Texto de João Telmo
A escolha do Pavilhão Carlos Lopes foi uma jogada perspicaz, já que o recinto permite aos convidados e visitantes uma experiência mais intuitiva e, sobretudo, mais cómoda para enfrentar o rebuliço e frenesi característicos de ziguezaguear o cronograma apertado e exigente de uma fashion week. Ao contrário do Pátio da Galé, um edifício circunspeto e menos adequado a um acontecimento desta envergadura, o pavilhão estimula interações mais desanuviadas entre os convidados, os fashionistas e os visitantes e estimula uma expedição mais cativante e convidativa à ModaLisboa.
Os desfiles foram organizados para serem apresentados em dois espaços: no interior do Pavilhão Carlos Lopes e nos jardins circundantes, o que criou, natural e irrefutavelmente, uma dinâmica mais atual e, consequentemente, menos pretensiosa, dissipando o conceito preconcebido que uma semana de moda tem de ser um evento exclusivo e restrito. O espaço WONDER ROOM, situado no exterior do pavilhão, exibiu uma compilação de marcas e designers nacionais nas áreas da joalharia, do vestuário, do têxtil, dos acessórios e do artesanato e foi de entrada livre, o que aproximou o público e envolveu a cidade, ainda que a configuração de um espaço desta natureza integrado na ModaLisboa não tenha tido, nesta edição, a camada imprescindível de sofisticação. O evento ramificou-se, igualmente, para a Estufa Fria com as FAST TALKS – POLITICS OF FASHION no dia anterior aos desfiles, e para a exposição de fotografia WORKSTATION e a exposição PORTUGUESE SHOES, ambas dentro do Pavilhão Carlos Lopes, mas com uma proeminência modesta.
Esta edição LUZ foi marcada por uma oscilação entre coleções com vocabulários estéticos desbravadores e com um cunho zeitgeisty e coleções menos tenazes, que se difundiram por uma via mais segura.
Ricardo Andrez apresentou MACHINIST, uma coleção consistente e excecionalmente surpreendente, que demonstra uma ampliação diligente do seu universo e do trabalho profícuo de qualidade e excelência que tem vindo, paulatinamente, a solidificar.
David Ferreira inspirou-se nos temas da Guerra e do Fado, engendrando uma coleção imponente e dramática, apresentada à luz do dia no jardim do Parque Eduardo VII, que atesta o facto do designer colaborar com artistas nacionais e internacionais, como Mariza, Björk, Rossy de Palma, entre outros.
Valentim Quaresma mostrou com CARNAL peças audaciosas e intrépidas, que posicionam o criador, tal como Ricardo Andrez e David Ferreira, numa via incontestável de internacionalização da moda portuguesa.
De salientar os regressos de Aleksandar Protic e Nair Xavier à ModaLisboa. Protic apresentou uma coleção refinada que fez uma clara e luxuosa celebração das formas femininas, e Nair Xavier, com a coleção NKAGUYAA e em colaboração com DINIZ&CRUZ, exibiu vestuário menswear de construção exímia conjugado com acessórios arrojados, o que resultou como uma lufada de ar fresco para a moda masculina.
Notáveis, igualmente, as coleções de Ricardo Preto, com WHOLE LOTTA LOVE, onde exibiu peças com silhuetas desprendidas, num hino ao amor e à liberdade, e de Olga Noronha, Luís Carvalho e Filipe Faísca, que fechou a edição LUZ.
Menos surpreendentes e coesas as coleções de Kolovrat, Nuno Gama, Christophe Sauvat, Carolina Machado, Morecco, Patrick de Pádua, Duarte e AWAYTOMARS, ainda que todas, dentro do seu universo, apresentassem bastantes elementos carismáticos e com qualidade na construção.
Dino Alves mostrou uma coleção imprecisa, apesar dos evidentes contornos conceptuais e abstratos e transformou a passarela num intencional statement thought provoking, sendo o único designer que não providenciou qualquer descrição ou informação da sua coleção nesta edição.
De notar que a inclusão da marca CIA.MARÍTIMA num espaço de exibição privilegiado como a ModaLisboa é questionável e discutível, tendo em conta a finalidade do evento.
No segmento dedicado aos novos designers, denominado por SANGUE NOVO, o Prémio ModaLisboa foi atribuído a David Pereira, que recebeu uma bolsa de 5,000€ concedida pela ModaLisboa, um Summer Course oferecido pela Domus Academy em Milão e uma entrada direta no SANGUE NOVO da edição de março de 2018.
Esta edição Primavera/Verão constituiu, manifestamente, uma mudança e transição positivas no que toca à parte da estruturação e organização do evento, embora se abandone a edição com a sensação de que a moda nacional carece de um pouco mais do que um título sugestivo como LUZ para ter mais fulgor e luminescência.