A jovem que aparece no vídeo de teor sexual partilhado nos últimos dias nas redes sociais já foi identificada pela polícia, mas não quis apresentar queixa. As imagens que mostram a jovem a ser masturbada num autocarro, no Porto, durante a Queima das Fitas, não deixa clara a existência de um abuso sexual. Mas, mesmo que tal tenha acontecido, a investigação está dependente de participação da vítima, o que não se verificou. Nos crimes de violação, considerados desde 2015 semipúblicos no Código Penal português, as vítimas podem apresentar queixa no prazo de seis meses.
Ontem foi conhecido um novo caso relacionado com a divulgação de imagens de teor sexual nas redes sociais. Uma jovem estudante da Universidade do Minho fez queixa às autoridades depois de se ter apercebido de que estavam a circular imagens suas, seminua, num momento em que não sabia que estava a ser filmada, também durante a Queima, neste caso de Braga.
Crime sexual?
Sem haver participação, o facto é que a divulgação das imagens, por si só, não permite concluir que tenha havido um crime sexual. Segundo o i apurou, esta é a perspetiva das autoridades que foram para o terreno averiguar o que se passou. Não há factos que provem a alcoolemia dos jovens envolvidos. As imagens atestam, ainda assim, que havia uma plateia a assistir com risos e aplausos, ao mesmo tempo que uma terceira pessoa, cuja identidade não foi revelada, filma o ato sexual.
Os motivos que levam a jovem a não apresentar queixa também não são conhecidos, pelo que pode nunca se chegar a apurar o que realmente aconteceu no autocarro.
Carlos Cabreiro, diretor da Unidade Nacional de Combate ao Cibercrime e à Criminalidade Tecnológica (UNC3T) explicou ao i que neste tipo de casos existe ambiguidade, não sendo certo que as pessoas envolvidas tenham ou não dado consentimento para as filmagens e consequente partilha até que se prove o contrário. “Tudo será diferente a partir do momento em que as pessoas envolvidas se queixem. Neste caso em concreto, só podemos atuar quando temos a perceção da queixa das pessoas intervenientes, ou por quererem salvaguardar a sua imagem – uma vez que estão a ser expostas num ato sexual que possa estar subjacente – ou pela posição em que se é vítima.”
Carlos Cabreiro sublinha que as redes sociais são um constante desafio. “Esta evolução tecnológica foi muito brusca: onde começa a liberdade de um e acaba a do outro? Onde está a privacidade? O conceito de privacidade está a sofrer mutações e os jovens e as pessoas de mais idade têm noções diferentes de privacidade.”
Quem acredita que as imagens “indiciam comportamentos que consubstanciam a prática de crime contra a liberdade e autodeterminação sexual” é a Comissão para a Cidadania e Igualdade de Género, que apresentou queixa no DIAP do Porto. A CIG também já apresentou queixa contra o “Correio da Manhã” no Ministério Público, depois de o jornal ter divulgado o vídeo. Também a Entidade Reguladora para a Comunicação Social decidiu abrir um inquérito para averiguar os procedimentos da publicação do grupo Cofina, depois de ter recebido mais de 500 queixas. Em causa pode estar o crime de devassa da vida privada.