ENQUANTO em Portugal a vida pública for aquilo que hoje é, só por milagre conseguirá vencer eleições quem quer que se atreva a defrontar António Costa (AC) – o político que os media portugueses sempre favoreceram e protegeram, faça ele o que fizer e falhe quantas vezes falhar.
Não se sabe bem o que está por detrás de tão descarada falta de isenção, nem há forma de entender se a preferência com que AC é liminarmente tratado pela maioria dos media tem a ver com uma pretensa superioridade que nele descubra quem é suposto informar com veracidade e opinar com a máxima liberdade, ou se isso resulta somente de um tique corporativista, por se tratar de alguém que é filho e irmão de dois jornalistas famosos.
Tão pouco é possível compreender se a vassalagem que a SIC durante anos lhe prestou dependia da influência de que o seu irmão gozava na Impresa, se das vantagens que esta porventura prenunciava para a hipótese de AC vir a ser primeiro-ministro, pois nesse caso sentir-se-ia talvez com direito a recompensas ou contrapartidas (em política ‘não há almoços grátis’…) pelos amplos favores mediáticos que desde cedo lhe concedera.
SEJA QUAL FOR o caso, não parece ser fácil nem confortável a situação em que Ricardo Costa (RC) ficou, como jornalista e comentador televisivo – e ainda mais como director do Expresso –, desde que AC, não contente já com a presidência da CML, pôs a sua enorme ambição e energia ao serviço do desregrado assalto aos cargos de maior poder político nacional – isto no pressuposto de que RC é um homem sério e profissional íntegro que apenas anseia poder voltar a não ter de sentir insuportáveis constrangimentos face ao actual líder do PS e primeiro-ministro –, pois muito do que esse semanário actualmente publica ou omite, no plano do combate partidário, passou a ser interpretável como sinal da intenção de favorecer este político.
ALIÁS, num país e num universo mediático como os que temos, o que surpreende é que alguém que é da corporação e simpatizante do PS (no caso, Clara Ferreira Alves) tenha ousado pronunciar em público (Eixo do Mal) uma crítica frontal ao facto de AC ter permanecido no painel da Quadratura do Círculo até tão tarde.
Com efeito, muita gente viu como manifestação de falta de ética e desrespeito pelos portugueses que, semanalmente e durante anos, ele se tivesse permitido (com a conivência ou condescendência da SIC) usar como tempo de antena pessoal o programa de comentário e debate político mais influente do país quando já presidia à Câmara de Lisboa, e sendo, como era, alguém que não poderia nunca comentar a actualidade política nacional com o distanciamento e a isenção exigíveis num palco como aquele.
PORÉM, e apesar de essas circunstâncias serem eticamente obscenas, é bem provável que muitos portugueses nem sequer se hajam dado conta do embuste que representava aquilo que este personagem – o mais habilidoso perito nacional em propaganda política e manipulação comunicacional – tinha a propor para solução dos gravíssimos problemas do país.