Começou primeiro o jogo de Alvalade.Ora batatas! Também não era difícil: alguém se lembra de mandar jogar equipas lá na Ilha da Madeira às nove e meia da noite? Só mesmo a (des)organização de um edifício futebolístico que faz cada vez menos para que o jogo continue tão popular como o foi até aqui.
Adiante. Se alguém esperava um leão mandão e um dragão nas escolhas, metido nas suas tamanquinhas, lançando labaredas em contra-ataque, daquela forma magnífica como despachou o Mónaco, lá no Principado dos Grimaldi, com perna e meia às costas, pôde tirar o cavalinho da chuva. Sérgio Conceição pode não ser um sábio – a sabedoria só chega, quando chega, em fases mais adiantadas da vida – mas é sagaz até à protérvia: vai daí, não desperdiçou a vantagem psicológica que os triunfos recentes lhe proporcionaram e pôs o FC Porto a mandar nos acontecimentos.
Assim sendo, durante toda a primeira parte houve bem mais vontade e força nas risquinhas azuis-e-brancas do que nas risquinhas verdes-e-brancas.
Restava saber também que nível de desgaste cada uma das equipas tinha sofrido na jornada europeia. Por mim, vamos e venhamos: enquanto o ritmo do jogo lá na França foi vivo e interessante, em Lisboa tinha sido um bocadinho mais em passeio, digamos assim, até porque é esse o estilo do Barcelona há muito anos a esta parte, enredando e entretendo os adversários naquela teia de aranha do passa e repassa que provoca aneurismas a qualquer um, para utilizar a expressão do divino Eça na boca do Alencar, de “Os Maias”.
Para pior. Pela maneira como a segunda parte foi decorrendo, cada vez mais confusas que foram as decisões, cada vez com mais lances mal decididos, caindo a pique a qualidade do espetáculo, podia chegar-se à conclusão que o desgaste de ambos era um facto indesmentível. Mas que, também, e ao mesmo tempo, o resultado começava a ser interessante tanto para os lisboetas como para os portuenses. Estamos numa altura do campeonato na qual se torna fundamental não dar espaço para que os da frente possam arrancar para sprints que, muitas vezes, se tornam avassaladores. Jogava o Sporting em casa e, por isso, deveria exigir de si próprio um quartilho mais do que o litro que estava a dar? Aceitemos que sim. Seria essa atitude absolutamente indispensável? Aceitemos que não.
Facto: Jesus mudou melhor do que Sérgio. Com as primeiras mexidas, o leão ficou melhor, pior o dragão.
Outro facto: continuou o FC Porto a estar mais perto do golo.
Evidência: terão saído os dois contentes de campo por se manterem invencíveis num campeonato que parece estar destinado a ser decidido entre eles.
No Caldeirão dos Barreiros, a águia ficava atenta aos despojos. Podia ganhar quatro pontos, dois a cada um.
Funchal: 21h30. Mas isto é lá hora de haver jogos numa ilha que ainda há pouco tempo tinha uma diferença horária em relação ao continente? Pelo vistos é. E assim, Marítimo e Benfica entraram em campo já sabendo do empate de Alvalade o que deveria provocar nos encarnados algum toque de alvorada ao género do Sétimo de Cavalaria dos filmes de cowboys.
Afinal, os astros conjugavam-se para que o tristonho tetracampeão nacional das últimas semanas se pudesse aproximar dos seus adversários que comandam, ainda que não par a par, a classificação deste campeonato.
Facto: Dona Águia vive num estado de stress difícil de controlar. Traduzido por miúdos futeboleiros: deixa que o jogo se estique muito para além do que as características dos seus jogadores permite controlar.
De repente, como dizem os brasileiros, o jogo transforma-se num “bumba meu boi”. Isto é, de cá para lá, numa excitação que só beneficia quem tem jogadores menos dotados.
E nesse entre cá e lá, os riscos correm-se. Ganhar ou perder é mais lotaria do que a realidade de um confronto entre opositores de diferentes características.
23h15 no Funchal. Facto: o Benfica suicida/se a cada jogo que faz.
Os adversários perderam o respeito pelas camisolas vermelhas da águia ao peito. Percebem que é fácil não perder e até simples sonhar com a vitória.
Há sobre os encarnados uma nuvem negra gigante. Uma mediocridade gritante faz com que cada jornada seja um sacrifício. E o fundo parece não ter fundo, por mais que o tempo passe. É uma luz que se apaga.