Espanha. Socialistas debateram futuro com olhos fixos nos desgostos do passado

Pedro Sánchez e Susana Díaz foram protagonistas num debate intenso, que antecede as eleições primárias do PSOE. Patxi López ficou com o papel de apaziguador e não conseguiu intrometer-se num debate a dois

Pareceu estratégica a colocação de Patxi López no palanque do meio, entre Susana Díaz e Pedro Sánchez, como se quem organizou o debate de hoje, entre os três candidatos à liderança do Partido Socialista espanhol, tivesse previsto o que aí vinha e quisesse evitar males maiores. Durante cerca de uma hora e meia, o político basco viu-se espremido entre a presidente da Andaluzia e o ex-secretário geral do partido, que trocaram acusações e fizeram por merecer o protagonismo da contenda, com duas visões antagónicas sobre o que esperam o estado atual do maior partido de esquerda de Espanha.

O bate-boca entre Sánchez e Díaz foi te de tal forma absorvente, que o próprio Patxi López se achou na pele de apaziguador, com recorrentes apelos à reconciliação entre os candidatos que com ele disputarão as eleições internas socialistas, já no próximo domingo. “Temos de derrotar a direita, não de nos derrotarmos uns aos outros”, “continuamos a equivocar-nos, continuamos a lutar entre nós” ou “não se trata de encontrar os culpados do mal que andamos a fazer, trata-se de encontrar soluções”, foram algumas das tentativas de López para serenar os ânimos.

Mas em vão. Moderado por Carmen del Riego, do “La Vanguardia”, o debate foi quase exclusivamente jogado a dois, para desalento de Patxi. E compreende-se. Susana Díaz e Pedro Sánchez partem como favoritos nas sondagens – de acordo com um estudo de domingo do Sigma Dos, para o “El Mundo”, Sánchez lidera as intenções de voto, com 52%, ao passo que Díaz segue na segunda posição com 27,1% e López se fica pelos 14,% – e foram protagonistas do episódio chave da grande novela em que se havia transformado a política do país vizinho, no ano passado, e que está na origem da votação do dia 21.

Congelado durante dez meses pela ausência de governo e por duas eleições pouco ou nada esclarecedoras, o exercício de facto do poder executivo em Espanha apenas foi conduzido para as mãos de Mariano Rajoy e do seu Partido Popular, após a um verdadeiro motim interno dentro do PSOE. Com planos para criar uma aliança governativa das esquerdas, Sánchez foi afastado do cargo de secretário-geral pela cúpula socialista, liderada por Díaz, e viu, de fora, o partido abster-se na votação de aprovação do partido minoritário de direita.

Não estranhou, portanto, que o debate se tenha focado menos no futuro e mais no passado. Pedro Sánchez não esqueceu a ‘traição’ de outubro e Susana Díaz agarrou-se à fraca prestação do PSOE, nas legislativas de junho, que valeram ao partido o seu pior resultado de sempre. “Susana, espero que reconheças que a [decisão pela] abstenção foi a pior de todas as decisões”, lançou o antigo secretário-geral, citado pelo “El País”, que acredita que esse caminho, escolhido por Díaz, colocou o PSOE “em terra de ninguém” e deixou-o “condenado a ser terceira ou quarta força política” de Espanha. “Pedro, o teu problema não sou eu, o teu problema és tu, e estamos aqui porque só conseguimos 85 deputados nas eleições”, respondeu-lhe a presidente da Andaluzia, que se mostrou incrédula com a derrota dos socialistas “contra um PP tóxico e corrupto”.

Pelo meio Susana Díaz acusou o seu adversário de ter uma agenda própria e de mudar a sua doutrina consoante as circunstâncias, ao passo que Pedro Sánchez denunciou as conspirações lideradas pela sua oponente, em 2014, com vista ao seu afastamento do cargo, pouco depois de ser eleito. “Não se pode questionar permanentemente o secretário-geral”, defendeu Sánchez.

Caso consigam convencer a maioria dos cerca de 187 mil militantes inscritos nas primárias do partido, Díaz e Sánchez comprometem-se com decisões ambiciosas. O ex-líder do PSOE diz que a sua primeira medida “será pedir a demissão de Rajoy” – chegou mesmo a defender a “via portuguesa” para “derrotar a direita” – ao mesmo tempo que promete “dar voz à militância” e retirar aos barões do partido a maioria dos poderes de decisão. Já Susana Díaz garante que se falhar a “remontada eleitoral” nas próximas legislativas, afasta-se imediatamente da liderança socialista. Promessas que, para Patxi López, apenas aumentarão o “risco de desaparecimento” do PSOE. “Não vamos a lado nenhum”, lamentou o basco ‘esquecido’.