Espanha. Podemos provoca PSOE com moção de censura a Rajoy

Proposta depende do apoio dos socialistas e da apresentação de um candidato a presidente do governo. Ainda sem líder, PSOE acusa de Iglesias de “má fé”

A promoção de uma moção de censura ao governo de Mariano Rajoy, justificada por Pablo Iglesias como a única forma de salvar Espanha da onda de casos de corrupção que tem vindo a tingir vários membros do Partido Popular (PP), está condenada à partida. O grupo parlamentar encabeçado pelo Unidos Podemos conta com apenas 67 deputados no Congresso, pelo que necessita de outros 109 para lograr a maioria necessária de 176 parlamentares para aprovar a moção e ainda de um candidato ao lugar do atual presidente do executivo. Sem nenhum destes requisitos, a iniciativa apresentada esta quinta-feira pelo Podemos dependerá sempre da participação do PSOE (87 deputados) e de outras forças políticas, como o Ciudadanos (32), sob pena de cair em saco roto.

Iglesias e os seus colegas de coligação conhecem certamente a Constituição espanhola, pelo que uma proposta desta natureza, apresentada pouco tempo depois de quase 10 meses de um impasse político apenas desfeito com o beneplácito do PSOE,  dificilmente poderá ser encarado de outra forma que não um desafio aos socialistas. 

A braços com uma crise interna sem precedentes e com eleições primárias marcadas para o próximo mês, o segundo partido mais representado no parlamento espanhol deve muita da sua recente situação insustentável aos planos do antigo líder Pedro Sánchez, de chamar o Podemos e outros partidos de esquerda para uma solução governativa. Sánchez acabou por ser afastado, os socialistas viabilizaram o governo do PP, e gerou-se uma guerra interna dentro do PSOE, que apenas será resolvida quando os militantes decidirem entre o ex-líder do partido, Patxi López e Susan Díaz, os concorrentes ao cargo de secretário-geral do partido.

Face às circunstâncias, as justificações apresentadas por Iglesias para a promoção da moção de censura – o líder do Podemos defendeu que se vive em Espanha “um estado de exceção democrático com pilhagens públicas permanentes” e rotulou a corrupção do PP como um “vírus” –, levantaram-se vozes de indignação dentro do PSOE. Citado pelo “El País”, o porta-voz dos socialistas Antonio Hernando acusou o Podemos de “má fé e falta de rigor” e rejeitou liminarmente discutir a hipótese de o partido aderir à iniciativa da coligação de esquerda. Um posicionamente abraçado igualmente pelo Ciudadanos que, através do deputado José Manuel Villegas, comunicou não estar disponível para “apoiar o circo do Podemos”.

Depois de 1978 – a data da entrada em vigor da Constituição de Espanha, concebida durante o processo de transição política no país vizinho, após a morte do general Franco, em 1975 –, o parlamento espanhol apenas testemunhou duas moções de censura. A primeira foi apresentada em 1980 pelos socialistas, contra Adolfo Suárez, tendo sido proposto o nome de Felipe González para presidente do governo. Já a segunda teve lugar no ano de 1987 e foi proposta pela Aliança Popular – o partido que deu origem ao atual PP, em 1989 –, contra González. Ambas as iniciativas fracassaram.