Os portugueses vão votar, no próximo dia 1 de outubro, para eleger os presidentes de 3092 juntas de freguesias. A realidade das juntas de freguesia tem vindo a alterar-se nos últimos anos no sentido de ganharem mais poderes e a reforma da descentralização, que por falta de consenso entre PS e PSD não avançou antes das autárquicas, prevê reforçar as competências próprias relacionadas com a gestão dos “espaços do cidadão, em articulação com a rede nacional de Lojas do Cidadão e com os municípios”, a gestão de espaços verdes ou a “realização de pequenas reparações nos estabelecimentos de educação pré-escolar e do primeiro ciclo do ensino básico”.
O presidente da Associação Nacional de Freguesias (ANAFRE) está convicto de que os portugueses têm “a expectativa de que existam mais competências e mais recursos” para as juntas de freguesia. Pedro Cegonha lamenta, porém, que o aumento de competências não corresponda ao aumento de verbas para as juntas de freguesia (ver abaixo).
As juntas receberam, este ano, mais de 190 milhões de euros através do Fundo de Financiamento de Freguesias. As verbas dadas pelo Estado dependem de fatores como a população ou a área da freguesia e existem diferentes realidades. Há juntas que recebem mais de 400 mil euros e outras pouco mais de 15 mil. Entre as freguesias que mais recebem estão a União de Freguesias de Cedofeita, Santo Ildefonso, Sé, Miragaia, São Nicolau e Vitória, no concelho do Porto, com mais de 495 mil euros e a União das Freguesias de Cascais e Estoril com mais de 460 mil euros. A União das freguesias de Alcácer do Sal e Santa Susana e a União das freguesias de Oeiras e São Julião da Barra, Paço de Arcos e Caxias também recebem verbas do Estado superiores a 400 mil euros.
Os números são diferentes em freguesias de menor dimensão como Vale da Madre, no concelho de Mogadouro, ou Aldeia do Bispo, na Guarda, que recebem pouco mais de 15 mil euros do orçamento do Estado. “Temos de ter em conta que há juntas de freguesia que recebem menos de 30 mil euros do Fundo de Financiamento de Freguesias e não têm funcionários”, diz o presidente da ANAFRE, alertando que o aumento de competências tem de ser acompanhado por mais recursos. Para além deste dinheiro, as juntas têm também recursos transferidos pelas câmaras municipais. E essas podem aumentar o orçamento, consoante a delegação de competências das respetivas câmaras. Em Lisboa, desde a reorganização administrativa de 2012, as juntas passaram a ter mais competências, daí que a verba que recebem seja substancialmente maior.
Ordenados nas juntas Os presidentes das juntas de freguesia podem exercer o mandato em exclusividade ou a meio tempo. Nas freguesias com mais de dez mil eleitores os mandatos podem ser exercidos a tempo inteiro. Os autarcas que estão em exclusivo ganham entre 1200 e 1900 euros, mais despesas de representação. Nas juntas que têm entre cinco mil e dez mil eleitores os presidentes podem exercer o cargo a meio tempo e recebem metade da remuneração.
Pedro Cegonho, Presidente da Associação Nacional de Freguesias: “Os portugueses querem que as juntas de freguesia tenham mais competências e mais recursos”
Está satisfeito com os poderes que têm atualmente as juntas de freguesia?
As juntas de freguesia têm uma realidade muito diversa. São um mosaico muito heterogéneo no país. Devemos aproveitar essa riqueza para os poderes públicos estarem próximos das pessoas. Sou contra a tentativa de criar fatos à medida e tornar as freguesias iguais em todo o país. Isso não respeita a diversidade do território.
As juntas de freguesia deviam ter mais competências?
Há aqui três tipologias de competências. Existem competências próprias que são aquelas que a lei atribui diretamente à freguesia e a freguesia gere essas competências e gere as suas prioridades. Depois existem um conjunto de competências que a lei designa por competências legalmente delegáveis e essas implicam que exista, em cada mandato, um acordo de execução entre as freguesias e o município para que essas competências possam ser efetivamente exercidas pelas freguesias. Nós temos apontado algumas dificuldades a este modelo. O que defendemos é que essas competências sejam competências próprias das freguesias e, portanto, exercidas no mesmo regime que aquelas que estão determinadas na lei e que têm recursos do fundo de financiamento das freguesias.
As verbas têm acompanhado o aumento das competências?
Não. Temos assistido ao crescimento do número de competências que estão atribuídas às freguesias e as verbas não correspondem a essas novas competências. Vou-lhe dar um exemplo: as juntas ficaram com a competência de manter e atualizar o cadastro dos bens móveis e imóveis da freguesia. Isto é uma competência que é natural, mas não podemos esquecer que têm de haver recursos que permitam cumprir estas normas. As freguesias têm ganho competências na área da ação social, desporto, colocar placas toponímicas… São tudo competências novas. Podem parecer pequenas, mas temos de ter em conta que há freguesias que recebem 30 mil euros por ano do fundo de financiamento das freguesias e que não têm funcionários.
Julga que os portugueses gostariam que as freguesias tivessem mais poderes?
A população tem como primeiro interlocutor o seu presidente de junta. O presidente de junta tem também o papel de ser o interlocutor dos legítimos desejos da população junto do município e junto do Estado central. Se olharmos para as freguesias, a seguir ao 25 de abril, encontramos meras entidades administrativas em que, se calhar, a grande competência era passar o atestado de residência. Hoje já é muito normal, na esmagadora maioria do território, as pessoas olharem para a freguesia como entidades que têm a responsabilidade de fazer a manutenção do espaço público, a responsabilidade de fazer a manutenção do espaços verdes, a intervenção no jardim de infância ou no primeiro ciclo, que é a escola mais próxima das populações. É a forma como as populações olham para as freguesias que também nos leva a tirar conclusão de que as pessoas têm a expectativa de que existam mais competências e mais recursos nas juntas de freguesia, porque é o órgão que está mais próximo. É natural que tenham a expectativa de não ter de ficar à espera do município, porque se a junta pode agir de imediato.