1.É um dos episódios mais marcantes da história política (não-oficial) de Portugal e dos poucos factos políticos que une gerações como só uma boa estória ou anedota conseguem fazer: Marcelo Rebelo de Sousa inventara, com sofisticação e detalhe, um jantar de constitucionalistas em Belém com o Presidente Mário Soares, onde supostamente o próprio Marcelo estivera presente.
2.Os detalhes do jantar – conversas, ementa e “fofoquices” – foram depois comunicadas por Marcelo a Paulo Portas, então director do jornal “O Independente”. Pequeno problema: nada do que Marcelo Rebelo de Sousa relatara era verdade. Era tudo mentira! O que gerou um distanciamento – mesmo uma “guerra (mais ou menos) surda entre os dois outrora grandes amigos -, tendo Paulo Portas relatado o episódio na televisão e acusado Marcelo de “brincar com o seu trabalho e com os seus leitores”.
3.Pois bem, parece que Marcelo Rebelo de Sousa se diverte (imenso!) a pregar partidas às personalidades e líderes do CDS/PP. É verdade que, na altura, Paulo Portas ainda não era líder, nem pertencia formalmente ao CDS – no entanto, já era uma referência intelectual da direita portuguesa, inspirando a acção e pensamento do então líder Manuel Monteiro.
O próprio Manuel Monteiro – e mesmo Diogo Freitas do Amaral – contam, em privado, histórias não muito abonatórias para a figura e personalidade de Marcelo Rebelo de Sousa.
4.Portanto, Marcelo já tem um longo historial e um gosto especial para enganar o CDS/PP. Marcelo adora provocar os centristas, considerando,ainda hoje, o CDS um partido dispensável, com um futuro muito incerto.
Contudo, desta feita, o episódio, pelo seu simbolismo e gravidade, ultrapassa largamente o episódio da vichissoyse: Marcelo Rebelo de Sousa entalou de sobremaneira, pela calada, a líder do partido, Assunção Cristas. Um amigo nosso do CDS diz mesmo que “Marcelo cometeu uma enorme sacanice a Cristas!”.
5.De facto, perante a divulgação de encontro com o Presidente Marcelo por parte de Assunção Cristas para relatar o sectarismo e a intolerância democrática de Ferro Rodrigues (o que não é novidade para ninguém!), eis que Marcelo resolve agendar um almoço prévio com o próprio….Ferro Rodrigues!
Ou seja: Marcelo vai ouvir as queixas de Assunção – mas antes vai preparar o discurso com o próprio visado pelas críticas! Isto é sério? Claro que não: isto foi para castigar Assunção pela forma como anunciou o encontro – e mostra o medo do nosso Presidente (o Presidente que certamente não é de todos os portugueses!) em perder o apoio da geringonça.
Como já aqui escrevemos, não é Marcelo que tem Costa na mão – é Costa que, aproveitando as vulnerabilidades de personalidade de Marcelo, tem o Presidente Rebelo de Sousa na mão.
6.Ao almoçar previamente com Ferro Rodrigues, tomou objectivamente partido contra Assunção Cristas e o CDS. E violou grosseiramente o princípio do contraditório: este implicaria que, primeiro, Marcelo conhecesse o teor das críticas de Assunção ao Presidente da Assembleia da República – e só depois é que deveria ouvir o visado.
Finalmente, tomaria, de forma neutra e séria, partido, interpretando os factos à luz do interesse nacional: nomeadamente, tirando as devidas ilações quanto a um dos poderes que a Constituição lhe confere – “ garantir o regular funcionamento das instituições democráticas”.
7.Mas Marcelo nunca quis, neste processo, ser neutral: antes, sempre quis estar ao lado de Ferro Rodrigues. E o que vai acontecer é que Assunção Cristas vai levar um “sermão” do Presidente Marcelo pela sua postura e pela indelicadeza na revelação do encontro com o Presidente geringonçado – e Ferro Rodrigues sairá reforçado deste episódio, devidamente protegido por Marcelo Rebelo de Sousa.
Pior: os portugueses ficaram a saber que Marcelo acha mesmo que somos todos parvos. Então não é que Marcelo lembrou-se de dizer que este almoço não foi marcado para hoje porque iria receber Assunção mais tarde, mas que já estaria marcado há muito?
E foi tudo uma grande coincidência? É por isto que depois é muito difícil acreditar em Marcelo – ele gosta de mentir sobre tudo e sobre todos, julgando que os portugueses acreditam em tudo! Até nas histórias mais rocambolescas, como é o caso! Evidentemente, não é coincidência nenhuma: Marcelo marcou o almoço propositadamente para hoje, para não ferir as susceptibilidades da geringonça!
8.Assim, não, Presidente Marcelo: o senhor tomou uma opção clara – não ser o Presidente de todos os portugueses, mas sim de apenas uma parte. Está feita essa opção: boa sorte para o seu casamento com a sua geringonça. O mais triste é sabermos todos que Portugal vai pagar muito caro esta coexistência entre Marcelo-Costa-Ferro Rodrigues, com Jerónimo de Sousa e Catarina Martins a apadrinharem…
9.O melhor que Assunção Cristas faria era faltar ao encontro de hoje com Marcelo, para dar um sinal claro a Marcelo de que, em política séria, há limites para a mentira e para o fingimento…E que não se brinca desta forma com um partido político que representa uma parte importante da sociedade portuguesa!
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