A União Europeia com que Jean-Claude Juncker sonha não está muito distante do quinto cenário do livro branco, por si proposto em março deste ano – “os países da UE decidem fazer muito mais, em conjunto e em todos os domínios de intervenção” –, mas ainda assim o presidente da Comissão Europeia faz questão de o catalogar como o seu próprio e exclusivo “sexto cenário”.
Seis meses volvidos desse documento de tom nitidamente pessimista, Juncker aproveitou o solene discurso do Estado da União para apregoar a sua visão sobre o futuro da organização, alicerçada em metas ambiciosas e num aprofundamento nunca visto da integração europeia, na ressaca de “um ano que fez estremecer todas as suas fundações” – com o Brexit, a crise migratória e o crescimento da extrema-direita populista à cabeça, enquanto desafios ao establishment político, económico e social europeu.
Entre as várias propostas apresentadas ontem ao Parlamento Europeu, em Estrasburgo, o principal destaque vai para o desejo do luxemburguês em agregar todos os Estados-membros na zona euro, no espaço Schengen de livre circulação, e na união bancária, que permanece por completar. Para tão hercúlea tarefa – apenas 19 dos ainda 28 membros da UE aderiram à moeda única e há vários casos de países que rejeitaram o euro – Juncker promete mecanismos de ajuda técnica e financeira, e propõe a criação de um cargo de superministro das Finanças, que possa zelar pelos interesses económicos da União como um todo. “Precisamos de um ministro europeu da Economia e Finanças, alguém que acompanhe as reformas estruturais nos nossos Estados-membros [e que] pode apoiar-se no trabalho levado a cabo pela Comissão desde 2015, no quadro do seu serviço de apoio à reforma estrutural”, sublinhou Juncker.
O principal objetivo das reformas, garantiu o presidente da Comissão, é diminuir a largura do fosso, de desenvolvimento e prosperidade, existente entre os membros da União Europeia – tanto entre leste e oeste, como entre norte e sul – e colocar todo o bloco numa única e expedita velocidade.
Juncker quer que estas metas sejam colocadas por escrito num novo acordo político, ambicioso, de criação de uma Europa “mais unida, mais forte e mais democrática”, no dia seguinte ao abandono do Reino Unido da União, no final de março de 2019. A implementação integral das disposições do mesmo, ambiciona Juncker, ficaria para 2025.
Os acordos comerciais com japoneses, canadianos, mexicanos, sul-americanos, australianos e neo-zelandeses foram igualmente referidos por Juncker, para além dos planos de alargamento da UE aos Balcãs.
Avisos e sugestões
O discurso de Juncker serviu igualmente para enviar uma série de recados para dentro e fora da União. O luxemburguês lamentou a decisão britânica de sair da UE, mas garantiu que “o Brexit não é tudo, nem é o futuro da Europa” e que, por isso, “há que avançar”.
Relativamente às derivas autoritárias verificadas recentemente em Estados-membros como a Polónia ou a Hungria, Juncker lembrou que “na Europa impera a força da lei e não a lei do mais forte” e que “o Estado de Direito não é uma opção”, mas “uma obrigação”. “Há que respeitar as instituições judiciais”, afirmou.
Juncker apontou ainda baterias à Turquia, a quem recordou que “os jornalistas devem estar nas redações, não nas prisões” e ainda apelou à moderação. “Não podemos tolerar que líderes turcos chamem aos nossos primeiros-ministros nazis e fascistas”, lamentou o presidente da Comissão Europeia.