à função pública; ora vira à direita para estimular a nossa economia e aprovar medidas responsáveis.
Em qualquer caso, o PS lideraria sempre o processo político, conservando a sua posição no Governo. Além disso, o facto de o PSD viabilizar medidas como a descida da TSU iria permitir a António Costa (que não tem palavra e é um malabarista puro, que mente tanto que não consegue identificar o que é verdade e o que é mentira, que o diga António Domingues) mais tarde acusar o PSD de se ter acantonado à direita, de fazer o jogo dos patrões, de esquecer o seu ideário social-democrata, blá, blá, blá…
8.Ora, como no sistema político e eleitoral português, a obtenção de maiorias absolutas é um cenário excepcional, a não ser que PSD e CDS obtenham maioria absoluta, o PS passaria sempre a formar Governo.
Porque para os socialistas seria fácil replicar este modelo: umas medidas são aprovadas pelo PCP e pelo Bloco de Esquerda, em troca de “tachos” e mais poder para as suas clientelas partidárias; outras seriam aprovadas pelo PSD, em nome do “interesse nacional”. Et voilá: António Costa, o mestre da habilidade, teria (caso Passos Coelho viabilizasse a descida da TSU) dado o golpe político, grandioso e genial, final. O PS assumir-se-ia como o único partido de poder em Portugal. As eleições converter-se-iam, praticamente apenas, em momentos em que o Povo decidiria se o PS deveria governar à esquerda ou mais ao centro.
Terceira conclusão: se Passos Coelho salvar a geringonça, viabilizando a descida da TSU, daria um golpe tremendo na saúde da nossa democracia. Seria uma entorse monumental no sistema político democrático inscrito na Constituição da República: o habilidoso António Costa daria ao PS o controlo do país por muitos e muitos anos, reduzindo o centro-direita a um papel residual.
9.Pois bem, ao contrário do que a imprensa do politicamente correcto e a elite que (utilizando uma expressão de amigo nosso) “só pensa no seu umbigo” quer fazer crer, a decisão de Passos Coelho é a que melhor defende o interesse nacional. Porque defende a democracia pluralista. Porque impede que o PS tome conta definitivamente do poder e do aparelho de Estado, reduzindo o poder do Povo em definir as orientações políticas do país em cada acto eleitoral. O que aprofundaria o bloqueamento institucional da democracia portuguesa.
10.A medida que resulta da concertação social tem um escasso valor económico, porquanto a redução da TSU serve apenas para compensar o aumento do salário mínimo, para o qual até António Costa reconhece que não há dinheiro – mas um valor destrutivo enorme para a nossa democracia. Nós preferimos defender a democracia. Sempre. Portugal já pagou muito pelas fraudes e golpes de António Costa e seus muchachos.
11.Por último, não podemos deixar de soltar uma gargalhada bem sonora quando Marcelo Rebelo de Sousa, por via de Luís Marques Mendes, acusa o PSD de só pensar em tácticas políticas, em habilidades, e não no interesse de Portugal.
Então, não foi Marcelo Rebelo de Sousa e a elite do PSD de Ferreira Leite, Pacheco Pereira e Marques Mendes que elogiaram à exaustão António Costa por ser um habilidoso, um mestre da habilidade política?
Quer dizer: António Costa ser um habilidoso é algo extraordinário e fenomenal – um génio da política; Passos Coelho, quando actua politicamente na defesa da democracia, a elite dominada pelas suas agendas pessoais já acha que ser habilidoso é um crime de lesa-pátria. Em que ficamos? Esta incoerência diz muito sobre a qualidade das nossas elites e dos nossos políticos virados “comentadeiros”…
12.Até porque Marcelo Rebelo de Sousa já tem uma solução para a TSU. Na semana passada, quando os deputados do PS foram desejar bom ano ao Presidente, Marcelo virou-se para um deputado do PS e afirmou “epá, já está quase! Já só falta metade, bom! Já está quase a cumprir a legislatura, bom!”.
Então, Sr. Presidente, tem bom remédio: já só falta metade, não é? Então fale com os seus amigos políticos do “estamos quase” e eles que resolvam o problema! Já só falta metade, Presidente Marcelo, já só falta metade!
Não se apouquente, Marcelo: os seus aliados políticos já estão quase a cumprir a legislatura, logo, entenderem-se sobre a TSU não será difícil! Não é, Sr. Presidente Marcelo Rebelo de Sousa? Apele ao optimismo irritante!