Filha de Joaquim Mestre, carismático diretor da Biblioteca Municipal de Beja, Marta Mestre nasceu na capital do Baixo Alentejo em 1980. Licenciada em História da Arte e mestre em Cultura e Comunicação/Museologia, a curadora remonta o seu interesse pela arte contemporânea a quando tinha «13 ou 14 anos» e vivia em Beja. «Nessa época a cidade viveu um momento breve de boa programação cultural e experimentou-se um momento de ‘descentralização’ da arte contemporânea. Lembro-me de ter visto na Galeria Municipal da cidade ‘arte’ que depois vim a identificar com linguagens contemporâneas da instalação, do vídeo, do site-specific, intervenções em monumentos e espaços abandonados da cidade». Dos nomes de artistas, recorda «Juan Muñoz e Julião Sarmento em 1993 no espaço da Metalúrgica Alentejana, Pedro Cabrita Reis e João Paulo Feliciano no antigo Convento de S. Francisco».
Quando terminou a licenciatura na Universidade Nova de Lisboa, Marta rumou a Paris (Saint-Denis) onde fez o mestrado, regressando a Portugal para dirigir a programação do Centro de Artes de Sines. Em 2010 «estava com uma situação até bem tranquila, com uma bolsa de doutoramento e interrompi tudo e vim para o Brasil, no âmbito do programa Inov-Art».
«Cheguei num dia de Julho, era inverno, era de noite e estava a chover. A chegada ao Rio faz-se pelo aeroporto internacional, e o trajecto até ao Centro atravessa as principais favelas e uma grande área sem planeamento urbano. Lembro-me de ter pensado que a imagem era em tudo contrária à ideia de Rio, cidade maravilhosa», recorda. «A grande maioria das pessoas da minha geração que me são próximas em Portugal, cresceu a escutar músicas onde o Rio aparecia. Hoje, ao escutar estas músicas, dou-me conta que a cidade já ali aparecia como ambivalente. Não era esse paraíso tropical ou cidade maravilhosa, mas um conjunto de coisas loucas, exuberantes e belas, mas igualmente frágeis, desiguais, e de certa forma miseráveis».
No Rio, Marta começou como visitante no Museu de Arte Moderna, tendo-se dedicado a estudar a arte brasileira. Ao fim de um ano, passou a curadora assistente. Há cerca de um ano, em março de 2016, foi convidada para curadora do Instituto Inhotim, uma instituição que nasceu da visão de Bernardo Paz, empresário que fez fortuna na área da mineração.
«Ele era amigo do Roberto Burle Marx, um grande artista e paisagista brasileiro. Todos os jardins de Brasília, do Aterro do Flamengo, foram feitos por ele, e ele foi o inspirador na parte artística. Depois Burle Marx morreu, mas os jardins continuaram aumentando». O parque de Inhotim tem uma enorme variedade de espécies botânicas valiosas, incluindo orquídeas raras.
Graças à sua fortuna, Paz «começou a colecionar modernistas e num certo momento conheceu um artista que se chama Tunga – que morreu há pouco tempo – e esse artista disse-lhe: ‘E se começasse a olhar para a arte contemporânea’. E ele mudou radicalmente. Vendeu tudo e comprou instalações de grande escala». Hoje, Inhotim emprega 600 pessoas e tem 1600 obras distribuídas por 23 pavilhões que totalizam um milhão e 400 mil metros quadrados de área expositiva. Dan Graham, Yayoi Kuzama, Doug Aitken, Chris Burden e Giuseppe Penone são apenas alguns dos artistas representados na coleção.