Ser mãe: uma longa dança

Para muitas pessoas, é logo em criança que surge o desejo de ser mãe. Desde cedo as meninas passeiam e cuidam das suas bonecas como sentiram ser cuidadas.  Vão sonhando com a maternidade, ao mesmo tempo que descobrem do que é feita a relação.

Um dia a menina que trazia nas mãos redondas e macias uma boneca maior do que ela já pode ter um bebé de verdade. O desejo vai crescendo e o bebé desde sempre mais ou menos imaginado torna-se cada vez mais real. As primeiras vezes que o sentimos dentro de nós é uma surpresa mágica. Como serão muitas outras. Nesta fase já todos anseiam a chegada do bebé, é querido por toda a família e amigos, mas para a mãe ele já existe, há um bebé que só ela conhece. Só ela acompanha, sente, alimenta e carrega. Mãe e bebé envoltos numa só pele.
 
Surge o dia em que o bebé deixa o interior da mãe e é posto no calor do seu peito. O primeiro abraço, que se prolongará por duas vidas.

Não há relação mais especial e mais carinhosa. A mãe enternecida é capaz de ficar indefinidamente a contemplar o seu bebé. Sorri espontaneamente e mantém-se nesse estado de graça, esquecendo o que a rodeia. Vivem em comunhão, num estado simbiótico que engrandece os dois, em amor, em afeto e em ternura.

A menina mãe descobre um novo eu, uma nova forma de amar e ser amada. Os primeiros meses são a prova de fogo. Desenvolve capacidades extraterrestres: consegue sobreviver sem dormir, por vezes sem comer, ao mesmo tempo que alimenta a sua cria, muda fraldas, veste e despe dia e noite sem distinção. Cria super poderes de visão noturna, de andar sem ser ouvida, de dar de mamar, enviar mensagens, pensar no que vai fazer para o jantar e vestir o pijama ao bebé ao mesmo tempo para que ele não acorde e solte o temido ‘BUUAAAAÁ!!!!’.

O bebé cresce, torna-se criança, e mãe e filho vão caminhando juntos no descobrir de uma nova vida. Pelas várias descobertas da criancice, pela tramada adolescência e, quando a vida o permite, pela idade adulta. Quando a mãe menos espera e sem se aperceber, os filhos meninos, de mãos redondas e macias, têm outros bebés de mãos redondas e macias. Que a avó acarinha com ternura, mas sempre diferente da que tem pelos seus filhos bebés adultos.

Ambos vão envelhecendo juntos e, apesar de as mãos redondas e macias se tornarem mais esguias e engelhadas, de os cabelos perderem a cor e o rosto se encher de curvas da vida, ambos se veem quase como no primeiro dia. A relação é tão próxima que apesar de todos os sinais, não se conseguem ver envelhecer, pelo menos como os outros veem. Mãe e filho permanecem indiferentes ao passar do tempo.

E a dada altura, nesta relação intrincada, os papéis invertem-se e o filho dedica-se como se dedicaram a ele: ‘Já almoçaste? Comeste tudo? Sabes que tens de beber muita água. Já voltaste da rua? Chegaste bem? Tem cuidado para não caíres. Agasalha-te bem. Como estás esta noite? Precisas de mim?’.

É como uma longa dança, que dura para sempre, mesmo quando já ninguém a vê. Uma dança de troca e comunhão, em que se cuida, se olha, se permanece e nunca, mas nunca, a mão redonda e macia se volta a desprender.