Marine Le Pen pôs um ponto final nas disputas que vinham paralisando a Frente Nacional desde as eleições e afastou Florian Philippot do partido, cortando com o homem que era simultaneamente o seu número dois e co-autor da política de despoluição que normalizou o antigo partido de Jean-Marie Le Pen.
A líder do partido nacionalista já vinha exigindo há semanas a demissão do seu vice-presidente, mas a decisão foi tomada apenas quarta, dia em que Le Pen comunicou a Philippot que, dali em diante, seria “vice de nada”. O responsável tomou a deixa e anunciou esta quinta-feira que se demitia.
“Não estou para ser ridicularizado, não estou para não ter nada para fazer; por isso, sim, é claro, demito-me da Frente Nacional”, afirmou à France 2, depois de o ter já anunciado no facebook. Com ele partem Sophie Montel, por exemplo, e alguns outros responsáveis próximos de Philippot e do grupo “Os Patriotas” que o ex-vice-presidente criou nas últimas semanas e mais alimentou a ideia de que tentava criar concorrência direta a Le Pen.
Mas não há êxodo do partido nacionalista e as poucas partidas não se devem avolumar nos próximos dias.
Não é a primeira vez, para além disso, que a Frente Nacional atravessa um corte de relações ao mais alto nível. Marine afastou o próprio pai, Jean-Marie, em 2015, como parte do esforço de desanuviar o rosto do partido das conotações mais antissemitas e diretamente ligadas aos partidos racistas e xenófobos europeus. E antes disso, Bruno Megret já havia cortado com Jean-Marie, em 1988, sem, no entanto, ter sido capaz de criar um movimento concorrente e abalar o partido mãe.
Le Pen recordava-o esta quinta-feira, ao dizer ao canal LCP que “as pessoas devem parar de preparar o enterro da Frente Nacional”. A líder da formação da extrema-direita, além disso, acusou Philippot de ser um intelectual arrogante e incapaz de modificar as posições.
“Uma pessoa tem que ser capaz de aceitar a crítica e tenho a impressão de que Florian não queria participar nesse debate”, argumentou. O seu companheiro e também militante da Frente Nacional, Louis Aliot, reforçou mais tarde esse mesmo ponto. A Frente Nacional, disse, “pode finalmente regressar à calma tendo acabado de enfrentar um extremista sectário, arrogante e egocêntrico que tentava limitar a nossa liberdade.”
Líder a sós
A relação entre Le Pen e Philippot terminou com os resultados inesperadamente negativos do partido de extrema-direita nas eleições parlamentares.
Depois de conquistar apenas um terço dos votos nas presidenciais contra Emmanuel Macron, a Frente Nacional caiu ainda mais nas urnas e recebeu os votos de apenas 9% do eleitorado francês. Elegeu somente oito deputados de entre 577 e viu-se forçada a desistir de uma representação de peso, como parecia praticamente inevitável no início do ano, quando Marine Le Pen ainda era a líder as sondagens da primeira volta.
Philippot, que desenhou a estratégia de campanha e concebeu as promessas de corte com a Europa e o euro – desviando-se das definidoras políticas de identidade e anti-islão, por exemplo – tornou-se o culpado consensual para o partido.
Desembaraçada do homem de quem apenas no ano passado dizia ter um “fraquinho intelectual”, Marine Le Pen vê-se agora livre para reconduzir o partido para as águas das políticas de identidade, deixando pelo caminho as propostas económicas de cariz socialista que Philippot transportou para o programa da extrema-direita – e que, de qualquer das formas, estão por estes dias no campo natural dos sindicatos e do partido de Jean-Luc Mélenchon, a France Insoumisse.
Esta quinta-feira, aliás, foi dia de novos protestos tíbios contra a reforma do trabalho de Macron, que só reuniram alguns milhares de pessoas em várias cidades francesas, numa greve e protesto convocada pela CGT, a única central sindical nas ruas.
Mélenchon, por sua vez, não conseguia conter o ânimo pela crise na Frente Nacional. “É perfeito”, dizia à rádio RTL. “É um partido que não conta para nada.”