Na época não existiam redes sociais, embora a internet já fosse uma realidade. Os jornais eram aguardados com alguma inquietação pelos governantes que temiam serem apanhados nalguma situação menos clara. Por serem acusados de, alegadamente, não terem pago o imposto de sisa, relativamente à compra de imóveis, alguns ministros demitiram-se: Eram os célebres anos das manchetes de O Independente na década de 90, e Miguel Cadilhe, Murteira Nabo e António Vitorino acabaram por largar a vida política depois da denúncia da compra das casas. Naquele tempo, pelos vistos, os governantes preocupavam-se com o que se escrevia e, em alguns casos, como foi o de Braga de Macedo, as notícias até nem eram verdadeiras. Tantos anos depois, o presidente da Câmara de Lisboa comprou uma casa por menos 200 mil euros que a proprietária a tinha adquirido dez anos antes, e são poucos os que estranham o negócio. Para mais, a vendedora faz parte da família Teixeira Duarte, irmã e prima direita de um diretor e do CEO, que tem negócios privilegiados com a autarquia lisboeta.
Para os mais desatentos, a Câmara de Lisboa, depois de Fernando Medina ter adquirido o imóvel, fez negócios por ajuste direto de mais de cinco milhões com a construtora em causa. Como aperitivo da história, o presidente da Câmara apenas tinha entregue no Tribunal Constitucional uma declaração com o valor da entrada do andar. Só esta semana, depois de muitas notícias, é que atualizou a mesma. Será que é assim tão estranho querer esclarecimentos do homem que tem feito da capital um estaleiro a céu aberto, que ficará muito bem no final, é certo, para os turistas? Ninguém duvida que Medina já ganhou as eleições do próximo dia 1 de outubro, pois apesar de todas as redes sociais, o presidente da Câmara não tem sido questionado pelos seus pares e o povo está mais distraído com outros futebóis.
Portugal orgulha-se de estar a apanhar o pelotão da frente da Europa civilizada, apesar dos atrasos económicos, mas olhando para esta história, algum presidente de Câmara da Suécia ou da Alemanha, por exemplo, poderia manter-se no cargo sem dar explicações adicionais?
Não creio que tal fosse possível, pois alguém que compra uma casa, em tempo de loucura imobiliária, por menos 200 mil euros do que tinha custado há 10 anos à atual vendedora, teria, naturalmente, de não deixar qualquer dúvida no assunto. A não ser que se viva em Portugal…