O anúncio foi feito pelo ministro da Saúde na discussão do Orçamento do Estado no ano passado. Depois de críticas sobre a falta de investimento no SNS nos anos da troika, e dado o crescendo de aparelhos obsoletos nos hospitais públicos, seria lançado um plano de reequipamento tecnológico do SNS, para o período de 2017 a 2019, com calendário definido, verbas públicas e fundos comunitários.
Ao longo dos últimos meses o SOL questionou várias vezes a tutela sobre quando seria apresentado este plano e quais as verbas necessárias para cada ano deste triénio. Fonte do Ministério da Saúde esclareceu ontem que o plano está em curso e não será objeto de uma apresentação mais ampla. Isto porque no portal do SNS existe já uma página de divulgação onde estão elencados os investimentos para o período de 2017 a 2019. Nesta página há cerca de três rubricas para cada hospital público, onde surgem referenciadas diferentes obras ou aquisições de equipamentos e o ano previsto. Ontem, porém, o espaço reservado para mais detalhes sobre cada iniciativa surgia sempre com a indicação «em atualização».
A definição do plano passou por uma recolha das prioridades de investimento em cada unidade que começou logo após o anúncio de Adalberto Campos Fernandes no Parlamento. Segundo a mesma fonte ministerial, este ano está previsto em sede de Orçamento do Estado um investimento de 110 milhões de euros. A esta verba acrescem fundos comunitários na casa dos 200 milhões de euros no âmbito da modernização administrativa e energética, que começarão a ser executados ainda este ano mas que terão o pico da sua utilização em 2018.
Têm vindo a ser anunciadas algumas intervenções que fazem parte do plano em curso, que o SOL sabe que inclui cerca de 700 intervenções planeadas até ao final da legislatura (2019), não só nos hospitais mas também nos cuidados primários e continuados. Está por exemplo projetada a abertura de 80 novos centros e extensões de saúde e cerca de 700 camas de cuidados continuados/ano.
Bastonário preocupado
Já esta semana, em Diário da República, foram publicadas algumas autorizações de despesas plurianuais. Saúde e Finanças deram luz verde, por exemplo, ao Centro Hospitalar do Oeste para assumir um encargo de 295 mil euros por um período de dois anos para comprar e implementar um novo sistema de arquivo de imagens médicas, visualizador, e um portal de prescrição de exames e análises. Já o Centro Hospitalar de Lisboa recebeu autorização para uma despesa de 620 mil euros nos próximos três anos com a central térmica do Hospital de São José. Outros investimentos vêm sendo anunciados na portal do SNS ou pelas unidades. Este verão, foi noticiada a compra de um TAC para o serviço de imagiologia do Hospital de Vila Real. Já o Centro Hospitalar Médio Tejo anunciou que vai instalar também um novo aparelho TAC até ao final do ano.
Não obstante os anúncios, no que toca a investimentos em equipamento, a perceção no setor é que ainda estão aquém do desejável. Miguel Guimarães, bastonário dos Médicos, disse ao SOL não ter conhecimento em detalhe do plano de reequipamento tecnológico anunciado pela tutela. A Ordem decidiu mesmo avançar com um levantamento de necessidades em termos de médicos e equipamentos pesados em cada unidade, análises que ficarão concluídas até ao final do ano. «A perceção que temos é a de que existe uma resolução pontual dos constrangimentos sobretudo quando há maior pressão. Se for público que uma unidade tem uma TAC avariada, provavelmente passa a ser prioritária para o Governo», diz o bastonário. Guimarães avisa que é necessário um maior ritmo de investimento para resolver as desigualdades entre instituições. E dá um exemplo: «Hoje não temos os equipamentos de radioterapia dos hospitais a funcionar todos no mesmo nível. Temos aparelhos de nova geração por exemplo no IPO do Porto, o que não acontece no Hospital de São João. A eficácia pode ser idêntica, mas os efeitos colaterais dos aceleradores de nova geração são menores, pois emitem menos radiação».
Queixas no setor
Manuel Duarte Lobo, presidente da Associação Portuguesa de Imagiologia Médica e Radioterapia, diz não ter conhecimento de «qualquer plano concreto de renovação dos equipamentos imagiológicos do SNS», embora reconheça que nos últimos anos houve aquisições esporádicas.
«Estes equipamentos, apesar de virem melhorar as condições para a execução de exames imagiológicos, continuam a ser manifestamente insuficientes para suprir as necessidades atuais, agravadas pela escassez destes profissionais no SNS e pela crescente procura destes exames», considera. Manuel Duarte Lobo adianta que têm chegado ao conhecimento da associação situações de salas de exames que ficam paradas «bastante tempo» devido a avarias, isto enquanto se aguarda orçamento e ordem de reparação. Entretanto, os doentes aguardam ou acabam por ter de recorrer ao setor convencionado. Problemas que não são de agora, admite, e que se acentuaram com a chegada a troika em 2011.
Alexandre Lourenço, presidente da Associação Portuguesa de Administradores Hospitalares, reconhece também que têm havido alguns investimentos, mas aquém do necessário. «Continuamos a ter mais equipamentos a aproximarem-se da obsolescência, isto ao mesmo tempo que o financiamento operacional das unidades vem sendo reduzido, porque existem mais encargos a suportar, nomeadamente a atualização de salários». Para o representante dos gestores hospitalares, os constrangimentos acabam por interligar-se e agravam-se com a pouca autonomia das unidades para tomarem decisões, centralizadas nos Ministérios da Saúde e das Finanças.
Expectativas para 2018
«Os hospitais, quer as Finanças queiram ou não, são o expoente máximo na administração pública em complexidade de recursos humanos e de equipamentos. Apesar de haver recuperação económica, o que vemos é que isso não se tem estado a repercutir nos hospitais, o que causa uma enorme frustração nas administrações, que sentem maior pressão dos fornecedores e necessidades diárias de investimento», acrescentou Lourenço.
A expectativa para o próximo ano é que o SNS consiga um orçamento «mais equilibrado». Em 2017, por exemplo, o OE já partia do pressuposto de que o ano terminará com um défice de 248 milhões de euros. Escassez de receitas, diz Alexandre Lourenço, que acaba por refletir-se no aumento das dívidas a fornecedores. Segundo a última síntese de execução orçamental, os pagamentos em atraso no SNS totalizavam em julho 852 milhões de euros, mais 177 ME do que em julho do ano passado.