Manchester. O rasto pode ultrapassar a Líbia

As operações alastram-se até a Tripoli, na Líbia, onde dois familiares do bombista foram detidos. Engenho explosivo era “sofisticado”. 

A tese que dominava esta quarta-feira a investigação ao atentado de segunda-feira era a de que Salman Abedi não atuava sozinho quando se fez explodir na Manchester Arena. As autoridades britânicas calculam que o bombista teve ao seu dispor uma rede que provavelmente lhe fabricou o colete de explosivos com que se fez detonar, matando mais de vinte pessoas e ferindo dezenas, entre elas crianças e adolescentes.

A tese sustenta o nível crítico de alerta que se vive no país e serviu de lançamento a uma série de operações antiterrorismo no Reino Unido e no estrangeiro. Ao final do dia, mais sete pessoas haviam sido detidas – são agora nove, desde segunda-feira. Duas são familiares de Abedi e foram capturados esta quarta-feira em Tripoli, na Líbia, de onde são originários e para onde se mudaram recentemente. Um irmão do bombista foi detido e as autoridades dizem que estava a preparar um atentado na cidade, também em nome do autoproclamado Estado Islâmico.

“Parece-me muito claro que se trata de uma rede”, lançou esta quarta-feira Ian Hopkins, o chefe da polícia de Manchester, confirmando as suspeitas que foram vertendo para a imprensa ao longo do dia, primeiro vindas do governo francês, que disse que bombista pode ter passado pela Síria, e, mais tarde, vindas da própria ministra britânica do Interior, sugerindo que os exposivos detonados na noite de segunda-feira são demasiado complexos para terem sido construídos por um sujeito de 22 anos sem ajuda ou treino especializado. Nas palavras de Amber Rudd, o cinto suicida é “mais sofisticado do que os que vimos em alguns ataques passados”. 

Fábrica

A polícia britânica parece concentrada em encontrar a “fábrica” onde foi construído o colete que Salman Abedi usou no fim do concerto de Ariana Grande. Nada se conhece das detenções realizadas esta quarta-feira para além de que estão relacionadas com conhecidos do bombista, que chegou a ser investigado pelas autoridades britânicas, que concluíram, na altura, que não passava de uma figura periférica.

O “New York Times” publicou fotografias do engenho, revelando que o explosivo era poderoso e estava escondido num colete ou numa mochila, lingando-se a um detonador que Abedi transportou na sua mão esquerda. Morreram as pessoas que estavam à sua volta, quase num círculo perfeito, segundo a investigação britânica citada pelo diário nova-iorquino: “São indicações de uma carga poderosa, de alta velocidade, e de uma bomba que continha estilhaços cuidadosa e equilibradamente instalados.”

Os dias líbios

A família de Abedi estava já no radar da imprensa antes das operações em Tripoli. O pai de Abedi disse num telefonema à Associated Press que o seu filho está inocente e que a família “não acredita em matar inocentes”. No entanto, várias notícias sugerem que a própria família ficou recentemente em alerta com a possível radicalização do filho. Não se sabe ao certo quando é que o bombista começou a dar sinais de uma ideologia violenta, mas sabe-se que passou uns dias com a família na sua nova residência em Tripoli e que os pais se sentiram tão preocupados que lhe chegaram a esconder o passaporte.

A história na imprensa britânica e norte-americana não é consensual e não se sabe ao certo se Abedi passou realmente alguns dias na Síria, tal como revelou esta quarta o ministro francês do Interior, Gerard Collomb – alguns relatos dizem que Abedi ficou no Reino Unido no momento de os pais voltarem ao país de onde fugiram como refugiados da ditadura de Khadafi, outros sugerem que partiu com ela, mas que regressou há semanas, ocultando-o aos seus pais sob o pretexto de querer viajar até Meca. 

A história da radicalização de Abedi desenrolar-se-á nos próximos dias. Por enquanto, parece ajustar-se à história comum de alguns dos bombistas e atacantes de Paris e Bruxelas, a que o investigador francês Olivier Roy compara a niilistas que encontram um álibi de violência na religião e que, como Abedi, pertencem a segundas ou terceiras gerações de famílias originárias de meios muçulmanos e que levaram vidas “ocidentalizadas” até ao momento dos atentados.