Rui Moreira ainda não foi reeleito nem a campanha autárquica para a cidade do Porto começou, mas o tema de burburinho já é o seu futuro além da Câmara Municipal do Porto.
Se uns apostam numa ambição mais nacional – para a presidência da República especificamente -, outros garantem que a boa relação que mantém com o Partido Socialista a nível local e de Governo sugere um caminho como ministro ou eurodeputado do PS.
Moreira nega que o seu futuro político ultrapasse o de autarca da Invicta. Sim. O futuro pretendido por Rui Moreira não sai do Porto, mas é menos político do que se supõe. Ao que o SOL apurou, na verdade, é de fundo desportivo mas igualmente relevante do ponto de vista social. Outra presidência. Outro Porto. É a sucessão a Jorge Nuno Pinto da Costa no FCP.
O SOL sabe que o atual presidente da Câmara Municipal do Porto tem a ambição íntima de ser o futuro presidente do Futebol Clube do Porto e que a quebra da sua aliança com Manuel Pizarro e o PS está relacionada com o presidente do executivo camarário que prefere deixar em sua sucessão, caso abandone o cargo para tentar a liderança do Dragão.
É que se houvesse uma coligação pré-eleitoral com o Partido Socialista e Manuel Pizarro conseguisse ser o número 2 na lista da vereação e consequente vice-presidente de Rui Moreira na Câmara do Porto estava assegurada a subida a presidente. Ou seja, se Moreira saísse, aproveitando um vazio de poder na ‘cadeira de sonho’ – a de Pinto da Costa – Pizarro seria o presidente da Câmara do Porto e o Partido Socialista recuperaria a Invicta pela primeira vez desde o longínquo ano de 2002.
Moreira, embora amigo pessoal de Pizarro e com dois ‘moreiristas’ no governo de António Costa – Azeredo Lopes, na Defesa e seu ex-chefe de gabinete, e Matos Fernandes, no Ambiente e seu antigo presidente nas Águas do Porto – não quereria entregar o executivo aos socialistas, protegendo não só o seu movimento independente como também a sua própria saída da Câmara Municipal. E por isso há quem diga que ‘esticou a corda’ para evitar pressões para Pizarro ir em segundo lugar.
A reforma desportiva de Jorge Nuno Pinto da Costa – cujo 13.º mandato termina em 2020, quando estiver nos 83 anos – seria, então, a reforma política do autarca independente mais popular do país e o início possível de outro seu reinado. O mandato de Moreira, caso seja eleito, termina em 2021.
«Foi uma jogada brilhante. Rompe com o PS, protege a sucessão, recupera eleitorado à direita que andava a perder e encosta Pizarro. O candidato do Bloco de Esquerda [João Semedo] é uma dor de cabeça para um PS a concorrer sozinho», elogia fonte nortenha, próxima do processo e reservada ao anonimato. «O eleitorado a que Álvaro Almeida [independente, apoiado pelo PSD] apontou desde que o PS/Porto apoiou Moreira pode regressar ao presidente de Câmara», prossegue a mesma fonte, ao SOL, em jeito de explicação. «Isto foi política a sério. Ficou com o caminho livre para a reeleição e com o caminho livre para o Futebol Clube do Porto, que é o que sempre quis».
‘Juca’ convidado
Na sexta-feira à noite, depois de divulgadas (pela SIC) as declarações de Rui Moreira recusando ceder ao PS e incluir um socialista (Manuel Pizarro) como número dois da sua lista à Câmara do Porto nas eleições de Outubro, o PS-Porto reuniu-se de emergência.
Manuel Pizarro, Tiago Barbosa Ribeiro e outros dirigentes das estruturas locais do PS decidiram aceitar as condições de Moreira e isso mesmo foi comunicado ao candidato independente e presidente da Câmara.
Só que, face às opiniões divergentes entre os próprios dirigentes locais e, sobretudo, nas estruturas nacionais, António Costa e a direção nacional do partido foram peremptórios na afirmação de romper com Moreira e apresentar um candidato próprio. Imediatamente, até porque, no dia seguinte, sábado, o líder não poderia aparecer a presidir a Convenção Autárquica do PS sem ter resolvido o problema da segunda maior câmara do país.
Foi por isso que, face às hesitações de Manuel Pizarro (alinhado com Rui Moreira), António Costa deu o seu assentimento ao contacto com Júlio Magalhães, portista conhecido e diretor do Porto Canal, para saber da sua disponibilidade para encabeçar a lista socialista.
E Júlio Magalhães foi mesmo contactado nesse sentido, tendo sido apanhado de surpresa quando jantava com um grupo de amigos.
Entretanto, imediatamente a seguir, e depois de conversas com os dirigentes nacionais e locais, Manuel Pizarro decidiu-se mesmo, já de madrugada, a aceitar o desafio para ser o candidato concorrente de Rui Moreira.
E no sábado, na Convenção Autárquica do PS, já foi um dos protagonistas maiores.
Acontece que, no domingo, Marques Mendes revelou no seu habitual comentário televisivo saber que Júlio Magalhães fora convidado pelo PS para concorrer ao Porto – facto que a concelhia local socialista se apressou a desmentir por comunicado.
O SOL apurou que os socialistas tentaram que Júlio Magalhães também viesse a público confirmar tal desmentido. O jornalista, porém, manteve-se remetido ao silêncio durante a semana e só na quinta-feira surgiu a prestar declarações, confirmando, porém, a existência de um contacto telefónico (sms) lançando-lhe o desafio.
Júlio Magalhães não quis desmentir formalmente nem o PS nem António Costa (que se manteve na sombra de todo o processo). Mas, ainda que de forma implícita, fê-lo.
Até porque o grupo de amigos que o acompanhava no jantar durante o qual recebeu tal convite, sabia de toda a verdade.
Recorde-se que o PS já tentara convencer Júlio Magalhães a ser candidato autárquico nas eleições passadas (dessa vez como candidato a Gaia), tal como o PSD já o convidara para as autarquias da Maia e Gondomar em eleições anteriores.
Júlio Magalhães sempre recusou tais convites, por porem em causa a possibilidade futura de regressar ao jornalismo.
As hesitações de Manuel Pizarro e as contradições do PS nos rocambolescos últimos dias da semana passada – que conduziram à rutura definitiva entre PS e Moreira (noticiada na última edição do SOL – que já dava conta de Costa ter sido forçado a arranjar um candidato à pressa) são confirmadas pelas insólitas duas capas antagónicas do JN de sábado (edição de Lisboa, que fechou mais cedo, com a versão de que Pizarro integraria as listas de Moreira; e a edição do Porto, com a candidatura de Pizarro contra Moreira). E com a nota explicativa da direção do JN, na edição de domingo, garantindo que ambas as capas eram absolutamente verdadeiras no momento em que cada uma delas foi impressa. Não eram, de facto, porque a direção nacional já tinha afastado de vez a possibilidade de o PS aceitar as condições de Moreira.
Ruptura começou antes de Pizarro saber
De facto, nem foram as declarações da secretária-geral adjunta do partido, Ana Catarina Mendes – colocando em xeque Rui Moreira quanto à formação da lista para a Câmara – o primeiro sinal de que o ‘acordo’ entre PS e o movimento independente estava por um fio.
Antes disso, já António Costa tinha dado indicação ao presidente do partido, Carlos César, de que devia cancelar a viagem programada ao Porto para selar o entendimento com o actual presidente da Câmara.
César acabou mesmo por viajar para os Açores, quando era suposto estar na Invicta.