Nos primeiros quatro meses do ano os portugueses compraram menos 143.663 embalagens de antibióticos face ao ano passado, uma descida de 4,8%. Numa nota divulgada pelo Infarmed, a agência reguladora do medicamento assinala que a tendência de quebra no consumo destes medicamentos se verifica desde o ano passado. No caso das quinolonas, destaca o Infarmed, os dados são ainda mais favoráveis, uma vez que houve uma diminuição de 5,9% e estes são os antibióticos que estão mais vezes associados a resistências.
Porque é que é boa notícia? O combate ao consumo excessivo de antibióticos está na ordem do dia. O aumento das resistências a este tipo de medicamentos esteve em discussão na última cimeira do G20 em Hamburgo e a Comissão Europeia desenhou um plano de ação com 75 medidas contra a resistência aos antimicrobianos. “Os antibióticos são essenciais para tratar doenças comuns e prevenir infeções. No entanto, o seu uso excessivo pode tornar as bactérias perigosamente resistentes e os antibióticos tornam-se menos eficazes. Os custos ascendem a 1,5 mil milhões de euros por ano, calculando-se que haja 25 mil mortes por ano na UE”, assinalou o Infarmed a propósito deste plano.
A super-gonorreia que ajuda perceber o fenómeno
Outro alerta, que teve maior repercussão mediática, chegou da Organização Mundial da Saúde. Na última sexta-feira, a OMS fez saber que dados de 77 países sugerem que a resistência aos antibióticos está a fazer da gonorreia – uma infeção sexualmente transmissível comum – uma doença muito mais difícil de tratar. “A bactéria que causa gonorreia é particularmente inteligente. De cada vez que usamos uma nova classe de antibióticos para tratar a infeção, a bateria evolui para se tornar resistente à mesma”, diz Teodora Wi, perita citada pela OMS.
A explicação resume a problemática do consumo excessivo ou desadequado de antibióticos – quando são tomados sem critério ou mal tomados (e a infeção não é totalmente debelada) aumenta-se o risco de as bactérias adquirirem mecanismos que as tornam imunes aos princípios ativos da medicação e continuarem a circular, podendo colonizar outras pessoas com um impacto maior do que quando não tinham estes truques para escapar à medicação de primeira ou segunda linha – há até casos de bactérias que já não são passíveis de tratar com qualquer antibiótico.
Uma das preocupações a nível mundial são as infeções que se manifestam quando uma pessoa está internada num hospital, mais vulnerável, o que combinado com as resistências das bactérias aos tratamentos disponíveis aumenta o risco de complicações graves.
Em Portugal, existe um plano prioritário na Direção Geral da Saúde que visa estudar e melhorar o cenário do país no que toca ao consumo de antibióticos.
Segundo o último balanço do Programa de Prevenção e Controlo de Infeção e de Resistência aos Antimicrobianos, referente a 2015, há vários indicadores em Portugal que merecem preocupação. No ultimo inquérito europeu sobre a prevalência de infeções hospitalares, estimava-se que 10,5% dos doentes internados no país eram diagnosticados com uma infeção, contra uma média de 6,1% na EU. O mesmo estudo apurou que quase metade dos doentes internados (45,3%) foram em algum momento medicados como antibióticos, enquanto na UE a média é 35,8%.
No que diz respeito aos antibióticos, dados europeus sugerem que, em 2012, Portugal era o nono país onde as pessoas tomavam mais antibióticos, acima da média europeia. Desde então, a situação tem vindo a evoluir favoravelmente. O consumo de quilononas, que tem estado a baixar, chegou a ser o sexto mais elevado da Europa.
Também nos hospitais se verificava o consumo excessivo de alguns tipos de antibióticos. Em 2011, Portugal era o país europeu no qual se usavam mais carbapenemos – antibióticos de largo espetro indicados para infeções graves – sendo essa utilização superior ao triplo da média europeia.
O que fazer para prevenir?
A proposta das diferentes autoridades é um uso racional dos antibióticos, “não os utilizando quando não são necessários e utilizando, quando estritamente indicados, os antibióticos de espetro mais estreito possível e apenas durante o tempo necessário.”
Em novembro do passado, a propósito do Dia Europeu dos Antibióticos, a Comissão Europeia divulgou um vídeo informativo para alertar para a problemática da resistência aos antimicrobianos. Algumas das lacunas apontadas nesta campanha era o facto de 57 % dos europeus não saberem que os antibióticos são ineficazes contra os vírus e 44% desconhecerem também que são ineficazes contra as constipações e gripe. Um eurobarómetro em abril de 2016 revelou que, em matéria de informação, Portugal ainda era um dos países que surgia pior na fotografia, embora tenha havido melhorias face a estudos anteriores. Mais de metade dos portugueses inquiridos achavam que os antibióticos funcionam no tratamento de constipações e gripe e só 38% deram a resposta certa. Na Finlândia, Holanda e Suécia, perto de 80% da população está corretamente informada.