Dias e dias a fio com várias aldeias a arder, a morte de 64 pessoas no incêndio de Pedrógão Grande, desorganização no socorro às populações, relatórios atrás de relatórios revelando várias responsabilidades. Tudo isto que aconteceu nos últimos meses, quando arderam largos milhares de hectares no país, não foram suficientes para a saída de qualquer responsável da Proteção Civil – uma das entidades responsáveis pelo combate aos incêndios e outras situações de risco.
A primeira baixa veio, sim, ontem, depois de se saber que o Comandante Operacional Nacional da Autoridade Nacional de Proteção Civil, Rui Esteves, concluiu a sua licenciatura tendo, na esmagadora maioria das disciplinas, equivalências por experiência profissional.
De acordo com o seu processo académico, consultado pelo Público, em 36 disciplinas da licenciatura em Proteção Civil do Instituto Politécnico de Castelo Branco, Rui Esteves fez apenas quatro, através de exames. Às restantes 32 disciplinas foram concedidas equivalências por experiência profissional e foi ainda tido em conta cursos de formação realizados pelo número dois da Proteção Civil em Portugal e no estrangeiro, segundo o Público.
Rui Esteves foi admitido na Escola Superior Agrária do IPCB em 2006, era há um ano comandante distrital em Castelo Branco. De acordo com o Público, em 2006/2007 foi-lhe concedido equivalências a quatro disciplinas. No ano seguinte, em 2007/2008 a outras nove disciplinas, a 17 em 2008/2009 e outras duas em 2008/2009.
Concluído o curso em 2011, Rui Esteves deu, posteriormente, formação aos alunos da licenciatura de Proteção Civil. Mais. A sua licenciatura teve peso na sua nomeação para Comandante Operacional Nacional, de acordo com o despacho da ministra da Administração Interna com data de janeiro de 2017.
Com as notícias vindas a público o presidente do Instituto Politécnico de Castelo Branco, Carlos Maia, disse ao i que não tinha conhecimento deste caso. O responsável pelo politécnico desde 2009 decidiu enviar o processo académico de Rui Esteves para a Inspeção Geral da Educação para que seja passado a pente fino. A decisão de Carlos Maia colheu o apoio do ministro do Ensino Superior, Manuel Heitor.
Minutos mais tarde, o gabinete de Constança Urbano de Sousa, fez saber que Rui Esteves pediu ontem a demissão, sendo substituído interinamente pelo atual segundo comandante operacional nacional, tenente coronel Albino Tavares.
O caso de Rui Esteves tem várias semelhanças com o caso da licenciatura de Miguel Relvas. Também o ex-ministro teve equivalências a 32 disciplinas da licenciatura em Ciência Política e Relações Internacionais, da Universidade Lusófona, pela experiência profissional. Realizou apenas quatro disciplinas e depois de o caso ter ido parar a tribunal, que declarou nula a sua licenciatura, Miguel Relvas acabou por regressar este ano aos bancos da faculdade e concluiu o curso.
É em 2006 a lei permitia a atribuição de equivalências por experiência profissional às licenciaturas, sem qualquer limite. Só em 2013, após o caso Relvas, o então ministro da Educação e do Ensino Superior, Nuno Crato, fez uma revisão à lei de bases do sistema educativo, para alterar as normas da atribuição de equivalências por experiência profissional. Hoje o limite máximo para as equivalências por experiência profissional num curso superior é de 30% do total das disciplinas.
Rui Esteves é ainda alvo de um processo disciplinar do MAI depois de uma notícia da RTP que revelou que o comandante estava ilegal no cargo da Proteção Civil desde que foi nomeado, em janeiro, por acumular a função de diretor do aeródromo de Castelo Branco.