“Eu sei que não estou sob investigação”, garantia Donald Trump, numa entrevista à NBC News, há cerca de um mês, na fase mais crítica do furacão provocado pela demissão do então diretor do FBI, James Comey. Em causa estava a investigação às alegadas relações entre membros da administração norte-americana e figuras de destaque do Kremlin e na origem das certezas do presidente dos EUA, estaria o testemunho do próprio Comey, quando diretamente questionado sobre o envolvimento do chefe de Estado no inquérito, em janeiro deste ano.
Ora, de acordo com o “Washington Post”, em primeira mão, e com o “Wall Street Journal” e o “New York Times”, mais tarde, no preciso momento em que Trump revelava ao jornalista Lester Holt as suas convicções, é muito provável que a referida investigação já estivesse a reorientar-se para a sua própria pessoa. Escrevem aqueles aqueles jornais norte-americanos que Robert S. Mueller III – o procurador especial que lidera as investigações à suposta ingerência russa – decidiu abrir um inquérito ao presidente dos EUA, pouco depois do despedimento de Comey, que pretende esclarecer se Trump incorreu num crime de obstrução à justiça.
Fontes próximas do processo terão confidenciado aos media americanos que Mueller liderou, durante esta semana, uma série de inquéritos a três funcionários de topo dos serviços de Inteligência do país – Mike Rogers, atual diretor da Agência de Segurança Nacional, Richard Ledgett ex-vice-diretor da mesma agência e Dan Coats, diretor da Comunidade de Inteligência Nacional – de forma a perceber se Trump pressionou ou não Comey a largar as investigações sobre os russos.
“As entrevistas sugerem que Mueller entende a possível obstrução à justiça como algo maior que uma disputa pessoal entre o presidente e o diretor do FBI despedido”, conta ao “Washington Post” um funcionário público envolvido nos inquéritos.
A confirmar-se a abertura da investigação ao presidente dos Estados Unidos, inaugura-se uma nova e inédita fase num processo que a Casa Branca ainda não conseguiu chutar para canto e que teima em minar a credibilidade da administração republicana, numa altura em que a presidência Trump está prestes a cumprir 150 dias.
De acordo com uma sondagem realizada pela Associated Press, 60% dos participantes acredita que o presidente “tentou impedir ou obstruir a investigação” e 68% mostra-se “preocupado” com uma situação de eventuais ligações entre o presidente, ou alguém próximo, e entidades ligadas à liderança de Vladimir Putin. Desses 48% estão ou “muito preocupados” ou “extremamente preocupados”.
O chefe de Estado norte-americano já reagiu à polémica e através de duas mensagens publicadas esta quinta-feira de manhã, no Twitter, catalogou os rumores como “uma história falsa (‘phony’)”, dizendo que está a ser vítima de uma “caça às bruxas”. “Eles inventaram um conspiração falsa com história dos russos, encontraram zero provas, e agora avançam para a obstrução à justiça, nesta história falsa. Bom”, escreveu Donald Trump naquela rede social, para depois se defender: “Estão a testemunhar a maior CAÇA ÀS BRUXAS da História política americana – liderada por pessoas muito más e conflituosas!”
O “Washington Post” noticia, porém, que investigar um presidente em funções, por matérias relacionadas com a justiça, é uma tarefa intrincada. Isto porque as orientações do Departamento de Justiça dos EUA vão no sentido de “passar a bola” ao Congresso, uma situação que torna uma questão criminal, numa questão de natureza política. Nas mãos dos congressistas e senadores ficaria a decisão de abrir, ou não, um processo de destituição do presidente, uma eventualidade que reduz, naturalmente, a avaliação exclusivamente legal da conduta do presidente.