O polícia americano está de volta

EUA lançaram a sua mais poderosa arma não-atómica no Afeganistão, já depois de atacarem a Síria e de ancorarem navios de guerra ao largo da Coreia do Norte. 

Nos corredores do Departamento de Defesa dos Estados Unidos e dos quartéis-generais do exército norte-americano dão-lhe o tenebroso nome de ‘Mother Of All Bombs’ (‘mãe de todas as bombas’), num trocadilho com o acrónimo MOAB – de Massive Ordnance Air Blast – a denominação mais técnica da bomba GBU-43/B. Considerada a arma não-atómica mais potente que Washington tem ao seu dispor, foi largada na passada quinta-feira sobre um amontoado de túneis e cavernas no Afeganistão, regularmente utilizados por combatentes do grupo terrorista Estado Islâmico e, de acordo com o Governo local, terá matado vários jihadistas e destruído armas e munições.

A utilização de tão poderoso projétil numa região do globo onde se acredita que as forças do Daesh não ultrapassem os 800 soldados e se sabe que a sua ameaça é francamente inferior à propalada na Síria e no Iraque é um sinal claro dos novos ventos que sopram a partir da Casa Branca: o polícia do mundo está de volta. E se dúvidas houvesse, Donald Trump fez questão de as desfazer, poucas horas depois de tornado público o ataque sobre o distrito de Achin, na província afegã de Nangarhar, junto à fronteira com o Paquistão. «Se olharmos para o que aconteceu durante as últimas oito semanas e compararmos com que se passou nos últimos oito anos [Presidência de Barack Obama], poderão ver que há uma enorme diferença. Esta foi mais uma missão bem-sucedida», congratulou-se o Presidente, em declarações aos jornalistas, elogiando «o melhor exército do mundo».

Se o discurso isolacionista e aparentemente partidário de um retraimento na arena internacional, propalado por Trump durante a campanha presidencial, causou dúvidas e desconfianças sobre o caminho a seguir pela nova Administração, no que toca à estratégia de política externa – as palavras do magnata não encaixavam propriamente com a promessa de «prosseguir operações e coligações militares agressivas para esmagar e destruir o Estado Islâmico» e com a garantia de procura da «paz através da força», lacradas no seu programa eleitoral – aquelas declarações, somadas à utilização da bomba GBU-43/B no Afeganistão, ao lançamento de 59 de mísseis Tomahawk contra uma base aérea síria, na semana passada, ou a presença de navios de guerra ao largo da Coreia do Norte [ver texto ao lado], parecem desfazê-las. Os EUA estão mesmo de regresso às intervenções militares diretas fora de portas e dispostos a mudar o paradigma da Administração Obama.

A mãe de todas as bombas

Lançada a partir de um avião MC-140, pelas 19 horas locais de quinta, sobre um labirinto subterrâneo com cerca de 300 metros, numa das infinitas zonas montanhosas do Afeganistão, a bomba GBU-43/B-MOAB tem um poder de destruição muito próximo de uma verdadeira arma nuclear, sem libertar, no entanto, componentes radioativos.

Com quase 10 toneladas, das quais 8,4 são explosivos, esta bomba entra na categoria das chamadas armas termobáricas, caracterizando-se por utilizar o oxigénio envolvente para provocar uma explosão a grandes temperaturas, com um diâmetro aproximado de 1,4 quilómetros, e ter capacidade para penetrar no solo. «À medida que aumentam as suas perdas, eles [os soldados do Daesh] estão a utilizar armadilhas explosivas, bunkers e túneis para reforças as suas defesas», explicou o General John Nicholson, comandante das forças norte-americanas em território afegão, citado pelo Washington Post, para justificar a utilização da GBU-43. «Esta é a munição certa para reduzir estes obstáculos e manter o ímpeto da nossa ofensiva [contra o Estado Islâmico]».

Desenvolvida um pouco antes da invasão anglo-americana ao Iraque, em 2003, a bomba nunca tinha sido utilizada pelo exército dos EUA e fora apenas testada numa ocasião, nesse mesmo ano, no estado norte-americano da Florida. Projéteis termobáricos de semelhante natureza foram, no entanto, utilizados por Washington na Guerra do Vietname, na primeira Guerra do Golfo e no próprio Afeganistão, no pós-11 de setembro.

À CNN – o primeiro canal de informação a noticiar o ataque de quinta-feira – o Pentágono garantiu que foram tomadas «todas as precauções» para evitar «vítimas civis» e «danos colaterais», uma informação que foi confirmada pelo assessor de imprensa da Casa Branca, Sean Spicer, na habitual conferência com os jornalistas nesse mesmo dia.