O PCP, fiel à sua ortodoxia, fugiu no Parlamento ao voto de condenação do agravamento da «situação de instabilidade e insegurança» na Venezuela. O voto foi aprovado, mas a bancada comunista negou-se a fazê-lo, com argumentos estafados de «ingerência» e de soberania. A sorte dos mais de 400 mil emigrantes portugueses que trabalham naquele país é algo que não preocupa os comunistas.
A Venezuela ocupa, persistentemente, o primeiro lugar no ‘Índice de Miséria’ (Misery Index) desde 2014, elaborado na Universidade Johns Hopkins, dos Estados Unidos.
Antes, em 2013, o índice era liderado pela Síria, seguida da Venezuela, Sudão, Irão e S. Tomé e Príncipe. O top ten, em 2016, manteve a Venezuela à cabeça, seguida da Argentina.
Com um PIB per capita que caiu para menos de metade do português, e uma taxa de inflação que é das mais elevadas do mundo (só em 2015 os alimentos encareceram 315%), é fácil perceber as razões do desespero que tem empurrado os venezuelanos para uma forte contestação nas ruas.
Poder-se-iam alinhar outros dados para traduzir o caos instalado desde que Nicolás Maduro assumiu o poder em Caracas – querendo prolongar o chavismo sem Chávez, com asfixia da liberdade de imprensa e anulação do Parlamento, onde a oposição logrou uma maioria. A repressão violenta faz o resto, já com vítimas.
O comportamento de Maduro, ao procurar neutralizar os adversários políticos pela via do medo e do cárcere, deixa antever o pior dos cenários, lançando um novo totalitarismo na América Latina.
Chávez já o prometia, embora procurando ‘pontes’ com a Europa – e, em especial, com Portugal, através dos governos de Sócrates, de quem se dizia amigo.
Não faltaram nesse período as ‘embaixadas económicas’ rumo a Caracas, cheias de projetos e de negócios que, em não poucos casos, ficaram pelo caminho.
Ao instar as autoridades venezuelanas a «conter a violência e a respeitar os direitos da oposição democrática, restituindo a ordem constitucional na Venezuela», o Parlamento tomou a iniciativa que tardava há muito, perante as incertezas que têm atingido, com gravidade, a comunidade portuguesa.
O caos favorece o crime. E não admira, por isso, que a Venezuela se tenha transformado, também, num dos países mais perigosos do mundo. Depois, o índice de corrupção no setor público desaconselha os investidores, mesmo os mais afoitos.
De acordo com o ranking ‘Doing Business’, que classifica os países segundo a facilidade que oferecem para realizar negócios, a Venezuela ocupa a 187ª posição em 190.
Apesar destas evidências, que semeiam incógnitas no futuro venezuelano e na grande comunidade portuguesa ali residente – com forte influência da emigração madeirense –, o PCP ofereceu a sua solidariedade ‘internacionalista’ ao regime de Maduro, indiferente ao destino, nalguns casos dramático, dos nossos compatriotas.
Aliás, a maioria dos nossos media esquece a assertividade e trata com pinças os candidatos a ditadores de ‘esquerda’, refugiando-se numa complacência comprometida.
A condenação da Assembleia da República foi ‘tirada a ferros’, e o CDS, autor da proposta, não perdeu a oportunidade de considerar «uma vergonha» o voto contra do PCP. E com razão. Mas este tem antecedentes,
Ainda há um ano, por esta altura, o PCP reafirmava a sua «solidariedade à Revolução Bolivariana» e condenava «a campanha de desestabilização e agressão orquestrada pelo imperialismo norte-americano».
O ‘inimigo externo’ faz parte da cartilha ideológica habitual do PCP, sempre que o ‘caldo se entorna’ e as populações se sublevam contra a tirania.
Maduro está em queda livre e o país com a economia desfeita em cacos. A queda dos preços do petróleo – uma das principais fontes de rendimento da Venezuela –, e as decisões erráticas que o governo ‘socialista bolivariano’ tem tomado, explicam o desnorte. E o desastre.
Neste contexto, que importam ao PCP as agruras de milhares de portugueses? Absolutamente nada.
Um partido envelhecido precisa de se agarrar a quaisquer destroços do naufrágio do movimento comunista, desde a União Soviética ao colapso dos partidos-irmãos europeus, amparado às extravagâncias dos confrades que lhe sobram da Coreia do Norte, da Venezuela ou de Cuba, que costuma convidar para a Festa do Avante!.
Arvorado em guardião do 25 de Abril e da Constituição, o PCP não hesita em considerar o Programa de Estabilidade e o Plano Nacional de Reformas como «instrumentos de ingerência e policiamento impostos pela União Europeia e pelo Euro». As suas propostas de saída do União e do euro, se vingassem, aproximar-nos-iam depressa da miséria ‘bolivariana’ da Venezuela. Pelos vistos, uma fonte inspiradora para o PCP…