Mundos rochosos, parecidos com os nossos, com anos mais curtos e um céu brilhante. São sete planetas, uns seguidos dos outros e separados por alguns milhões de quilómetros e não centenas de milhões como acontece no nosso sistema solar. Tão próximos que, estando num deles, é possível ver os relevos da superfície dos vizinhos mais próximos, como quando olhamos a lua cheia no céu.
A NASA revelou ontem a existência de um sistema planetário parecido com o nosso neste sentido: são sete planetas, três dos quais à distância próxima da sua estrela para terem água em estado líquido e onde poderia, em alguma momento da sua história geológica, existir vida. Mas todos são, no seu tamanho, parecidos com a Terra. “A existência deste sistema foi um choque”, disse Michael Gillon, o astrónomo belga por detrás da sua descoberta.
O anúncio de que estaria para ser revelada uma descoberta para lá do nosso sistema solar – este sistema planetário estará a 39 anos-luz de nós, o que para ter algum termo de comparação basta pensar que só da Terra ao Sol vão oito minutos-luz – foi feito pela NASA na segunda-feira. Depressa começaram os rumores de que seria anunciada a descoberta de vida, o que levou a agência espacial a fazer o “spoiler”, minutos antes da conferência de imprensa, de que não iam falar de aliens.
Se esta pode ter sido a deceção coletiva, no meio há outra discussão de fundo. O trabalho foi comandado por investigadores da Universidade de Liège, que descobriram os primeiros dois planetas deste sistema em 2016 em observações no deserto de Atacama. O resto do trabalho de observação e análise foi feito com recurso ao telescópio espacial Spitzer, da NASA, mas a agência espacial norte-americana assumiu a gestão mediática da descoberta. Ao ponto de, na conferência de imprensa de ontem, nem ter sido Gillon a dar a notícia mas um administrador da NASA, Thomas Zurbuchen, que revelou só estar há cinco meses nestas funções e confessou-se impressionado com o trabalho “inspirador” de todos.
Não é para menos. O sistema planetário agora descoberto torna-se, entre o catálogo de 3583 exoplanetas já detetados, um dos mais promissores para a procura de vida e compreensão da formação dos planetas. Viajar até lá está, por agora, fora dos planos. Mas os astrónomos tencionam continuar a estudar este novo mundo para perceber de que são compostas as atmosferas dos planetas, se terão mesmo água (num deles é quase certo que sim) e que outras pistas podem dar, quer para a história da ciência humanitária quer para o atlas da vida.
Questionado sobre que nomes pensaram para os planetas – que respondem pelas letras b, c, d, e, f, g e h –, o astrónomo Michael Gillon brincou que entre as várias cervejas belgas não faltariam possibilidades. “Trappist-1” (o nome de código deste sistema planetário) já faz lembrar a cerveja trapista tão famosa na Bélgica mas é só uma coincidência: resulta do telescópio inicialmente usado pela equipa e é o acrónimo de Transiting Planets and Planetesimals Small Telescope. O anúncio da NASA fez-se acompanhar da publicação de um artigo na revista “Nature”, que é assinado por 30 investigadores, entre os quais a portuguesa Catarina Fernandes, astrofísica de 31 anos que está a fazer o doutoramento no Instituto de Ciências Espaciais da Universidade de Liège.
O “sol” deste sistema planetário é uma estrela anã vermelha. Se a nossa é uma bola de basquetebol, a “deles” é mais uma bola de ping-pong, resumiram os investigadores. Num mundo frio, tão parecido mas ao mesmo tempo tão diferente, será possível haver vida? Gillon explicou que os radiotelescópios que se dedicam a essa demanda já apontaram naquela direção e não detetaram qualquer sinal. Mas foi Sara Seager, professora de ciências planetárias no MIT, a deixar tudo em aberto. “A boa notícia é que vamos poder continuar a observar, não temos de ficar-nos por aquilo que pensamos e especulações. A natureza é mais esperta do que nós. E se há forma de a vida se desenvolver, gostamos de acreditar que o fará”.