O ex-marido da jornalista e advogada Inês Serra Lopes contou ao Ministério Público (MP), no âmbito das investigações da Operação Marquês, que José Sócrates estaria por detrás da recuperação da revista “Grande Reportagem”, avançando com o apoio financeiro para a reedição desta publicação.
Alexandre Ferreira, que, na altura dos factos vivia com Serra Lopes, contou aos investigadores que chegou a participar em jantares onde se encontrava Carlos Santos Silva, o empresário que o MP suspeita que seja o testa-de-ferro do antigo primeiro-ministro.
No primeiro jantar, a ex-jornalista falou sobre a sua vontade de ressuscitar a “Grande Reportagem”. Santos Silva mostrou-se interessado no projeto, mas afirmou que teria de falar com o seu “superior” para saber se seria possível apoiar esta iniciativa. Num segundo jantar, o empresário revelou que tinha tido “luz verde” dessa pessoa, cuja identidade nunca foi revelada.
Durante o interrogatório, Alexandre Ferreira disse ainda aos investigadores que Inês Serra Lopes reportava o trabalho desenvolvido a Carlos Santos Silva, mas que ficou com a sensação de que a pessoa que teria dado o aval para avançar com o apoio deste projeto era José Sócrates.
A jornalista foi assim apresentada ao sócio de Santos Silva, Rui Mão de Ferro, também arguido na Operação Marquês. Inês Serra Lopes recebia um pagamento mensal de cinco mil euros para tratar da recuperação da revista. De acordo com o depoimento do seu ex-marido, eram combinados encontros entre Serra Lopes e Mão de Ferro, onde este último fazia os pagamentos devidos, em numerário. Alexandre Ferreira contou aos investigadores que esses encontros chegaram mesmo a acontecer em casa de Rui Mão de Ferro, no Belas Clube de Campo.
Jornalista pediu “colinho” a Vara
As escutas recolhidas aquando da investigação do processo Face Oculta mostram que Inês Serra Lopes chegou a fazer queixas ao também arguido na Operação Marquês, Armando Vara, sobre a forma como a recuperação da “Grande Reportagem” estava a decorrer.
Em junho de 2009, Serra Lopes diz a Vara que já adjudicou, com a cobertura financeira de Carlos Santos Silva, alguns aspetos da produção da revista, como a contratação do projeto gráfico. No entanto, acabou por ser desautorizada por Francisco Santos (responsável do setor de comunicação social do grupo Lena), que lhe respondeu que conseguiria tudo por melhor preço. “O Francisco ligou-me agora e disse: ‘Gráficas, distribuição, esqueça, eu trato de tudo, arranjo preços mais baratos’”. A jornalista mostrou-se “aflita” com o que se estava a passar, pois já se tinha comprometido com outras pessoas, ao que Vara sugere que Francisco Santos fale com as pessoas com as quais ela se comprometeu, “e que tente encontrar uma solução para isso”.
A certa altura, Armando Vara pergunta diretamente o que a jornalista pretende dele, e Serra Lopes responde que quer “colinho”: “Saber se o contrato [para aquisição do nome da revista] já foi assinado ou não, se o título já é nosso ou não”. Vara tranquiliza-se e informa-a de que já teve uma reunião com Carlos Santos Silva e com Joaquim Oliveira, antigo presidente da Controlinveste: “Ficou tudo tratado, os negócios ficaram tratados, é só formalizar”.
Em 2010, Carlos Santos Silva informou Serra Lopes de que a recuperação da “Grande Reportagem” afinal não iria avançar. De acordo com o depoimento de Alexandre Ferreira, já não havia “interesse no desenvolvimento do projeto”.
A jornalista integrou depois os quadros do “i” – que pertencia então ao grupo Lena, com o qual Sócrates tinha boas relações –, chegando a grande repórter, mas saiu pouco tempo depois. Em seguida, prestou serviços de assessoria ao Banco Espírito Santo, do arguido Ricardo Salgado, e a Armando Vara.