Convocada pelas centrais sindicais brasileiras para reivindicar a demissão de Michel Temer e protestar contra reformas da Previdência social, a manifestação que teve lugar ontem em Brasília deveria ter ocorrido de forma pacífica. Mas passada apenas uma hora do início dos protestos – que duraram quatro horas, entre as 13h30 e as 17h30 locais (mais quatro horas em Portugal continental) – a zona da Esplanada dos Ministérios já estava transformada num verdadeiro palco de guerra, que apenas voltou à normalidade quando o presidente autorizou o destacamento das Forças Armadas para o local.
De acordo com a organização dos protestos, participaram na manifestação mais de 100 mil pessoas, embora as autoridades brasileiras falem em cerca de 35 mil. O início da violência terá começado quando um grupo de manifestantes começou a lançar garrafas contra a polícia que bloqueava o acesso à área mais próxima do Congresso Nacional e do Palácio do Planalto. O “Estado de São Paulo” refere que os agentes responderam com gás e spray pimenta e instaram os protestantes a dispersar. A decisão não foi acatada e a situação descontrolou-se rapidamente, pese os pedidos incansáveis de calma dos responsáveis máximos dos sindicatos, através dos megafones trazidos para o protesto.
Os manifestantes atearam fogo às casas de banho públicas e às paragens de autocarro daquela área e conseguiram invadir as zonas de acesso aos edifícios dos ministérios da Agricultura, do Planeamento, dos Transportes e da Fazenda, que tiveram de ser evacuados. No primeiro ministério também foi ateado fogo, que resultou num incêndio de largas proporções. O balanço final aponta para 49 feridos, oito detenções e incontáveis estragos materiais.
O descontrolo em Brasília e o receio de que aquele clima de violência se pudesse estender a outras cidades levou o governo a tomar medidas drásticas. Cerca de 1500 soldados do exército foi destacados para as ruas para conter a violência e por lá se manterão nas próximas horas. “O presidente entende que é inaceitável a baderna e o descontrolo, e não permitirá que atos como este venham a perturbar um processo que se desenvolve de maneira democrática e em respeito com as manifestações”, explicava ontem o ministro da Defesa, Raul Jungman, citado pela “Folha de São Paulo”, na hora de justificar a decisão de chamar as Forças Armadas.
No Brasil especula-se cada vez mais sobre a hipótese da abertura de um novo processo de “impeachment”a um presidente – Dilma Rousseff foi afastada do cargo em agosto de 2016, de acordo com essa mesma moldura constitucional –, muito por culpa da revelação das gravações, levadas a cabo por dois administradores da empresa JBS, e nas quais se sugere que Temer terá tentado comprar o silêncio do ex-líder líder da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha, detido no âmbito da Operação Lava Jato. O presidente do Brasil garante que não se vai demitir.