Então, irá a instituição presidida por Mario Draghi inverter a sua estratégia? Irá parar com as compras de dívida pública dos Estados da zona-euro para, de seguida, começar a subir as taxas de juro?
A resposta é não, por várias razões. Em primeiro lugar, esta subida da inflação é temporária, devendo-se sobretudo à subida dos preços dos combustíveis: o custo da energia subiu 9,2% num ano. Assim, se excluirmos a energia, a comida, o álcool e o tabaco a taxa de inflação cifra-se não em 2%, mas em 0,9%.
A razão da discrepância entre estes dois valores prende-se com um “efeito de base”: como há um ano atrás os combustíveis estavam mais baratos, a comparação com os dias de hoje mostra essa grande subida dos seus preços, de 9,2%. À medida que o tempo for passando, e os preços do presente forem sendo comparados com os de um passado que já incluí os preços mais elevados do combustível, a discrepância da inflação com e sem os custos da energia ir-se-á desvanecendo, e a inflação total descendo progressivamente (expliquei isto o melhor que pude, mas se não tiver sido claro contactem-me com um comentário).
Em segundo lugar, os campeões da inflação baixa, os alemães, fizeram saber, pelo presidente do seu banco central, Jens Weidmann, que subidas nas taxas de juro da zona-euro antes de 2019 estão fora de causa. Se até os ferozes anti-inflacionistas alemães têm esta posição, então podemos dormir descansados quanto a esse aspeto.
Por fim, o programa de compra de dívida dos Estados da zona-euro, feita pelo BCE, que ajuda a manter as taxas de juro mais baixas em toda a zona-euro (isto apesar de a dívida portuguesa a dez anos, infelizmente, depois de há uns dias ter tocado no ponto crucial de 3,86%, ter voltado a subir, estando hoje, às 11.30. em 3,95%). Sem este programa, as taxas de juro estariam mais elevadas, prejudicando o crescimento económico.
Por estas razões, Mario Draghi não nos vai tirar o tapete, terminando já com o programa de compra de dívida pública. Esse programa deverá durar, no mínimo, até ao fim de 2017, dando tempo aos Estados-membros da zona euro para fazerem reformas que, com o crescimento económico mais fraco, seriam mais dolorosas.
Em Portugal, esta folga está a ser desperdiçada. Devíamos estar agora a fazer a reforma do mercado de trabalho, da ineficaz Justiça, e a combater a gigantesca burocracia. Em vez disso, ficamos contentes com um crescimento do PIB de 2% e uma taxa de desemprego de 10%, e olhamos para o ar, assobiando.