Joaquim Leitão, presidente da Autoridade Nacional da Proteção Civil (ANPC), tem os dias contados à frente da entidade que é responsável pela resposta em situações de emergência e de calamidade, devendo ser exonerado do cargo na próxima semana. A saída do presidente da ANPC é já esperada pelos comandantes, sabe o i.
As várias falhas no dispositivo de combate aos incêndios que deflagraram este ano – sobretudo em Pedrógão Grande onde morreram 64 pessoas – a somar à polémica das licenciaturas dos comandantes da Proteção Civil estão a fazer com que seja insustentável que Joaquim Leitão continue na presidência da ANPC. O golpe final terá sido o relatório entregue ontem pelos peritos no parlamento, que arrasa com as decisões e os procedimentos adotados durante o combate às chamas em Pedrógão.
Por isso, o governo prepara-se para no dia 21 deste mês (sábado), quando se realiza um conselho de ministros extraordinário, anunciar a saída de Joaquim Leitão. Costa disse ontem, ainda assim, que o governo assumirá “responsabilidades políticas, se for caso disso”.
Caso Joaquim Leitão saia da Proteção Civil depois do dia 24 de outubro – quando se cumpre um ano de mandato – o Estado terá de pagar uma indemnização de cerca de 145 mil euros, de acordo com a lei. O valor corresponde aos salários que seriam pagos ao coronel em dois anos até perfazerem os três de nomeação. Joaquim Leitão tem um salário mensal de 5.166,36 euros, acrescidos de um suplemento de 1.808,23 euros, para despesas de representação.
Peritos arrasam com a resposta no combate às chamas
São várias as críticas à Proteção Civil que constam no relatório. Os peritos salientam a ausência no teatro das operações do comandante nacional, na altura Rui Esteves, a quem competia assumir o comando do combate a um incêndio daquela dimensão. O documento frisa ainda que as “opções táticas” como a antecipação da evacuação das localidades ameaçadas – que “deveriam ter sido equacionadas logo às 16h” – como a “subavaliação e excesso de zelo” na resposta inicial assim como a “prontidão” no combate às chamas foi “francamente negativa”, tendo em conta que “não foram mobilizados totalmente os meios disponíveis”, de forma a que se conseguisse travar o avanço do fogo num ataque inicial. Mais tarde, com o crescer do incêndio e com as falhas na rede de comunicação de emergência, o SIRESP, “tornou-se impossível” combater o incêndio que em apenas uma hora lavrou 4.459 hectares e matou 64 pessoas.
Os peritos fazem ainda uma dura crítica à falta de formação dos agentes de combate aos incêndios. No documento lê-se que existe uma “ausência de formação e capacitação profissionais adequadas” entre os bombeiros voluntários cujo desempenho se tem “degradado nos últimos anos por ausência de vocação”, o que resulta numa realidade de “amadorismo” neste setor. E a falta de qualificação estende-se aos comandantes da Proteção Civil: “As competências de comando não são características assumidas por todos os operacionais”. A falta de formação é, aliás, um dos “mais graves problemas”, apesar de serem licenciados.
Comandante mandou parar fita do tempo
O relatório revela ainda que o atual comandante operacional nacional, Albino Tavares, deu ordens para que, durante a madrugada do dia 17 para o dia 18 de junho, não fossem registadas mais informações na fita do tempo. Desta forma foram ocultadas informações onde se registam todas as decisões, todos os meios acionados e todas as entradas e saídas de agentes do combate às chamas. Na altura da tomada de decisão de Albino Tavares, encontravam-se no teatro das operações o secretário de Estado, Jorge Gomes e a ministra Constança Urbano de Sousa. “A partir das 04h56 de 18 de junho, todos os alertas deveriam ser comunicados ao posto de comando por telefone, e só após validação do mesmo seriam ou não inseridos na fita do tempo”, lê-se no relatório dos peritos.
Além disso, os peritos notam que durante duas horas (entre as 16 horas e as 18 horas) não houve qualquer meio aéreo a combater as chamas.
Fase Charlie devia ter sido antecipada
Também o governo foi alvo das críticas dos peritos que frisam que a fase Charlie, período de alerta máximo de prevenção na resposta aos incêndios, devia ter sido antecipada numa altura em que faltavam apenas 13 dias para que entrasse em vigor. Ou seja, o dispositivo e meios disponíveis “não tinha a dimensão” necessária para o combate ao fogo. Sem a antecipação da fase Charlie não houve “reforço do dispositivo” nem foi possível pré-posicionar os meios disponíveis.
Ana Petronilho e Marta F. Reis