Governar a curto prazo

Aprioridade do Governo de A. Costa é clara: cumprir as metas de Bruxelas. Atingiu esse objetivo, o que melhora a posição de Portugal no mercado da dívida pública; e ajuda o potencial investidor estrangeiro a ganhar confiança no país.

Surpreende esta prioridade num executivo apoiado no Parlamento por dois partidos de extrema-esquerda, o PCP e o Bloco de Esquerda, que detestam a integração europeia. A habilidade de A. Costa conseguiu o que parecia impossível.

Mas esse apoio parlamentar tem um custo: trava a indispensável reforma do Estado. Essa reforma não foi feita pelo Governo PSD/CDS. Por isso a considerável redução do défice orçamental (de 11% do PIB para 4%) que o executivo de Passos concretizou ficou a dever-se, em boa parte, a a3umento de impostos.

Já a descida desse défice no Governo de A. Costa resultou sobretudo de cortes na despesa pública. Parece positivo, mas faltou a tal reforma da Administração pública, que tornasse sustentáveis aqueles cortes. 

São visíveis no Estado serviços que não funcionam ou funcionam muito mal. É uma realidade reconhecida por um independente da bancada parlamentar do PS, o Prof. Paulo Trigo Pereira.   

Escreveu ele num artigo no Público: «Houve nos últimos anos uma deterioração na qualidade dos serviços públicos. Os cortes na cultura foram significativos e os respetivos orçamentos são irrisórios. A função reguladora do Estado está diminuída, pelas carências de recursos humanos nas inspeções gerais. A investigação criminal está assoberbada e carenciada por falta de inspetores na Polícia Judiciária. Na saúde, para além das dívidas dos hospitais, há carência de anestesistas, sem os quais as listas de espera das cirurgias aumentam. Apesar de algum aumento nos médicos e pessoal de enfermagem em 2016, as carências são ainda manifestas». 

Poderia acrescentar-se que existem autoestradas com portagem (Aveiro-Vilar Formoso, por exemplo) cujo piso está degradado e perigoso. Ou que muitos carros da PSP permanecem avariados, obrigando os agentes a deslocarem-se de autocarro para situações de emergência…

E há serviços públicos onde o pessoal tem pouco que fazer – porque não há dinheiro. É um desperdício, porque essas pessoas são pagas para quase nada produzirem, o que além do mais promove um clima de desmoralização. 
Mas o BE e sobretudo o PCP opõem-se a reformas no Estado. Toleram o europeísmo de A. Costa, mas não que se toque nos funcionários públicos, mudando-os de serviço, por exemplo.
 
O Governo ganhou popularidade cumprindo os compromissos que foram a contrapartida do apoio da extrema-esquerda, nomeadamente a rápida reversão nos cortes dos pensionistas e dos funcionários públicos. Essa reversão estimulou o consumo e a atividade económica, mas a insistência governamental na propaganda do ‘fim da austeridade’ teve efeitos perversos.

Muita gente se convenceu de que tínhamos entrado numa ‘idade de ouro’: a poupança das famílias, que já era diminuta, tornou-se negativa. Escreveu recentemente o Prof. Vital Moreira no seu blog: «A recuperação da confiança na economia e os juros baixos justificam o disparo no consumo. Mas num país que não tem capital e precisa de investir, uma taxa de poupança negativa não é um bom augúrio. E a era dos juros baixos não dura sempre!».

É uma ilusão governar apenas para o curto prazo.