Portugal financia-se a taxas de juro negativas

Em primeiro lugar, convém explicar o que é uma taxa de juro negativa: é uma dívida em que, no reembolso, o credor recebe menos dinheiro do que emprestou.

Logicamente, é uma situação pouco normal, própria destes tempos em que vivemos. Mas só se conseguem taxas de juro negativas se o credor tiver muita confiança – pois procura, acima de tudo, segurança, estando disposto a pagar por isso – no devedor. E foi isso que aconteceu hoje de manhã com o devedor República Portuguesa.

Não é para embandeirar em arco, pois tratou-se apenas de dívida a curto prazo, e a maioria do financiamento de Portugal em 2017 será feito com dívida de médio e longo prazo. Mesmo assim, esta emissão foi um sucesso em toda a linha. Primeiro, o IGCP (organismo que gere a dívida pública portuguesa) tinha planeado pedir emprestados 1.500 milhões de euros, mas o interesse dos investidores foi tanto que a emissão acabou por ser alargada para 1.750 milhões. Em concreto, a seis meses o empréstimo foi de 350 milhões de euros com a taxa de -0,091%. A 12 meses, foram colocados 1.400 milhões de euros, a -0,047%.

É de realçar que, em ambos os casos, foram as taxas de juro mais curtas de sempre para esses prazos. Claramente, os investidores não esperam que Portugal entre em bancarrota nos próximos 12 meses.

Simultaneamente, o governo enviou para Bruxelas um documento com os resultados da sua política económica. Otimista, o governo destaca que o défice orçamental ficará abaixo de meta acordada com Bruxelas (2,5%), sendo “o menor défice dos últimos 40 anos”, e que o excedente primário (as contas do Estado sem contar com os juros, nas quais as receitas são maiores do que as despesas, daí ser um excedente e não um défice) é de 1,9% do PIB. É bom, embora fosse desejável que fosse maior.

O documento do governo prossegue, destacando que “o emprego está a aumentar e o desemprego a diminuir” (emprego e desemprego são duas medidas diferentes, porque só está desempregado quem procura trabalho). Além disso, o governo afirma que o crescimento económico do terceiro trimestre foi o maior da zona euro, e que os indicadores já conhecidos para o quarto trimestre indicam que a retoma vai continuar: “o investimento está a aumentar, como comprovado pela importação de máquinas e (…) pelo aumento das vendas de cimento em novembro e dezembro”.

É assim meus caros, se os investidores não tivessem confiança na recuperação da economia portuguesa não nos emprestavam dinheiro a taxas negativas. Como eu gosto de escrever, aos poucos vamos lá.