Decorridas quatro décadas de vigência do texto constitucional de Abril, o direito fundamental à habitação é provavelmente aquele que mais carece de uma atenção redobrada por parte do legislador. O desenvolvimento de uma Lei de Bases da Habitação, iniciativa a ser preparada pela deputada Helena Roseta nos termos dos compromissos eleitorais e políticos do Partido Socialista, é um elemento chave para o sucesso de uma estratégia que consiga responder aos vários os eixos por onde se desdobra a necessidade de intervenção legislativa e governativa.
Em primeiro lugar, o acesso à habitação pelos jovens é um passo fundamental do processo emancipatório e uma fase determinante para o início de um projeto de vida familiar num contexto estável, devendo os instrumentos existentes, como o programa Porta 65, ser potenciados em articulação com claras opções municipais de criação de habitação a custo controlado e de programas adicionais de fixação de jovens no interior das cidades.
A mensagem esta semana reiterada pelo presidente da Câmara Municipal de Lisboa, Fernando Medina, no lançamento da sua candidatura, vai precisamente no caminho certo e seguro que já teve tradução com o lançamento do programa de rendas acessíveis, com preços entre os 250 e os 450 euros, e que pretende atrair para a cidade de Lisboa até 7 mil famílias.
Em segundo lugar, a legislação do arrendamento – corrigidas no imediato as fontes de grande incerteza para os inquilinos mais fragilizados pelas normas produzidas pela anterior maioria a partir da pena da atual líder do CDS – carece de uma avaliação estruturada capaz de proteger todas as partes da relação e oferecer soluções consignadas de habitação, combinada com opções claras em sede fiscal que tornem o arrendamento de novo uma solução de longa duração e com estabilidade e vantagens para quem por ela opta.
Neste contexto, o impacto do regime do alojamento local na disponibilidade de frações para arrendamento de longa duração, bem como os seus efeitos na qualidade de vida dos bairros onde começam a predominar com intensidade, têm de fazer parte da reflexão e permitir encontrar uma solução equilibrada para todos, que não comprometa o papel importante que a figura tem desempenhado, mas que também não onere desproporcionadamente os residentes.
Finalmente, o domínio da habitação social deve continuar a merecer especial atenção e convocar Estado e municípios para um debate claro sobre condições de acesso, fixação de rendas, necessidade de reforço da oferta e requalificação dos bairros existentes. A existência ainda em vários pontos do país de muitos fenómenos de habitação de génese irregular, precária e sem condições condignas vem sublinhar a necessidade de equacionar uma nova geração de planos especiais de realojamento, devidamente enquadrados com respostas sociais e com soluções urbanísticas de qualidade.
Em suma, não só é manifesto que, para início de debate, já temos um extenso caderno de encargos, como a premência de uma Lei de Bases enquadradora se deve mesmo ter por incontornável.