Uma investigação de um ano conduzida pela Amnistia Internacional revela que o regime sírio pode ter matado 13 mil pessoas até ao fim de 2015 numa única prisão de Damasco. De acordo com o relatório publicado ontem, entre cinco mil e 13 mil pessoas foram enforcadas na prisão de Saydnaya depois de julgamentos sumários com não mais do que três minutos, conduzidos na cave de um dos dois edifícios onde, ao longo dos quase seis anos de guerra civil, muitas mais pessoas morreram de fome, doença e tortura. A investigação entrevistou mais de 80 pessoas, incluindo vários antigos reclusos e guardas de Saydnaya, para além de um juiz militar sírio.
Passados mais de dois anos desde que um fotógrafo militar com o nome de código César revelou milhares de fotografias de corpos mutilados num complexo governamental, mostrando uma primeira face do mecanismo de matança institucionalizado no regime de Damasco, a Amnistia revela agora um sistema ainda mais vasto de extermínio. As centenas de cadáveres fotografados por César eram de prisioneiros cuja morte na tortura era documentada como um ataque cardíaco ou paragem respiratória, mas a mais recente investigação da Amnistia revela que mais pessoas morreram num processo oleado e institucionalizado que tentava dar a aparência de legalidade de um julgamento militar: ao longo de cinco anos, grupos de 20 a 50 detidos eram enviados uma ou duas vezes por semana para um edifício para serem enforcados. Os seus corpos, de acordo com a autora, Nicolette Waldman, eram transportados todas as terças-feiras de madrugada para duas valas comuns em terrenos do exército.
A Amnistia documenta numerosos episódios de tortura e maus–tratos que sustentam investigações semelhantes noutros locais de detenção do regime. “Ouvíamos gritos e berros nos pisos inferiores”, conta um antigo recluso. “Isto é um ponto bastante importante. Se ficares em silêncio, batem-te menos em Saydnaya. Mas estas pessoas gritavam como se tivessem perdido o juízo. Não era um som normal. Parecia que os estavam a esfolar vivos.”
Waldman perdeu o contacto com as suas fontes no fim de 2015. “Não há razão nenhuma para acreditar que os enforcamentos pararam. Acreditamos que é muito provável que as execuções prossigam até hoje e que muitos mais milhares de pessoas tenham sido mortas”, diz a autora, citada pelo “Guardian”. “Vinham buscá-los numa segunda-feira. Antes de serem enforcadas, as vítimas eram condenadas à morte em julgamentos de dois ou três minutos. A sentença de morte é assinada pelo ministro da Defesa, que Assad fez responsável. É inconcebível que todos os altos responsáveis não tenham conhecimento disto. Esta é uma política de extermínio.”